Kim Ki-Duk não é um cineasta fácil. O coreano traduz sua inquietude em um cinema visceral de narrativa e estética peculiares, com a agoniante alternância de planos e enquadramentos sofisticados com uma câmera nervosa praticamente amadora. “Fale mal mas fale de mim”, este certamente é seu lema, assim como Cláudio Assis no Brasil e Lars Von Trier na Europa. Seu cinema não tem o menor compromisso com o palatável, é para quem aprouver, e daí? A temática que permeia sua filmografia invariavelmente é a da cólera, vide os últimos filmes “Pietá” e “Moebius”, ambos projetados em edições passadas do Festival do Rio. Em “Dente Por Dente”(“Il dae il”, Coreia do sul/2014) não é diferente.
O cineasta lança toda a sua ira em direção aos estratos dominantes da sociedade, propondo uma subversão vingativa onde os oprimidos ganham vez na calada das sombras. Claro que isso se dá da maneira mais cruel que se possa imaginar, e os já iniciados no cinema de Ki Duk talvez nem se choquem tanto. O grupo de torturadores que se vinga de um status quo nefasto se valendo de acusações brutais, é o veículo por meio do qual o diretor envia seu recado da vez.
Em Moebius ele abordava um drama familiar às últimas consequências, neste ele mostra um virulento conflito de classes seguindo o mesmo viés extremista. Embora não proponha o mesmo desafio que Moebius (o filme não tinha nenhum diálogo), este aqui também é artisticamente relevante, mas certamente não é o seu filme mais impactante. Mantém o padrão de qualidade com um roteiro bem desenvolvido e instigante, que só peca por se arrastar um pouco quando se aproxima do final que não chega a surpreender.
Kim Ki-Duk exige do espectador neófito uma certa calma, pois sua linguagem dificilmente será bem digerida no primeiro contato. Mas é impossível ficar indiferente, que o digam as pessoas que saíram maravilhadas ou revoltadas de exibições de “A Casa Vazia” e “Pietá”. Mas “Dente Por Dente” pode ser considerado uma boa forma de se inserir nesse universo caótico e colérico que o diretor propõe, justamente por ser, de sua obra, o que mais se aproxima do convencional (embora ainda esteja longe de ser considerado como tal). A grande vantagem é que seus filmes dificilmente irão ganhar adaptações hollywoodianas estéreis como ocorreu com “Oldboy”, do conterrâneo Park Chan Wook. Assim como é muito pouco provável que Kin Ki-Duk seja convidado para dirigir qualquer coisa falada em inglês. Nem as poucas falas no idioma presentes no filme serão capazes de atrair os executivos.
Bom? Ruim? Relevante? Indigesto? Fica a critério da audiência, o cineasta certamente ficaria profundamente frustrado se fosse uma unanimidade. O filme pode até ser tudo isso ao mesmo tempo. Como? Apenas conferindo pode-se mensurar. Assista e tire suas próprias conclusões.
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