Quando vi que a Suma de Letras estava reeditando títulos de grandes sucessos que a editora Francisco Alves lançou nos anos 1980, na coleção Mestres do Horror e da Fantasia, logo procurei saber mais. Alguns títulos da coleção me deram insônia, pois um tio contava suas narrativas para uma plateia de meninos e meninas curiosos e medrosos, reunidos nas férias. Uma das narrativas, a do livro A assombração da casa da colina, marcou muito. Tanto que, por alguns anos depois, o procurei, mas não encontrava por um preço justo. E ao ver o anúncio da editora desta obra fundamental do terror, logo a procurei.
Escrito por Shirley Jackson (1916-1965), The Curse of Hill House, foi publicada originalmente em 1959, e obteve sucesso em crítica e leitores, o que permitiu a uma escritora conhecida por sua obra para crianças e que escrevia dentro da Fiction of Domestic Chaos (gênero que narrava suas desventuras como dona de casa) se posicionar como uma das melhores autoras da ficção que envolve terror sobrenatural.
A sinopse é conhecida. Sozinha no mundo, Eleanor fica encantada ao receber uma carta do Dr. Montague convidando-a para passar um tempo na Casa da Colina, um local conhecido por suas manifestações fantasmagóricas. O mesmo convite é feito a Theodora, uma alma artística e “sensitiva”, e a Luke, o herdeiro da mansão. Mas o que começa como uma exploração bem-humorada de um mito inocente se transforma em uma viagem para os piores pesadelos de seus moradores. Com o tempo, fica cada vez mais claro que a vida, e a sanidade, de todos está em risco.
Analisando como uma obra de terror, há certa contradição, pois não é uma narrativa de fantasmas convencional. Não encontraremos nada de fantasmagóricos. A história é muito mais psicológica do que fantástica, embora Stephen King, um dos admiradores do trabalho de Jackson, destaque que a autora usa o new gothic para tratar da personalidade de seus personagens submetidos a uma extrema pressão psicológica, que se converte em terror aos nossos olhos.
Há diferenças do momento que ouvia a história narrada e agora a narrativa, mas sei que A assombração da casa da colina é um marco pela maneira de tratar o medo. Aquele medo, palpável, que faz com que você “acorde”, sensibilize seus sentidos e que de repente surja do abismo. Mas envelheceu demais, a história foi copiada, recopiada, em diversas ocasiões, mas vale a leitura pela representatividade presente.
A intenção de Shirley Jackson é palpável, desde o primeiro momento, basta olhar para a descrição dos personagens principais convocador pelo Dr. Montague para a Casa da Colina (Hill House). Tanto Eleanor, Theodora e Luke não são descritos fisicamente em nenhum momento, mas sim psicologicamente. Uma maneira que a autora usa para desenvolver a evolução de cada um deles à medida que os eventos forem acontecendo. Mesmo a casa, após uma leve descrição, adquire qualidades humanas na fala do médico que convoca
A partir de então, após o convite do Dr. Mortague, a jovem Eleanor, a sensitiva Theodora e o herdeiro da mansão Luke, passam por uma série de eventos ambíguos começam a acontecer. Não está claro se são reais ou não, mas contribuem em muito para criar uma sensação ruim, bem claustrofóbica, como se algo ameaçador pudesse acontecer. A autora desenvolve um jogo psicológico tão cheio de tensão que é a base para a construção das relações entre os protagonistas, especialmente no caso de Eleanor, que dará voz aos pensamentos de moralidade duvidosa.
Uma forma curiosa pois, apesar de utilizar uma narração onisciente, é nessas explosões explícitas de violência que a autora muda seu foco para seus personagens. Exemplo, quando Eleanor diz que gostaria de golpear com um bastão a cabeça de Theodora, por causa de um suéter emprestado.
O final surpreende, é bem inesperado, mas é o ponto máximo de uma narrativa bem construída, premeditada e pensada cuidadosamente pela escritora que, se isso não bastasse a conclusão, ela deixa ainda mais ambígua a verdadeira participação da casa em tudo que ocorreu. Deixando a mensagem que a casa vai ficar lá, permanecerá impassível contra todas as probabilidades, imortal.
A autora Shirley Jackson, leitura obrigatória para quem gosta de terror/horror.
Não é à toa que Jackson foi uma grande influência para Stephen King e Neil Gaiman, além de ganhar duas adaptações para o cinema, uma de 1963, A Casa Maldita de Rober Wise e outra de 1999, A Casa Amaldiçoada de Jan de Bont, como também uma série que está sendo produzida para a Netflix, pela Amblin TV ao lado da Paramount Television. Recomendo a leitura.
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