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“Valerian e a Cidade dos Mil Planetas” arrebata no visual, mas peca em sua realização

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Numa época em que surgem cada vez mais adaptações de personagens de histórias em quadrinhos americanas, é realmente muito bom o surgimento de um projeto que traz para o cinema uma obra europeia que influenciou diversos filmes relevantes de ficção científica, especialmente o primeiro “Star Wars”, de George Lucas. Além disso, é bastante válida a ideia de trazer para o grande público histórias que só são conhecidas por apreciadores de graphic novels elogiadas, porém pouco badaladas, e por aqueles (incluindo esse que vos escreve) que leram as tirinhas que saíam no hoje finado caderno Globinho (do jornal O Globo) há mais de 30 anos.

Assim, a ideia de trazer as aventuras de Valerian, criado por Pierre Christin e Jean-Claude Mézières, para as novas gerações com toda a pompa e circunstância merece o seu reconhecimento. É uma pena, no entanto, que “Valerian e a Cidade dos Mil Planetas” (Valerian and The City of a Thousand Planets, 2017) seja riquíssimo na forma e raso como um pires no conteúdo, resultando numa ficção científica com pouco fôlego, apesar do visual arrebatador, certamente um dos melhores vistos este ano.

A trama começa quando, durante a década de 1970, acontece o início da formação de uma estação espacial, que começa a ser montada a partir do contato feito entre astronautas e seres de diversos planetas, que vão agrupando suas naves e outras construções, que culmina na criação de Alpha (a cidade dos mil planetas do título), tornando-se um lugar para que diversas espécies possam viver pacificamente.

A história pula para o século 28, quando o Major Valerian (Dane DeHaan), sempre ao lado de sua parceira, a sargento Laureline (Cara Delevigne), participa de uma missão para recuperar um Mül Conversor, que é uma criatura capaz de multiplicar qualquer elemento que consuma, e que é algo raro de se encontrar no universo. Após obter o conversor, a dupla o leva a Alpha, para fazer a segurança do Comandante Arun Flitt (Clive Owen). Só que o surgimento dos Pearls, uma misteriosa raça alienígena que pode estar por trás de um terrível segredo que envolve a parte central de Alpha, faz com que Valerian e Laureline passem a questionar a verdade sobre o que realmente está acontecendo ao seu redor.

Não dá para ficar indiferente diante da exuberância visual que o diretor Luc Besson conseguiu obter com “Valerian e a Cidade dos Mil Planetas”. O cineasta se esmerou em cada detalhe para que suas imagens ficassem uma mais bonita que a outra (a sequência de abertura, ao som de “Space Oddity”, de David Bowie, é estupenda), seja na construção de mundos, planetas e elementos tecnológicos, bem como na criação dos ETs – embora um ou outro lembre algum ser já visto nas franquias “Star Wars” e “Star Trek” (o que, diga-se de passagem, não desmerece em nada o trabalho da equipe de maquiagem e efeitos visuais). O diretor de fotografia Thierry Arbogast, habitual colaborador de Besson desde Nikita – Criada para Matar, ajuda a tornar a estética do filme realmente deslumbrante, com um colorido que cativa até mesmo quem não presta tanta atenção nesses detalhes.

No entanto, o filme deixa muito a desejar no roteiro, também assinado por Besson. Além de diálogos bastante ruins (alguns emulam famosas expressões de “Star Wars” e até mesmo “Busca Implacável”, co-escrito pelo cineasta), o diretor erra ao perder tempo com questões que acabam se arrastando na tela. Tanto que boa parte do público pode ficar entediada com situações que não só demoram muito para serem resolvidas, como também acabam se repetindo, removendo a sensação de evolução na trama, que, quando se torna um pouco mais interessante – embora sem maiores surpresas em suas reviravoltas -, o filme já está em seu terço final.

Para piorar, a história se concentra além do necessário na relação entre tapas e beijos dos protagonistas. Não é que ela não acontecesse nos quadrinhos. Mas não era o principal elemento das aventuras, o que deixa tudo bem entediante no fim das contas.

Outro grave problema do filme está na escalação de seu elenco. Dane DeHaan, em seus segundo longa como protagonista este ano (o primeiro foi o tenebroso “A Cura”) embora já tenha provado ser um ótimo ator, aqui não rende como deveria. Ele não consegue convencer na pele de um agente espacial sedutor com um amor em cada porto. Além disso, a falta de química entre ele e Cara Delevigne, deixa as cenas do casal sem graça e até enfadonhas, especialmente nos momentos em que os dois discutem a relação. Delevigne continua a ser apenas um rostinho bonito, mas pelo menos sua atuação não é tão tenebrosa quanto foi a Magia de “Esquadrão Suicida”. Uma atriz mais carismática e talentosa como Scarlett Johannson (com quem Besson trabalhou em “Lucy”) faria esse papel com o pé nas costas.

No entanto, a pior performance do longa é, surpreendentemente, a de Clive Owen. Sua atuação como o Comandante Arun Flitt é ridícula, já que o ator parecia mais preocupado no que iria fazer depois do fim das filmagens do que fazer o possível para tornar o seu personagem mais interessante. Há um momento, na parte final do filme, que chega a ser bastante constrangedor. Já a cantora Rihanna, por incrível que pareça, não se sai mal como Bubble, uma performer de outro mundo (literalmente) que ajuda Valerian durante sua jornada. O único problema é que Besson, sem saber o que fazer com ela, saca-a da trama sem a menor cerimônia, o que pode frustrar os fãs da estrela que devem ver o filme por causa dela.

Dono de uma filmografia irregular, com grandes acertos (“O Profissional”, “O Quinto Elemento”, “As Múmias do Faraó”), mas também com alguns erros (“Joana D’Arc”), Luc Besson poderia ter se preocupado mais em se esmerar em outros aspectos além da parte plástica para fazer de “Valerian e a Cidade dos Mil Planetas” um filme memorável. Do jeito que ficou, o resultado final não conseguiu atingir todo o seu potencial que, se melhor trabalhado, teria grandes chances de ser uma das produções mais relevantes do ano. Infelizmente, ficou mesmo como um belo (e longo demais) cartão postal espacial que não fica na memória quando as luzes do cinema se acendem. Quem sabe, num futuro não muito distante, Valerian ressurja de uma forma mais cativante trazendo novas aventuras nos confins do universo onde (praticamente) ninguém jamais esteve? Não custa sonhar…

Filme: Valerian e a Cidade dos Mil Planetas (Valerian and The City of a Thousand Planets)
Direção: Luc Besson
Elenco: Dane DeHaan, Cara Delevigne, Clive Owen, Rihanna
Gênero: Ficção Científica
País: França
Ano de produção: 2017
Distribuidora: Diamond Films
Duração: 2h 18min
Classificação: 12 anos

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