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HQ Digital: Lokaz

Passadas as festividades, retomo a coluna após a pausa da semana passada, com uma novidade. Agora alternarei minhas sugestões de HQs digitais, com entrevistas. Estas entrevistas serão sempre com quadrinistas que procuram expor seu trabalho na web.

Tenho apresentado muitos exemplos estrangeiros de quadrinhos na internet, então pensei nas entrevistas como uma forma mais interessante de apresentar as HQs online nacionais, deixando que os próprios criadores falem sobre seus trabalhos.

Inaugurando a seção e a coluna em 2010: Lorena Kaz, criadora da Lokaz-tirinhas.

Nome: Lorena Kaz
Nascida em: 28/01/1983
Cidade natal e atual: Rio de Janeiro

HQD: Porque quadrinhos?

LK: Não comecei nas artes gráficas fazendo quadrinhos. Me formei em desenho industrial e já trabalhava com ilustração quando surgiu a idéia de fazer quadrinhos.

Nunca gostei de quadrinhos de super heróis nem de mangás como muitos dos meus amigos quadrinistas.

Eu sempre desenhei (desenho artístico) mas a idéia de fazer estorinhas veio quando eu estava morando na Índia (passei 6 meses trabalhando como designer de jóias em Jaipur, na India), comecei a reparar que passava por situações cômicas e muito singulares e pensei em registrar isso, comprei um bloco em branco e rabisquei alguma coisa, não deu muito certo na época, mas esse foi só o começo…

HQD: Quando começou a trabalhar com quadrinhos? A Lokaz foi sua primeira personagem?

LK: Devem fazer 3 anos e meio que voltei da India com alguns desenhos no caderno, mas nenhuma estorinha (no máximo charges). Em paralelo eu estava buscando um traço próprio (nas ilustrações), que pudesse me definir e que fosse fácil para eu fazer. Olhando minhas idéias de estórias da Índia, pensei que seria um bom exercício de traço, ilustrá-las em forma de quadrinhos. Pensei que seria uma boa prática.

A Lokaz é minha primeira personagem e creio que única e insubstituível, afinal de contas sou eu mesma. Juntei as iniciais do meu nome Lorena Kaz e criei a personagem. Outros personagens poderão surgir mas a Lokaz provavelmente nunca deixará de aparecer e ser a personagem mais importante.

HQD: Já teve trabalhos publicados? Quais?

LK: Publico as estorinhas no meu blog (www.lokaz-tirinhas.blogspot.com ) e no blog tiras nacionais (www.tirasnacionais.blogspot.com ), as vezes também no tiranduma (esse é mais recente (www.tiranduma.blogspot.com ) e agora tenho publicado mensalmente nos últimos números da revista Pilotis, que é a revista da PUC-Rio, onde me formei em design. No mês de janeiro não haverá publicação, pois a revista está de férias, na volta do ano letivo que vem, eu ainda não sei. Seria legal continuar publicando lá pois a revista é bem feita, tem uma ótima tiragem e é muito legal ver as pessoas paradas na faculdade ou no ônibus lendo a página dos meus quadrinhos.HQD: Qual o maior incentivo e/ou incentivador para criar o site com as tirinhas?

LK: Não lembro de um fator específico que me incentivou para criar o site, sei que eu já tinha vários blogs de ilustração pra poder divulgar meu trabalho e mostrar pros amigos e interessados… Acho que o blog com as tirinhas foi a mesma coisa, não pensei muito, quando juntei um número mínimo de tiras já criei o blog pra poder mostrar pros amigos.

No entanto uma coisa que sei que me incentivou de modo geral para os quadrinhos foram minhas viagens para o exterior e mais especificamente uma viagem para a Sérvia, acho que vale a pena contar, para mim é uma estória muito legal.

Minhas tiras tem a ver com os lugares que estive, justamente porque são auto-biográficas e desenho sempre situações reais. As vezes exagero um pouco ou retrato estórias contadas por amigos, mas não invento quase nada.

Sendo assim, acho que as viagens atiçaram minha vontade de retratar situações inusitadas, comecei com as primeiras idéias na Índia e voltei ao Brasil, desenhei aqui as estorinhas da Índia e algumas de situções do meu passado, mas não tive muitas idéias novas. Mais tarde fui morar na Espanha e comecei a desenhar outra vez, meu maior assunto era a vivência dividindo um apartamento com 3 caras! Tinha assunto que não acabava mais, especialmente críticas aos meus ex-roomates hahaha.

Depois da Espanha fui passar uns meses na Sérvia (e ai está a parte onde queria chegar), na Sérvia conheci gente que fazia quadrinhos de coração, gente que vivia disso e vivia bem! Gente que fazia quadrinhos a vida toda, por hobby, mas na verdade era engenheiro ou advogado e conheci gente que dedicava muito tempo a desenhar, divulgar e falar sobre os quadrinhos. Essas pessoas me receberam no meio dos quadrinhos Sérvios, por causa do meu interesse e pelo seu amor aos quadrinhos, nunca pediram nada de mim.

Lá na Sérvia eu vi e ganhei vários zines e publicações independentes, vi gente que se conheceu por causa dos quadrinhos e manteve a amizade pelo mesmo motivo… Quando voltei ao Brasil, li cada um dos meus zines Sérvios com um dicionário na mão, traduzindo palavra por palavra, percebi o quanto minha experiência foi legal e que eu queria poder recriar um pouco do que vi na Sérvia por aqui ou onde quer que vá morar no futuro.

HQD: Como foi e tem sido a recepção do público no site?

LK: Muito raramente vejo alguém que conheceu meus quadrinhos pelo site, normalmente quem acessa são amigos, família e principalmente colegas de profissão (outros ilustradores e quadrinistas). Se tem gente que me acha pela internet e lê meus quadrinhos, então eles não se manisfestam muito. Também acho que para alguém acessar sua página é porque viu em um link e clicou, dificilmente uma pessoa vai aparecer no site por ter visto divulgação em mídia impressa. Quando publiquei na revista pilotis, pensei que os acessos fossem aumentar, mas parece que não aumentaram (não creio que as pessoas guardem a revista ou escrevam o endereço em algum lugar pra ver mais tarde) no entanto, quando entrei no twitter, meu número de “seguidores”começou a aumentar bastante, acho que porque era só clicar no link que meus amigos re-twitavam dos meus.

HQD: Qual o seu ritmo de criação?

LK: Sou uma pessoa muito indisciplinada, não tenho ritmo. Às vezes publico umas 3 tiras por semana e às vezes passo quase 3 semanas sem publicar, alguns seguidores reclamam, mas o motivo é a falta de tempo.

Minha criação de quadrinhos depende basicamente de dois fatores, meu tempo livre e novas idéias que persistam em minha cabeça. Se tenho muitas idéias novas e que persistam por bastante tempo, tento arrumar tempo livre para desenhar as estorinhas. Se não tenho idéias “insistentes”, não desenho. Tenho muitas idéias de estorinhas por dia mas a maioria não ganha estatus de importante o bastante para que eu me esforce em arrumar tempo para desenhá-las.

Digo que meu problema é basicamente conseguir tempo para desenhar, pois como praticamente todos os quadrinistas que conheço, o que me sustenta é meu trabalho “de verdade”, o de designer, e os quadrinhos acabam ficando um pouco em segundo plano.

HQD: Como costuma trabalhar? Escreve algo antes ou sai desenhando e criando os textos a partir das imagens e vice-versa?

LK: Antes eu tinha uma idéia e pegava a folha de papel mais próxima para escrevê-la ou fazer um esboço bem vagabundo só pra não esquecer, muitas vezes eu jogava o papel fora ou não lembrava onde tinha posto. Hoje em dia eu comprei um livro em branco que anda SEMPRE na minha bolsa e que eu levo até para a esquina comprar pão, se não anoto a idéia da estória na hora, muitas vezes esqueço, quase sempre.

Depois, na hora que tenho algum tempo livre e se uma das idéias anotadas persiste insistindo em minha cabeça para ser desenhada, eu pego o caderno e me lembro exatamente como imaginei a estória, escolho melhor as falas e desenho.

Se a idéia não insistir na minha cabeça, no tempo livre tenho tantas coisas para fazer que não a desenho. Tenho muitas idéias no caderno que nunca foram e provavelmente já não serão desenhadas.

HQD: Qual o material de trabalho predileto? O que prefere usar para desenhar?

LK: Desenho a lápis no meu caderno de folhas em branco e passo por cima com caneta de nanquin. Adoro hachuras e sempre uso o computador pra consertar meus traços pois tenho muita preguiça de refazer os desenhos a mão quando erro alguma coisa.

HQD: Qual sua inspiração nos desenhos? E na temática?

LK: Então, a temática e inspiração é a vida. E como a vida pode ser irônica, como pode ser engraçada, como as pessoas pensam diferente….Para ser mais exata e roubando uma frase de um dos meus maiores ídolos dos quadrinhos (Liniers)  minha inspiração são as “coisas que te acontecem se você está vivo”.

Não gosto de fantasia, nunca gostei. Não gosto dos quadrinhos de heróis nem de luta, não são parte da minha realidade. O melhor dos quadrinhos, para mim, é reconhecer a vida, reconhecer a si mesmo, reconhecer a poesia nas coisas pequenas que passam despercebidas como rotina e acho que mais que tudo rir um pouco da desgraça humana e da sua própria desgraça.

HQD: Qual(is) o quadrinho que mais curte na web e no formato impresso?

LK: Gosto das tiras curtas, autorais e especialmente irônicas.

Dos antigos, gosto especialmente de Quino (Mafalda) e Bill Watterson (Calvin e Hobbes), mas os antigos não são meu forte. Também acho muito bonitos os desenhos de Tintin e Asterix, embora nunca tenha tido muita paciência para ler estórias quandes.

Reconheço especialmente a importância da turma da mônica na minha formação da linguagem dos quadrinhos, na questão da organização dos quadros e onomatopéias.

Dos mais atuais, de impressos gosto da Maitena (Mujeres Alteradas) e do Liniers (Macanudo www.autoliniers.blogspot.com). O Liniers é o que mais gosto, pela sutileza e pela beleza que ele encontra para retratar qualquer coisa e pelos desenhos lindos.

Na web, amo o “Senhor envinhetado” (www.tiraese.blogspot.com ), acho que é o melhor roteiro que já vi, com o desenho mais simples. Sou a maior fã! Também gosto do Cyanide and happiness www.cyanidehappinesstraduzidos.blogspot.com , acho genial! E nemi nur www.fotolog.com.br/nemi_nur entre um milhão de coisas que se vê pela net.

HQD: Possui alguma profissão além de quadrinista? Qual?

LK: Trabalho como ilustradora e designer gráfica. Trabalho na esmpresa de design GPS (www.gpsdirecaografica.com.br) e ilustro o site “Cérbero nosso de cada dia” www.cerebronosso.bio.br.

HQD: Fora criar tirinhas, o que curte fazer nas horas vagas?

LK: Gosto de música, cantar e dançar, jogar jogos de tabuleiro (nacionais ou importados), os importados são raros e não tem pra vender no Brasil, participo de grupos de jogos no Rio, quem quiser participar, pergunte-me como! Também gosto de yoga, andar de patins, comer, ilustrar em geral, ir ao cinema e várias coisas que vivo reclamando por não ter tempo de realizar. Só não gosto de gastar meu tempo vendo tv e dormindo.

HQD: Possui outro site ou link, seu ou não, que nos recomendaria?

LK: www.lokaz-artes.blogspot.com, www.artafacta.org, www.ajourneyroundmyskull.blogspot.com , http://www.fotolog.com.br/matchew

HQD: Possui ou possuía alguma meta para seus quadrinhos? Ainda tem planos para novas criações, seja nas tirinhas ou em outras mídias, mesmo que distintas dos quadrinhos?

LK: Não tenho planos objetivos e também não tenho muitas pretensões, gostaria de publicar em alguma mídia impressa, tipo uma revista ou jornal de bairro, mas gostaria, mais que tudo, de ter um grupo de pessoas que estivesse disposto a desenhar junto, como vi na Sérvia.

HQD: Você se vê trabalhando no estrangeiro, desenhando ou escrevendo outros títulos?

LK: Me vejo trabalhando em outro país, não por causa dos meus quadrinhos, mas por mim mesma, adoro viajar, adoro morar fora.

HQD: Publicaria suas HQs lá fora, mesmo numa versão traduzida de seu site?

LK: Isso sim, adoraria publicar em outra línguas, pois adoro ler estórias de outras línguas e traduzí-las… As estórias que eu gosto, que falam de cotidiano e são parecidas em todos os lugares, pois falam do ser humano, as pessoas são iguais em todos os lugares, isso nos conecta e ao mesmo tempo a experiência por morar em outro lugar nos faz ter estórias diferentes pra contar. Agora estou lendo o último livro da Marjane Satrapi (Persépolis) e adoro. Gosto de ler relatos pessoais, estórias de vida contadas em quadrinhos, assim como o MAUS do Art Spiegelman, que adorei.

HQD: Suas tiras são publicadas atualmente em outro meio, fora o site? A internet abriu portas na mídia impressa?

LK: De mídia impressa, só experimentei a revista Pilotis e a internet não teve nada a ver com isso. Hoje temos muita gente fazendo quadrinhos na internet, comunidades, portais, sites, blogs e revistas online, acho que é difícil encontrar onde publicar em papel.

HQD: Alguns criadores querem apenas entreter, outros pretendem deixar alguma mensagem, ou abrir a mente das pessoas para outros pontos de vista. Onde você se encaixa?

LK: Não acho que as pessoas precisem ler minhas estórias, ou que elas sejam tão importantes que vão mudar a vida de alguém ou ensinar alguma coisa, mas acho que ler sobre situações da vida nos faz criar uma identificação, às vezes, ler sobre uma situação pela qual já passamos ou ver que alguém tem uma opinião da qual partilhamos nos faz sentir melhor ou mais identificados com as pessoas no mundo. Esse é um pouco o meu propósito, enxergar poesia onde não via, mostrar que a beleza existe até nas situações mais trágicas e encontrar identificação.

Recentemente um namorado terminou um relacionamento comigo, então durante meses escrevi muitas e muitas estórias de amor, tristes e depressivas, além de muito negativas, eram uma forma de entender o que me aconteceu, de rir de mim mesma, de tirar proveito de algo ruim, mas acho que pensei mais que tudo em outras pessoas que tivessem seus corações partidos e pudessem se identificar comigo e se sentir menos sozinhas.

Quando meu namorado terminou comigo, eu gostaria de ter encontrado um blog como o meu, para saber que não sou única no mundo. Outras pessoas já tiveram seus corações partidos, também sofreram mas seguiram adiante. As vezes os quadrinhos autorais podem trazer muita força.

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