Já há algum tempo os anos 90 estão na moda. Depois de revivals com novas temporadas de séries de sucesso da época, como “Gilmore Girls”, “Will & Grace”, “Mad About You” e “Roseanne”, houve espaço também para produções originais, como a novela “Verão 90”. Outro exemplo deste último produto audiovisual original é a série Notícias Populares, que foi ao ar no Canal Brasil.
O jornal Notícias Populares, carinhosamente chamado de NP, está passando por uma crise, com queda nas vendas, e para solucioná-la chega Paloma (Luciana Paes), contratada para ser a nova chefe de redação. “Do rio Sena diretamente para o rio Tietê”, Paloma é uma mulher recém-divorciada, vinda de um emprego de correspondente na França e que precisa encarar a realidade do próprio país.
O dia a dia da redação é puxado. Indo desde uma odisseia para decidir qual será a matéria da capa até a busca por matérias relevantes numa monótona Quarta-Feira de Cinzas, é emocionante acompanhar o cotidiano do jornal. A profusão de jargões do jornalismo não atrapalha a fruição da obra, embora às vezes incomode não entender completamente uma frase ou outra.
Conrad (Ary França) e Marina (Rejane Faria) são os fotojornalistas do Notícias Populares. Eles são capazes de fazer qualquer coisa por uma boa foto, desde provocar lágrimas numa entrevistada a disfarçar-se para entrar com uma câmera escondida num velório. No NP, textos e imagens falam a mesma língua: a língua do povo, para se fazer entender por todos.
Como as demais editorias, a editoria de crítica de cinema também é bastante peculiar. O “crítico” Luna (Luiz Bertazzo), que também é responsável pelas editorias de economia e sindicatos, escreve sobre os filmes exibidos na televisão aberta com um linguajar ímpar, descrevendo por exemplo as “cenas de luta do cacete” e dizendo, sobre um clássico do cinema alemão, que “chato é elogio”. O projeto ao qual ele mais se dedicou foi um ranking dos atores que mais mataram em cena – alerta de spoiler: Arnold Schwarzenegger está no topo do ranking.
O episódio central da série diz respeito à série de matérias sobre o “bebê diabo”, uma criança rejeitada pela mãe que nasceu peluda, com chifres e um rabo, assim como o Coisa-Ruim. Apesar de ser apenas um recém-nascido, o bebê diabo fuma charuto e fala palavrões. A reportagem inicial toma proporções jamais vistas na história do jornal, causando edições esgotadas em todas as bancas de revista. Logo surgem mais testemunhos de encontro com outros bebês diabos pela cidade de São Paulo e até outros lugares do Brasil.
A estreia de Notícias Populares faz parte das comemorações dos 25 anos do Canal Brasil. O projeto vem sendo desenvolvido desde 2018 e conta com expertise de dentro: o co-criador André Barcinski trabalhou durante um ano e meio no jornal. Marcelo Caetano, co-criador e diretor da série, diz que quis fazer com que assistir à série fosse como a experiência caótica de folhear o jornal, que era um ato feito em geral com as pessoas em deslocamento, indo para o trabalho.
A preocupação com a ambientação pode ser notada: a série foi gravada no antigo prédio da Folha. O trabalho de pesquisa e reconstrução do ambiente foi primorosa. A diretora de arte Maíra Mesquita merece elogios por ter tomado tanto cuidado nesta ambientação ímpar, que realmente nos joga para dentro daquela que deve ter sido a redação mais caótica da história do nosso jornalismo.
Construir estranhamentos foi a escolha na seleção do elenco. Assim, a quase sempre cômica Luciana Paes ficou com um papel sério, e a dramática Rejane Faria, com um papel cômico. E não para por aí: a versátil Bruna Linzmeyer trabalha na chave da comédia interpretando a repórter Rata, que faz concorrência com o NP na televisão.
Como o foco dos episódios são as matérias do NP, os personagens não são tão bem desenvolvidos e não têm vida fora da redação. Por isso, os casos e casais se formam ali mesmo no ambiente de trabalho, seja entre colegas de redação ou entre jornalistas e entrevistados.
O final da série de sete episódios aponta para uma possível continuação, que seria muito bem-vinda. Pauta é o que não falta na história colorida e curiosa do NP, um dos jornais mais amados e mais icônicos da história do nosso jornalismo.
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