Fui adiando o momento de assistir Últimas Conversas por pura afeição emotiva. O último filme do gênio Eduardo Coutinho, que fora tragicamente assassinado pelo filho esquizofrênico, soava para mim como uma espécie de adeus.
Coutinho me ensinou a gostar de documentários. Lembro exatamente de, lá no finalzinho dos anos 90, assistir Santo Forte (1999) em imagem capenga na TV Educativa, e me impressionado muito mais até com a forma como resultado era persuadido do que com o filme em si. Fiquei (e ainda fico) intrigado em como ele conseguia – com sua habilidade entre a crueza e a docilidade – arrancar de seus depoentes, uma gama de contradições emocionadas, como se sua verdade como “entrevistador” inibisse qualquer ranço de superficialidade de seu interlocutor. Foi assim em todos os seus documentários, alcançando maior escala e potência dramática na obra-prima Jogo de Cena (2007), um dos melhores filmes da História.
Últimas Conversas é um filme triste. Quase desolador. Muito pelo que sabemos de antemão ao assisti-lo. Não teremos mais Coutinho para nos fazer assimilar o outro pelas arestas de sua vulnerabilidade, algo que ele conseguia com tanta destreza.
Aqui, ele desfila todo seu costumeiro pessimismo, quase que como uma forma de deter expectativas com o outro. Era assim que ele compreendia o mundo.
Pela surpresa de destrincha-lo.
Na verdade, Coutinho buscava um filme sobre como crianças veem o mundo. Não foi possível. Partiu para o universo dos adolescentes de uma escola pública do Rio. Contrariado, reclamou com sua montadora, Jordana Berg: “Não posso amá-los!“. Vai ver era isso. A total falta de comiseração o deixou ainda mais implacável na interpelação existencialista. Descobrindo assim, que adolescentes são bons arquétipos entre a inocência infantil e o cinismo adulto. Seu filme é isso.
No epílogo, ele encontra uma criança como tanto queria. Funciona muito. Mas seu encantamento diz muito sobre o tom de melancolia que nos abate quando os créditos finais aparecem. É como se Coutinho nos deixasse diante de seu prazer com que o mais buscava de seus entrevistados: a verdade dentro de suas inverdades pessoais. A criança era só verdade. Deu-se assim, a sua catarse. Ele dizia: “ter fé é difícil!“. Com sua traumática partida, ter fé é tudo o que nos restou.
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