Arte e Paixão se encontram em “A Grande Beleza”

Essa é uma daquelas resenhas que apresentam a saudável dificuldade de encontrar palavras que descrevam a fruição do filme em questão.

“A Grande Beleza”, filme italiano de Paolo Sorrentino que está concorrendo a vários prêmios internacionais, é uma belíssima atualização de Fellini e Antonioni. Me sinto extremamente ousada em fazer este comentário, mas ao mesmo tempo tenho o respaldo de meus instintos visuais sentidos ao longo da experiência de assistir as 2 horas e 20 de filme.

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A história gira em torno do protagonista, Jep (Toni Servillo), um crítico de arte que vive rodeado pela alta sociedade italiana e cuja rotina envolve ir a festas madrugada adentro e dormir pelas manhãs. Seu universo é o do artifício e das aparências, cuja fauna é preenchida por ex-famosos, socialites de Roma, artistas contemporâneos vazios de sentido, modelos, atrizes, etc. Depois de ter escrito um romance muito bem recebido, e até mesmo premiado aos 20 e poucos anos, concentra suas habilidades de escritor no trabalho de jornalista em uma revista de arte muito bem conceituada.

A primeira reviravolta do filme se dá quando Jep, logo após seu aniversário de 65 anos, recebe a notícia de que a mulher por quem foi muito apaixonado e com quem teve um relacionamento aos 18 anos de idade, faleceu. Apesar da tristeza imediata, as verdadeiras consequências desse choque só serão sentidas ao longo de outros acontecimentos que desencadearão mudanças emocionais no personagem e questionamentos construtivos sobre sua vida e sobre determinadas encenações que acompanham o pacote de seu ambiente.

Cena-do-filme-A-Grande-Beleza

Apesar da crítica à falsidade, aos artifícios da riqueza e ao vazio das aparências, o diretor introduz um olhar de empatia na sua maneira de filmar e através da sensibilidade do protagonista.

Jep é um homem que desistiu de escrever romances há muito tempo, pois acredita não mais ter acesso à experiência que busca enfurnado no seu meio, a experiência da grande beleza. O aniversário de 65 anos e a morte de sua ex-paixão fazem-no aguçar o olhar e a mente, sedentos pela satisfação do belo e o levam a se afastar daquilo que não quer ou que não lhe traz prazer. As máscaras que foi criando ao longo dos anos vão cedendo e expondo-o a vulnerabilidades há muito não sentidas.

O trabalho de fotografia e de som são impecáveis, assim como a montagem – o ritmo das cenas, a dublagem, os cenários, a decisão de contra luz ou de câmera lenta, os closes centralizados ou os planos abertos isoladores, os efeitos sonoros constantemente trazendo à tona subjetividades do personagem – tudo isso feito com delicadeza e esmero. Não há uma cena que não demonstre extrema atenção da parte dos realizadores para nos demonstrar os acontecimentos da melhor maneira possível.

As semelhanças com Fellini e em particular, “La Dolce Vita”, podem ser enumeradas desde

Fontana-di-Trevi-Anita-Ekberg

– A profissão do protagonista, que como Marcelo Mastroiani, era jornalista, apesar de não paparazzi, como o primeiro.

– O universo do bizarro, dos rostos gordos e enrugados, narizes e olhos grandes filmados em evidência

– Como em La Dolce Vita, o filme se passa todo em Roma e a cidade, longe de ser um cenário qualquer, está em questão. Não mais a Fontana di Trevi, mas esculturas secretas em grandes casas e a Piazza Di Navona.

– Não mais Anita Ekberg ou Anouk Aimée, mas uma mistura da voluptuosidade da primeira com os cabelos negros da segunda se encontra na personagem, interpretada por Sabrina Ferilli, que despertará um brilho no olhar de Jep.

– A própria religião, tão comum no imaginário visual de Fellini, está presente aqui em forma de freiras, padres e até santas.

– Alguns diálogos estranhos e silêncios constrangedores ou simplesmente o silêncio como reflexão para a imagem, como um comentário surdo são elementos que também estão lá, assim como em Fellini e Antonioni.

– A festa como o momento da catarse maior e da quebra das regras também é outro elemento em comum, muito como em “A Noite” de Antonioni.

Sinto a importância de ressaltar aqui que em nenhum momento, porém, o diretor deixa de ser solidário ou de mostrar de forma humana essa fauna do luxo. Não cai em dicotomias nem em redenções.

Além de qualquer comparação possível com os grandes clássicos dos gênios italianos, “A Grande Beleza” não requer nenhum conhecimento prévio para se deixar apreciar. Seu frescor, sua sensibilidade e delicadeza nos preenchem de vida e de intensidade nesse quase épico da redescoberta do olhar e das raízes. E da paixão como grande chave para a beleza, porque afinal de contas, é tudo um truque.

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