Donnie Darko é considerado um filme cult do inicio dos anos 2000 – debutada em 2001 – por muitos amantes da ficção científica e do trilher psicológico, bem como a série animada cyberpunk Serial Experimental of Lain recebe tal adjetivo – cult -, e para quem pende à música, a atmosfera da banda Radiohead, ainda mais no álbum “Ok, Computer”, agrada quem curte trilhas do gênero. O que tudo isto tem em comum? Um mundo de sensações dirigidas a um epicentro convulsivo que germinou no fim da segunda metade do século XX, em conforme com a Revolução da Informática.
Na música, a melancolia do fim do Do It Yourself foi disseminada do fechar de portas dos anos 70 pelas bandas inglesas. Também, a tecnologia sonoplástica que invadia os estúdios do indie já mostrava a força da máquina computadorizada, e nisto tudo se perdia o homem com tantas novidades, numa espécie de estado catatônico.
Destaco numa espécie de estado catatônico, pois a doença em si não é exclusiva da constante interação ao ambiente virtual como mostra muitos filmes e gibis. Ela foi eleita por símbolo da confusão entre real e virtual. A época marcou-se pela esquizofrenia dirigida no campo artístico. Uma intenção de retrato da época – uma questão da Arte é seu aspecto inventivo e reflexivo.
Nisto situa-se, como iniciado, os alguns ícones da geração citados, em seus respectivos campos artísticos – poderíamos lembrar também de Neon Genesis Evangelion, Matrix, Ergo Proxy, Bjork, Neuromancer e a rejeição disso tudo pelo Dogma 95.
Ainda é digno de nota que essa tempestade de sensações já foi conhecida do público no nascimento da Modernidade artística e até mesmo na inconstância barroca.
Os jovens Donnie Darko e Lain são retratos fieis do individuo paranoico em um mundo virtual, cientificamente cheio de possibilidades para seus anseios e inseguranças, seja aparelhados de eletrônicos ou singulares nos avanços da física teórica. A ficção científica psicológica eclodiu forte em cima desses pilares de instabilidade e opções.
É estranho usar um longa já no século 21 para falar de seu antecessor. Mas atentemos também a outra curiosidade aparentemente contraditória: que o filme é ambientado no fim de 88. Isso atesta apenas o caráter transitório das convenções: o que falo foi fruto que germinava antes e que semeou depois, destacando-se.
Outro ponto a se ver é as diferenças nítidas das produções: o cyberpunk que adentrou Lain e Ok, Computer difere-os da produção de Richard Kelly, porém apenas pelo significado do prefixo cyber, pois o punk, a violência de Donnie se comunicam com os ataques de nervos da personagem de Chaiki Konaka e com a revolta de Paranoid Android. Interessante notar ainda a bipolaridade das obras: aquela notável diferença entre uma primeira parte “marejada” e um brusco grito de guitarra da tal canção do Radiohead, coincide com os humores volúveis dos outros dois personagens.
Em tudo, o arquétipo que se tem da ficção psicológica é o chiado mental de uma esquizofrenia em meio a tantas possibilidades novas. A saída?
Bem, a saída foi os sentimentos. A elevação do que se sente sobrepondo a confusão da própria identidade é clara. Donnie e Lain se encontram ao olharem para vida de seus próximos – e mudarem a realidade para o bem deles – , e nisto, até mesmo a preocupação com uma sociedade falseada cantada pela banda inglesa é exemplo de cuidado com a felicidade verdadeira. Os sentimentos verdadeiros foram a saída de uma provável esquizofrenia contemporânea, diz a Arte.
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