Antes de começar a discorrer a crítica propriamente dita, trago aos fãs da série Exterminador do Futuro duas notícias, uma boa e uma ruim. A boa é que “O Exterminador do Futuro Gênesis” (Terminator Genysis, EUA/2015) é muito superior a “Exterminador do Futuro 3: A Rebelião das Máquinas” (excluo aqui “O Exterminador do Futuro: A Salvação”, pois é um filme anômalo, funciona mais como universo expandido). A notícia ruim é que este quinto filme da série está longe de fazer jus aos dois primeiros dirigidos por James Cameron, e lançados em 1984 e 1991 respectivamente.
Atualmente, a morfologia das continuações obedece à seguinte receita: atores jovens como protagonistas, muitas, mas muitas referências e citações ao filme original e nenhum vínculo com os que deram errado, geralmente os últimos. Pode-se dizer que J.J. Abrams com seu “Star Trek” inaugurou essa configuração de reboots e o bom desempenho do filme, que revigorou a Enterprise no cinema após sucessivos fiascos, acabou servindo de modelo para outros projetos. Só nessa temporada já tivemos “Jurassic World”, que reza nessa cartilha e vem tendo uma boa resposta.
A franquia da família Connor às voltas com ciborgues do futuro não rende bons frutos desde “O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final”, e lá se vão 24 anos! A desastrosa terceira parte teve desempenho comercial pífio, assim como a tentativa de levar a série a um outro patamar no bom, porém incompreendido “A Salvação”. Mesmo assim, parece que os executivos de Hollywood têm plena fé na saga e estão sempre dispostos a tentar mais um, assim sendo, a fórmula Star Trek funcionaria como a salvação da lavoura.
A trama deste novo filme mostra uma outra perspectiva de quando John Connor (Jason Clarke), líder da resistência humana, envia o soldado Kyle Reese (Jai Courtney) de volta a 1984 para proteger Sarah Connor (Emilia Clarke) e salvaguardar o futuro. Porém, uma mudança inesperada dos acontecimentos cria uma nova linha de temporal. Agora, Reese se encontra em uma versão nova e desconhecida do passado, onde ele é confrontado com aliados improváveis – como uma jovem Sarah Connor bem diferente da que ele deveria encontrar e o cyborgue T-800 (Arnold Schwarzenegger) – e novos inimigos letais, além de uma nova missão inesperada, com desiderato de redefinir o futuro. Nessa nova linha temporal, um modelo T é enviado para proteger Sarah Connor quando ela ainda era uma criança.
Ele a adota e a protege até a vida adulta, e devido a essa “tutela” que recebe, a futura mãe do líder da resistência humana contra as máquinas está muito mais próxima da personagem no segundo filme do que da simples garçonete do primeiro. Isso funciona também como uma até plausível explicação para a aparência envelhecida de Schwarzenegger, do alto de seus 67 anos (completa 68 em 30 de julho). A pele da série T de cyborgues é feita de tecido humano real, ou seja, envelhece com o tempo.
Pode-se dizer que o ponto positivo de Gênesis está em oferecer esse novo ponto de vista dos acontecimentos funcionando mais ou menos como “De Volta Para O Futuro 2”. Dessa forma, temos alguns eventos do primeiro filme vistos sob outro ângulo ou sendo alterados. Algumas passagens irão estampar um sorriso nos lábios dos fãs da franquia, como, logo no início do filme, em que vemos o menino Kyle se esgueirando por túneis do mundo pós-apocaliptico, exatamente como ele contou à Sarah no filme de 1984 e o personagem já adulto no momento em que se apresenta a John Connor como voluntário para viajar no tempo.
Há também o momento em que o T chega a 1984 e se depara com a sua versão mais velha, oriunda da nova linha temporal. O embate dos dois, possível graças ao milagre do CGI, que dá vontade de aplaudir de pé. Detalhes referenciais como a indumentária de Sarah Connor que lembra a do T-800 em “Exterminador 2″, frases como “venha comigo se quer viver”, desta vez dita por ela para Kyle, em uma inversão de papéis, e a indelével “I’ll be back” também são divertidos easter eggs.
Contudo, remissões a um cânone não são o bastante para se constituir uma trama totalmente eficaz. Faltou personalidade ao diretor Alan Taylor, que tem até um belo currículo, no qual constam “Thor: O Mundo Sombrio”, e episódios das séries “Lost”, “Mad Men” e “Game of Thrones”. Em Gênesis, porém, ele por vezes emula o estilo que Cameron aplicava nos dois primeiros filmes, inclusive a fotografia, e na maior parte do tempo atua como um diretor de aluguel, com total ausência de criatividade ou ousadia ao compor seus frames.
O roteiro de Laeta Kalogridis e Patrick Lussier suprime toda a força do argumento com diálogos anêmicos, um desenvolvimento superficial e irritantemente complicado (não confundir com complexo). Sem falar nas pontas soltas – por exemplo, nada explica a presença do T-1000, desta vez vivido por Byung-Hun Lee, que acaba servindo apenas como uma referência gratuita – e no excesso de piadas, que nem sempre funcionam. No elenco, Emilia Clarke (a Daenerys Targaryen de “Game of Thrones”) e o fraquíssimo Jai Courtney (de “Duro de Matar: Um Novo Dia Para Morrer”) substituem Linda Hamilton e Michael Biehn respectivamente nos papéis de Sarah Connor e Kyle Reese, mas as versões 2015 dos personagens são artificiais e por isso não geram empatia. Você não se preocupa com eles nos momentos cruciais como no filme original, o que tira bastante da tensão.
Já o personagem de Schwarzenegger, que poderia ter sido usado como John Wayne em “Bravura Indômita” – o velho pistoleiro que escolta uma jovem -, acaba exercendo a função de alívio cômico. A cada filme o ciborgue foi ganhando mais falas (no filme de 84 é possível contar quantas ele profere), mas aqui ele está verborrágico e ainda por cima sabichão, cheio de terminologias técnicas parecendo o Sheldon Cooper de “The Big Bang Theory”. Um desrespeito à máquina fria de extermínio que conhecemos há 31 anos.
E no final das contas, ao invés dessa reviravolta na linha temporal pavimentar um novo caminho, a trama segue a mesma estrutura narrativa dos anteriores. Estão lá a guerra do futuro no início do filme, as perseguições de veículos, “wrestling” de ciborgues, tiros, explosões e o objetivo de impedir o início das atividades da Skynet. Tudo que já vimos, porém, de forma asséptica, sem a intensidade, o sangue e a carga dramática que nem o segundo filme repetiu integralmente, pois, apesar de muito bom, já fazia claras concessões à censura mais baixa.
“O Exterminador do Futuro Genesis” pode agradar a muitos fãs ferrenhos da série porque, apesar dos defeitos, traz elementos que falam alto à memória afetiva, e mesmo os pontos negativos não apagam a força da história que se iniciou há 31 anos como um belo misto de “Em Algum Lugar no Passado” com a saga “Dias de Um Futuro Esquecido” dos X-Men. As várias referências e a recriação fidedigna de cenas parecem estar ali para que não nos esqueçamos de como os dois filmes de James Cameron eram bons.
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