Rafael De Bona fala da peça “A Cerimônia do Adeus”, em cartaz em São Paulo

O ator Rafael De Bona vem se destacando na peça “A Cerimônia do Adeus”, em cartaz no Teatro Anchieta, do Sesc Consolação (SP). Na trama ele dá vida ao personagem Lourenço, primo mais velho do protagonista Juliano (Lucas Lentini).

– Lourenço estuda Direito na faculdade e, ao mesmo tempo, participa secretamente de forças paramilitares de extrema-direita que atuaram a favor da Ditadura Militar, como o CCC (Comando de Caça aos Comunistas), na repressão de qualquer cidadão ou grupo que fosse considerado politicamente subversivo ou que se opusesse ao regime. Ele é um jovem que se envolve diretamente com a violência, participando de perseguições, torturas e assassinatos. É um personagem perverso que vai se tornando cada vez mais sombrio e atormentado no decorrer da peça – revela o ator.

Rafael faz um paralelo da atual situação brasileira com o tempo histórico em que o espetáculo está ambientado, e fala sobre a mensagem que a história quer trazer para o público.

– Acredito que a mensagem principal sobre esse tema seja a urgência para banirmos de vez o fascismo da nossa sociedade. Vimos o que aconteceu aqui nos últimos anos, também em outros governos de extrema-direita pelo mundo, e as suas consequências nefastas. No caso do Brasil, a Ditadura Militar não foi completamente superada. Em parte, seu aparato permaneceu na estrutura do Estado, assim como não houve julgamento nem condenação por todos os crimes cometidos. É uma ferida aberta da nossa história. Não à toa, vimos o risco de um novo golpe acontecer. Um trauma não superado sempre pode voltar. Então acredito nessa mensagem, da luta contínua pelo fim do fascismo e a favor de uma real democracia – ressalta De Bona.

O paulistano de 30 anos ainda fala sobre a tensão sexual que envolve o seu personagem e o de Juliano.

– Lourenço sempre procura intimidar o primo, seja com provocações, ameaças ou mesmo brincadeiras. Ele desconfia que Juliano seja gay, então estabelece com ele uma tensão que é dúbia, mistura o sexual com uma intenção de brutalidade física. Na cena, a atração de Lourenço fica sugerida, nunca explícita – explica.

Além de Rafael, o espetáculo, com texto do dramaturgo Mauro Rasi, traz em seu elenco Beth Goulart e Eucir de Souza interpretando Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre, respectivamente. Juliano é vivido por Lucas Lentini, a mãe Aspázia por Malu Galli e tia Brunilde por Olivia Araújo. Fernando Moscardi interpreta o amigo Francisco, todos sob a direção de Ulysses Cruz.

– A peça conta a história de Juliano, um jovem apaixonado pela arte e pela literatura que, na sua imaginação, dá vida às suas maiores inspirações literárias, Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir. Ele vive o rito de passagem da adolescência para a vida adulta, evocando os ideais libertários do casal de filósofos que tanto admira. A história se passa no interior de São Paulo, entre meados da década de 60 e início dos anos 70, e apresenta os conflitos de Juliano com sua família, especialmente a complicada relação com sua mãe, além do seu desenvolvimento artístico e da descoberta da sua sexualidade em meio a um momento tão hostil e reacionário da história brasileira – completa.

Rafael tem um longo currículo nos palcos, nos últimos anos esteve em várias produções que foram destaques nos palcos paulistas e estiveram em vários festivais com indicações a prêmios.

– Atuei em espetáculos como “A Toca do Coelho”, “Cabaré García!”, “O Filho”, do Teatro da Vertigem, com o qual participei dos festivais Cena Contemporânea (Brasília), Festival de Teatro do Agreste (Caruaru) e Sesc Palco Giratório (Porto Alegre), “Afora Isso”, “O Leão no Inverno”, pelo qual fui finalista do prêmio de melhor ator coadjuvante na Festa Internacional de Teatro de Angra (FITA) e agora “A Cerimônia do Adeus” – enumera.

De Bona fala ainda sobre o carinho que tem por um dos seus trabalhos, o espetáculo “A Toca do Coelho”, que foi sua estreia no teatro profissional.

– Entrei para a peça no lugar do Felipe Hintze e viajei com ela por várias capitais, ao todo fizemos 12 cidades pelo Brasil e mais uma temporada em São Paulo. Trabalhar logo de cara com Dan Stulbach na direção e um elenco com Bárbara Paz, Reynaldo Gianecchini, Simone Zucato e Neusa Maria Faro foi uma estreia realmente especial – conta.

No início de 2022, ele, ao lado de Ricardo Henrique, trouxe para os palcos “Chroma Key”, que debate a identidade masculina patriarcal e seus malefícios.

– Foi uma peça idealizada e co-produzida por mim e pelo meu amigo e parceiro Ricardo Henrique. O projeto conta com a dramaturgia de Angela Ribeiro e a direção de Eliana Monteiro. Eu e Ricardo estamos em cena interpretando o mesmo personagem, um homem em crise que está em constante embate consigo mesmo. É uma peça que fala sobre essa identidade masculina patriarcal, nociva e doente, que precisa ser revista. O personagem se percebe preso a ela e tenta se refazer, a partir de novas possibilidades de afeto, de sentido e de existência no mundo – destaca.

Além do teatro, o ator também tem destaques no cinema. Ele protagonizou os longas “45 Dias Sem Você” e “Madalena”.

– “45 Dias Sem Você” foi minha estreia no cinema, um presente do amigo, diretor e roteirista Rafael Gomes. Nele, eu vivo o Rafael, jovem abandonado pelo seu amor e que, para curar o coração partido, decide viajar por 45 dias, indo ao encontro de três grandes amigos que moram em diferentes lugares do mundo: Julia, Fábio e Mayara. É uma viagem sentimental, cheia de idas e vindas, alegrias e tristezas. Mas é, mais do que tudo, um filme sobre a amizade. Já “Madalena”, filme dirigido por Madiano Marcheti, conta a história de três personagens que vivem na mesma cidade do Centro-Oeste brasileiro. Mesmo sendo muito diferentes entre si, eles têm algo em comum: são afetados pelo desparecimento de Madalena. Meu personagem, Cristiano, é filho de um casal de fazendeiros do agronegócio. Ele encontra o corpo de Madalena no campo de soja da fazenda da família e, a partir daí, tenta lidar com essa situação em segredo. É uma história que retrata a violência sofrida pela população trans no Brasil, país que mais mata transexuais no mundo. É uma narrativa que abre o olhar do espectador para a existência de pessoas invisibilizadas, e nos mostra o quanto uma ausência pode afetar os outros e o seu entorno – complementa.

Rafael também esteve em produções que foram destaque na TV e no streaming.

– Na televisão, trabalhei no programa “Retrovisor” (Canal Brasil) e fiz uma participação na novela “Deus Salve o Rei” (Globo). Atuei ainda nas séries “Mãe Possível” (GNT), “Todxs Nós” (HBO) e “Não Foi Minha Culpa” (Star Plus) – finaliza.

O ator, e grande elenco, podem ser vistos até dia 21 de maio, no Teatro Anchieta (Sesc Consolação).

Sair da versão mobile