Quando algum artista morre, ou faz um retorno, ou começa a ter suas músicas postadas demais nas redes sociais após anos de sumiço, batata: o mau humor coletivo vai interpretar tudo isso usando frases como “não sabia que havia tantos fãs de fulano”, “apareceram muitos fãs de beltrano de ontem pra hoje”.
Os fãs dos Titãs que, nos últimos dias, postaram músicas da banda e alçaram o grupo aos tópicos mais comentados do Twitter, não apareceram do nada, claro. Afinal trata-se de uma das bandas mais bem sucedidas do rock nacional dos anos 1980, evidente que os fãs já estavam por aí há milênios. E com um espetáculo como a turnê Titãs Encontro ficou impossível não se emocionar, e não pensar algo como “não sabia que eu ainda gostava tanto de Titãs”. Mais: é a hora de notar como Arnaldo Antunes no fundo nunca deixou de ser um titã, como Charles Gavin segue a escola ensimesmada de Charlie Watts, como Nando Reis sempre foi um baixista excelente, como a recente febre de folk pop deve aos discos acústicos do grupo. Como bônus, o lado pitoresco: o animado Sergio Britto quase em clima de “tira o pé do chão!” mesmo na hora em que a banda está tocando o baladão Epitáfio.
No Rio, o show lotou a Jeunesse Arena (eu fui lá) e deixou os espectadores falando sobre a apresentação por um bom tempo. Em São Paulo, capital com vocação para grandes espetáculos (o Rio foi perdendo isso com o tempo), e ainda por cima terra da banda, tudo foi bem mais marcante. Com a transmissão pela Globoplay, quem não foi ao show, pôde pelo menos conferir em casa uma apresentação que, desde o começo, foi feita para emocionar desde os fãs antigos até a turma que só passou a gostar do grupo na época em que você não conseguia ficar livre dos Titãs – na fase do Acústico MTV, o grupo não saía das rádios, fazia shows em todo canto do Brasil e não parava de dar entrevistas. E recebia discos de diamante no Raul Gil.
A curiosidade foi a mobilização em torno do repertório da banda nas redes sociais, com pessoas brigando quando alguém reclamava da inclusão de alguma música (a já citada Epitáfio, balada de sucesso, mas xarope, era uma das reclamadas) e atuação de fãs defensores do grupo. Um jornalista musical postou sobre isso no Twitter e fez uma comparação (apropriada) com o fandom da Anitta – em resposta a ele, um suposto fã dos Titãs surgiu do nada, postou uma mensagem malcriada para ele e o bloqueou (!) em seguida. Não chegou nem perto de ser um mutirão como os fãs de artistas pop fazem nas redes sociais, mas foi curioso ver uma banda já veterana, considerada como acabada por muita gente que mal ouviu os discos mais recentes, vive os tempos atuais. Tempos em que críticas muitas vezes se resumem a fãs emocionados perdendo o senso e apontando dedos nas redes sociais (aquela ação direta que os fãs do Restart – lembra? – definiram como “xingar muito no Twitter”).
O grupo ainda vai fazer mais apresentações com a formação do Encontro e fãs esperam por mais shows no segundo semestre, mas seja lá o que venha a acontecer, essa turnê já mudou a vida da banda, mudou a vida dos fãs e mudou a escrita do mercado de shows no Brasil. Se reencontros com os fãs sempre foram uma boa maneira de garantir dinheiro e reposicionamento no mercado (turnês comemorativas de bandas como Rolling Stones e Who no fim dos anos 1980 eram movidas por isso), o showbusiness brasileiro talvez esteja aprendendo finalmente, após vários anos, a transformar tudo isso em arte. Por mais que haja críticas ao repertório da turnê dos Titãs (textos podiam variar, músicas podiam mudar de capital para capital), nenhuma carteira de nenhum fã foi batida pelos produtores. Fãs saem felizes e a banda sai bem maior dessa história. E isso é muita coisa.
Por Ricardo Schott via Pop Fantasma