O epílogo da vida pode ser encarado como problema ou redenção. Para uns, ganham destaque a perda do viço e da vitalidade, para outros a liberdade de não precisar provar mais nada e se permitir alguns desvarios inaceitáveis na plenitude da vida, tendo como álibi o avançar da idade, o fato de não ter muito tempo pela frente.
“Ciclo da vida” (Fei yue lao ren Yuan, China/2012) estabelece uma ligação entre esses dois contrapontos. De um lado, a ciência das limitações do peso da idade e de outro o apego ao fio energia que ainda resta, iluminado pela lógica onírica de quem sabe que a vida é muito mais simples do que parece. Mas apenas no final dela conseguimos entender.
Na trama, um grupo de velhinhos em uma casa de repouso decide cruzar o país a fim de participar de um programa de variedades da TV. Nessa empreitada eles enxergam a última oportunidade de viver uma aventura longe do moroso confinamento do asilo.
É sabido que no oriente os idosos são, em geral, mais valorizados do que no ocidente, daí, filmes que retratam a chamada melhor idade sempre ganham um viés de tributo, podemos citar como um dos maiores exemplos “Madadayo” de Akira Kurosawa.
Em “Ciclo da Vida”, o diretor Zhang Yang envereda por esse caminho, apesar das tintas humorísticas se misturarem às dramáticas. Neste road movie da terceira idade ele confronta a retidão e sistematicidade dos economicamente ativos – representados pelas enfermeiras e parentes dos idosos – com o universo onírico, apesar de sofrido, dos idosos residentes da casa de repouso, que se entregam à arte e ao lirismo, até como paliativo para aliviar a dor da solidão, do abandono e das implicações decorrentes da idade avançada.
É impossível não torcer pelos velhinhos quando arquitetam o engenhoso plano de fuga, ou seus ensaios “clandestinos” da performance nas dependências do asilo, driblando o olhares das enfermeiras. O maior perigo desse tipo de trama é justamente cair na pieguice ou na caricatura. Felizmente esta passa longe, não temos aqui idosos tentando se passar por jovens, agindo como tais; aquela, no entanto, chega bem próximo, mas Yang conseguiu se desviar do acidente.
O que fica, no conjunto, não é uma visão extremamente otimista do envelhecer, tampouco uma ótica essencialmente dramática. É a velhice retratada exatamente como uma fase da vida, e como tal, há seus prós e contras, suas adversidades e sua poesia. E esse é o enfoque mais relevante: enquanto a vida não se cala, há poesia para ser feita, vivida e saboreada.
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