Se há um ensaio pertinente sobre o conceito de família no cinema recente, esse é “Assunto de Família”, do japonês Hirokazu Koreeda. Mais uma vez o cineasta se debruça sobre um tema que lhe é caro: o âmbito familiar. O contexto já fora explorado em “Pais e Filhos” (2013), que, assim como o novo filme foi premiado com a Palma de Ouro em Cannes, e “Seguindo em Frente” (2008). E, de fato, o mais forte dos vínculos sociais serve de material para desenvolvimento de intensas narrativas
Um casal japonês que vive em empregos de meio expediente, portanto com uma renda inadequada, se beneficia dos frutos do furto em lojas para sobreviver. A rotina incomum está prestes a mudar de quando um incidente faz com que as razões para o hábito familiar e suas motivações passem por uma séria revisão.
A lente de Koreeda capta, com uma bela fotografia e a contemplatividade que evidencia a influência do taiwanês Tsai Ming-Liang, esse raio x de um núcleo familiar desajustado, que gera empatia com o espectador à medida que vai expondo seu modus operandi, e, sobretudo, a origem do clã. Trata-se de uma ex-prostituta se juntou a seu cliente, acolheu uma criança abandonada, roubou outra de um ambiente de brigas incessantes de um casal por terem engravidado.
Juntos eles se gabam de sua destreza de driblar o sistema e zombam do status quo. No entanto, a casa é eivada do amor e união que faltava nas respectivas vidas pregressas. Passada a estranheza da apresentação, que se arrasta um pouco, vamos mergulhando no dia a dia e nas personalidades de cada um, nesse ensaio sobre a liberdade incondicional, seus benefícios e suas consequências. As técnicas usadas nas operações, geralmente encabeçadas pelo “pai” e o filho, rendem momentos inusitados.
O desfecho pode surpreender a alguns, mas o roteiro poderia ter sido um pouco mais corajoso em propor uma análise ainda mais profunda, ao invés de estabelecer uma reviravolta. No entanto, não é nada que tire o mérito do longa, sobretudo por sua acertadíssima direção de elenco.
“Assunto de Família” é merecidamente um dos grandes destaques do ano (é o indicado do Japão ao Oscar de Filme Estrangeiro), e consolida o nome de Koreeda como um dos principais da sua geração no cinema nipônico.
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