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Quarta temporada de “My Brilliant Friend”, com maestria, põe ponto final à tetralogia napolitana

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As meninas geniais de Elena Ferrante estão de volta, para a última parte de uma saga da vida real. Lila e Lenù já não são mais meninas: são mulheres maduras, decididas e donas dos próprios narizes e destinos. Fazem escolhas duvidosas, é verdade, mas lidam com as consequências. E é ao mesmo tempo uma delícia, por causa das escolhas narrativas, e um pesar, por estarmos perto do fim desta obra-prima, assistir à quarta e última temporada de “My Brilliant Friend”.

Separada de Pietro Airota, Lenù (Alba Rohrwacher) volta para o bairro onde cresceu em Nápoles – local que para ela significava mais “Lila” do que “família”… ora, não era a melhor amiga quase um membro de sua família? Lenù encontra tudo mudado e, desde o começo deste quarto capítulo, encontra Lila (Irene Maiorino) convertida em uma mulher respeitada e bem-sucedida, trabalhando junto do amado Enzo (Pio Stellaccio) numa firma de computadores. De repente, a mãe de Lenù não apenas elogia Lila, como dela depende e a compara com a filha, o que desagrada Lenù.

A relação com Nino (Fabrizio Gifuni) é mais que dissonante para Lenù, é paradoxal: ao mesmo tempo em que ela escreve sobre protagonismo e autoria femininas, se submete a um homem cheio de grandes e incontáveis defeitos, e confessa que o ama mais que a suas próprias filhas. Ele é incapaz de se separar da mulher, Eleonora, e vive despreocupadamente, deixando Lenù sobrecarregada com a casa e as filhas, o que praticamente a impede de se dedicar a escrever um novo livro.

Havia altas expectativas com relação ao novo elenco, uma vez que o amadurecimento dos personagens também demandava atores e atrizes mais maduros. Alba Rohrwacher não se parece muito fisicamente com a atriz que interpretava Lenù nas temporadas pregressas, Margherita Mazzucco. Por outro lado, Irene Maiorino tem uma semelhança física e de trejeitos com Gaia Girace que é de se espantar. Fecha o trio de protagonistas Fabrizio Gifuni como Nino, que tanta discórdia causa entre as amigas.

Várias reflexões tomam forma ao longo da temporada. Para nós, chamados de “inteligência sem tradição” pela ex-sogra de Lenù, que somos ninguém e queremos mais que tudo ser alguém – por isso não somos confiáveis –, para nós a carapuça serve e pode até ser usada com orgulho. Além disso, em muitas situações Lila joga na cara de Lenù verdades inconvenientes. É dever de uma amiga, de uma melhor amiga, falar o que pensa e muitas vezes o que é, mesmo que isso fira os sentimentos da outra? Lila bem que pede desculpas por sua eventual e brutal sinceridade, mas o que foi dito não pode ser tirado da cabeça de Lenù – nem dos espectadores.

Um personagem que se destaca nesta temporada é Alfonso (Renato de Simone). Homossexual, apanha constantemente por usar cabelo comprido, maquiagem e roupas femininas. Ex-empregado dos Solara e hoje empregado por Lila, é agredido mais amiúde por Michele Solara, também como forma deste exprimir sua raiva por não ter Lila para si. Raiva é algo que os Solara cultivam em excesso, agora ainda mais com o novo livro de Elena, sobre o bairro em que ela cresceu em Nápoles. Quando um jornal os identifica como os mafiosos da história, eles passam a ameaçar Lenù, embora acreditem que tenha sido Lila a responsável por colocar ideias na cabeça da amiga escritora. E de fato ela faz isso: Lila persuade e até mente para que Lenù use seu talento e influência como escritora para denunciar os atos dos Solara.

É curioso pensar em como a vida laboral de Lila funciona como um microcosmo das mudanças tecnológicas pelas quais o mundo passou no século XX. Da sapataria com os sapatos sendo feitos artesanalmente pelo pai dela até a empresa de computadores dela e do companheiro Enzo, Lila viu de tudo. Mesmo assim, um dia ela confessa para Lenù que nunca foi muito entusiasmada com nenhum tipo de trabalho, só parecia ser para agradar aos outros ao seu redor. Lila se curvando aos outros? Não parece do feitio dela, mas é uma realidade.

Apesar de ter dez episódios e não os oito das demais temporadas, a série deixou de lado diversas passagens contadas no último livro da tetralogia. Todos os episódios desta temporada ficaram a cargo da diretora Laura Bispuri, escolhida pessoalmente pelo criador da série, Saverio Costanzo, para este trabalho. Em entrevista ao site da Elle, Laura assim definiu sua missão com a série:

“Bem, as duas protagonistas são mulheres mas eu penso que os livros são para todos os públicos. É também um fenômeno feminista, porque é raro ter uma história sobre duas mulheres. Mas não é uma questão [sobre o significado de ter uma temporada inteira dirigida por uma mulher] fácil de responder porque as pessoas me dizem o tempo todo que eu faço cinema feminista mas eu penso que ser uma boa diretora é só ser uma boa diretora, não importa se você está contando histórias sobre homens ou mulheres”.  

Foi um prazer acompanhar as idas e vindas desta amizade que Lenù definiu como “esplêndida e tenebrosa”. Muito se comenta sobre a relação entre Lila e Lenù não ser uma amizade, mas uma dependência tóxica, especialmente do lado de Lenù. É a amiga que a inspira e valida o que ela escreve. É a busca pela amiga que gerou toda a história que acompanhamos desde 2018 na televisão. Dizem que amigos são a família que a gente escolhe. Ao escolher Lila, Lenù tomou uma decisão que afetaria sua vida inteira e também seu legado. Lila disse que Lenù escreve porque se importa com seu legado. E, mesmo se não escrever nada mais, Elena Ferrante já garantiu um legado brilhante, tornado ainda mais brilhante com a adaptação magistral da série de livros para o audiovisual.

My Brilliant Friend

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