O destino, sempre impiedoso, aparenta ter sorrido para a nação indígena Osage, em Oklahoma. A reserva fica em um oásis de ouro negro e o povo originário tornou-se multimilionário com o petróleo descoberto. De cavalos, agora eles percorrem as estradas de terra em Buicks com motorista, jogam golfe nas pastagens e pegam aviões particulares. Claro que esta nova fortuna apresenta perigo, pois a história dos colonizadores sempre foi de exploração e massacre.
Centenas de mortes inexplicáveis na década de 1920 foram na verdade assassinatos do povo de Osage, história que impulsionou o best-seller de David Grann em 2017, livro que constitui a base para o magnífico novo épico de Martin Scorsese, uma saga gangster nos vastos espaços abertos da América magistralmente interpretada pelos atores Leonardo DiCaprio, Robert De Niro e Lily Gladstone.
O filme mais rico e forte do diretor nas últimas décadas, Assassinos da Lua das Flores também marcou o regresso de Scorsese no Festival de Cinema de Cannes desde 1985.
De volta da guerra, Ernest Burkhart (DiCaprio) precisa de dinheiro, um novo começo e talvez uma jovem esposa. Seu tio, William Hale (De Niro), fornece-lhe todos os três. Hale é um barão do gado e, portanto, já é rico. Mas uma fortuna não é suficiente – talvez nunca seja – e então ele conduz Ernest para Mollie (Lily Gladstone), que detém os direitos sobre os depósitos de petróleo em suas terras. A ideia é bastante simples: com o casamento Ernest e Mollie, ele e seu tio Hale imediatamente ganharão o controle da propriedade e um monte de petróleo.
“Coiote quer dinheiro”, sorri Mollie, estrondeando o jogo de Ernest, mas como Scorsese mostra sua posição é tênue e, apesar das suas riquezas, os Osage sabem que precisam de manter os seus patronos brancos ao lado. Além disso, Mollie é diabética e precisa de doses regulares de insulina. As mulheres Osage, Hale explica gentilmente, parecem nunca chegar a uma idade avançada.
De Niro está em ótima forma como o grande tio Bill Hale, um homem que combina a autoridade folclórica dos senhores da época. Uma performance tão potente que poderia ter desequilibrado um filme menor. Com Scorsese, porém, a atuação se torna um dos instrumentos em uma orquestra poderosa, com DiCaprio, Gladstone e Jesse Plemons brilhando em suas atuações.
Com 206 minutos, Assassinos da Lua das Flores é monumentalmente longo, mas para contar essa história Scorsese move o filme em um ritmo lento, tornando a trama ainda mais impactante. Um clássico americano instantâneo que faz questão de explorar com requinte cada cena da narrativa.
Nenhum homem, obviamente, se considera um monstro. Mesmo aqueles que brincam de Deus afirmam fazê-lo por amor. E o mesmo acontece com Bill Hale, que afirma preocupar-se profundamente com os Osage, mesmo enquanto acompanha os indígenas se afundar no alcoolismo, a depressão e o violência em suas terras.
“Eu os amo, mas na virada da terra eles se foram”, ele suspira, no momento do filme em que as nuvens de tempestade começam a se formar. O tempo deles acabou, ele acredita, enquanto o dele está apenas começando.
A constatação de que o combustível fóssil é feito de sangue negro e matéria podre apenas aumenta a sensação de que Scorsese está tecendo um novo mito da história norte-americana. Para o cineasta Assassinos da Lua das Flores se desenrola como uma tragédia sombria sobre como o oeste foi realmente conquistado, reformulando uma visão idealista dos desbravadores do Velho Oeste com uma pastagem árida regada por sangue e petróleo bruto.
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