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“O Som ao Redor” e sua vida cheia de som e fúria

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Se Millôr Fernandes, um frasista implacável, dizia que “o homem é um animal inviável”, quando falamos de sociedade brasileira essa lógica ganha amplitudes reveladoras. Filme sensação da crítica e considerado pelo The New York Times um dos dez melhores filmes de 2012, O Som ao Redor pode não ser perfeito, porém é de uma importância singular como radiografia de um recorte de nossa sociedade que vêm se transformando violentamente e revelando as vísceras de sua idiossincrasia. Complexo? Nem tanto. Como alegoria, o filme retrata muito bem isso e essa organicidade é o seu maior êxito. Como cinema e como discurso.

O longa retrata o dia a dia dos moradores de uma rua de classe média da zona sul do Recife. Uma típica região de classe média como em qualquer cidade do país. Parte dos imóveis da rua são ou foram de propriedade de Francisco (W. J. Solha), que tenta manter o controle do local como uma espécie de senhor de engenho autoritário e controlador. Dentro desse universo estão seus familiares, como os netos João (Gustavo Jahn), íntegro e corretor de imóveis entediado com seu trabalho – que começa uma relação amorosa com Sofia (Irma Brown) – e o deliquente Dinho (Yuri Holanda), jovem bem nascido que flerta com a criminalidade.

Na rua acompanhamos também uma mãe de família Bia (Maeve Jinkings), que fuma maconha às escondidas dos filhos e cujo maior inimigo é o cachorro do prédio vizinho, que perturba diariamente com seu latido. Até que chega por lá um grupo de seguranças de rua, comandado por Clodoaldo (Irandhir Santos, ótimo como de costume), que oferece proteção aos moradores ao custo de uma mensalidade de R$ 20. Ele logo percebe que a autorização para trabalhar no local precisa vencer a força de influência (muitas vezes violenta) do “dono da rua” numa relação espacial de coronelismo.

O Som Ao Redor

Dirigido e roteirizado por Kleber Mendonça Filho (autor de premiados curtas como Vinil Verde e Eletrodoméstica) o filme é uma lupa banhada de cinismo em cima das relações sociais que se estabelecem na classe média, a dominante nesse país. Acompanhar esse cotidiano acobertados pelo hiperrealismo que o diretor imprime, vai nos desnudando como atores do microcosmo retratado na tela. E é essa habilidade em denotar as particularidades de um indivíduo em ressonância ao coletivo que fica como resultado mais visceral desse tratado de Kleber, que possui muita capacidade observativa e estabelecimento discursivo de seus anos atuando como crítico de cinema.

O Som ao Redor é um filme que rumina uma tensão crescente. Parece que está sempre procedido de algum ponto de atrito. Nesse ponto nervoso e nevrálgico que o roteiro vai expondo as contradições e familiaridades dessa sociedade. Talvez o filme peque pela fotografia pouco inspirada ou mesmo pela diluição do discurso em seu terço final. Entretanto, essa imprevisibilidade constante não é gratuita, assim como seu título, afinal, a vida não é mesmo cheia de som e fúria? Que esse filme não seja uma exceção em nossa filmografia, tão carente de substancialidade e tão absorta em constante mediocridade.

[xrr rating=4/5]

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