A nova leva de comédias nacionais no cinema segue a velha rotina de sempre: fazer o possível (nem que seja na base da força) para conseguir fazer o público rir, mesmo que a história não faça o menor sentido, a direção seja qualquer nota e o elenco não tenha a oportunidade de fazer um bom trabalho, engessado em fórmulas e bordões já gastos e que não permitem nenhuma inovação em seu formato.
Geralmente, elas são estreladas por um nome consagrado na TV ou em apresentações de stand-up comedy, como Fábio Porchat ou Ingrid Guimarães, e o resto serve apenas para ser “escada” destes novos astros. Leandro Hassum também entrou para este “seleto” grupo ao protagonizar “Até que a Sorte nos Separe” em 2012, que se tornou a maior bilheteria daquele ano ao ser visto por mais de 3,5 milhões de pessoas. Os produtores não pensaram duas vezes e realizaram uma sequência num curtíssimo espaço de tempo. Assim, “Até que a Sorte nos Separe 2” chega aos cinemas no fim de 2013, pronto para abocanhar uma boa bilheteria em mais de 700 salas em todo o Brasil. É uma pena, no entanto, que o filme nada mais é do que uma desnecessária continuação de uma obra que já não era lá grande coisa.
Depois de perder todo o seu dinheiro, conquistado com uma aposta da Mega-Sena, Tino (Leandro Hassum) passou a viver modestamente com sua esposa Jane (Camila Morgado, no lugar de Danielle Winits) e seus três filhos. Até que, um dia, o casal fica sabendo que o Tio Olavinho (Maurício Sherman, no filme anterior) bateu as botas e deixou para eles R$ 100 milhões de herança. Como último desejo, ele pediu que suas cinzas fossem lançadas no Grand Canyon, nos EUA, por alguém que realmente gostasse dele. Apesar de não morrerem de amores pelo tio, Tino e Jane (com os dois filhos mais velhos) viajam para cumprir a missão. Os problemas começam quando a família decide dar uma passadinha em Las Vegas e Tino volta a torrar todo o dinheiro num jogo de cartas numa área exclusiva para clientes Vip (incluindo estrelas como Sylvester Stallone, Johnny Depp e Oprah Winfrey, vividos por sósias dos astros). Ele acaba devendo para um misterioso bandido chamado Manochaco e é perseguido por seu comparsa, Garcia (Charles Paraventi). Mais uma vez, Tino precisa esconder a verdade da família enquanto tenta encontrar uma solução para o seu problema, se envolvendo em ainda mais enrascadas.
A escolha de Las Vegas como principal locação de “Até que a Sorte nos Separe 2” soa como uma ironia, já que a capital do jogo nos EUA tem como um de seus principais atrativos as máquinas de caça-níqueis e é exatamente isso que o filme é, um mero passatempo descerebrado, com uma direção sem nenhum pingo de cuidado de Roberto Santucci, que se tornou uma espécie de Midas do cinema brasileiro com sucessos como os dois filmes da série “De Pernas Para o Ar”. O roteiro, assinado por Paulo Cursino e Chico Soares, é cheio de furos na narrativa e com situações que, muitas vezes, simplesmente não têm a menor graça. Um exemplo: alguém consegue rir de uma cena em que Camila Morgado (estreando em comédias) relembra quando contou à mãe (Arlete Salles) que estava grávida, como se fosse uma sequência retirada do filme “Olga”, que ela estrelou, em seu primeiro filme no cinema? É preciso forçar muito a barra para achar algo assim realmente engraçado.
Outra coisa que não funciona em “Até que a Sorte nos Separe 2” é o excesso de participações especiais. Embora seja muito bom rever na telona Jerry Lewis, um dos grandes nomes da comédia de todos os tempos, são constrangedoras as cenas em que ele volta a viver o personagem de um de seus sucessos, “O Mensageiro Trapalhão”, pela simples constatação de que elas são absolutamente desnecessárias e só podem ser vistas como uma homenagem (ainda que mal feita) a um grande humorista. Já no caso de Anderson Silva, não dá para perdoar. O lutador de MMA deveria se manter dentro dos octógonos, pois não tem talento nenhum como ator e o texto ruim que teve para o seu personagem (um guarda-costas que jura ser apenas um xará do Spider) prejudica ainda mais a sua presença. Mas, como ele tem muitos fãs no Brasil, com certeza vai atrair ainda mais público, mesmo que seja para vê-lo dar alguns socos e pontapés em Leandro Hassum, num dado momento da produção. A ponta de Marcius Melhem também é totalmente dispensável.
Mas nem tudo está perdido no filme, graças à boa atuação de Leandro Hassum que, sozinho, é capaz de conseguir causar boas risadas, sem ter medo de cair no ridículo, como na cena em que tem que bancar o stripper enquanto tenta fugir de Garcia, ou no momento em que um animal morde as “partes baixas” dele e acaba tomando uma surra da mulher na tentativa de salvá-lo. Ele faz uma boa parceria com Kiko Mascarenhas, que volta como o estressado economista Amauri. Os dois merecem fazer um filme melhor e com menos humor chulo que infesta as comédias atuais, sem ser realmente engraçado. Vale destacar também a presença da veterana Berta Loran como uma antiga funcionária de um cassino que trava um diálogo impagável com Camila Morgado (que não se compromete com sua atuação) e Arlete Salles (no piloto automático).
“Até que a Sorte nos Separe 2” é mais um exemplar do cinema descartável que foi lançado em 2013 e nos faz desejar que, no próximo ano, a situação melhore na telona brasileira. Mas talvez, isso seja mais difícil do que vencer a Mega-Sena umas cinco vezes seguidas. Em sua defesa, pelo menos este filme não entra na lista dos cinco piores lançados nos últimos 365 dias. Mas chega quase lá.
Ah, sim! Se você aguentar até o fim dos créditos, tem uma cena extra que dá gancho para uma possível parte 3. Que, certamente, será feita querendo ou não.
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