“Judas e o Messias Negro”: a atemporalidade de um registro

Se é impossível apresentar toda dimensão de um indivíduo por sua biografia, cabe ao seu discurso dimensionar o retrato que se faz dele. Judas e o Messias Negro tangencia a história de vida do jovem ativista e um dos líderes dos Panteras Negras, Fred Hampton. Ou melhor, o elabora através da metáfora que atravessa sua vida e dá título ao filme: um assaltante de carros, William O’Neal (interpretado pelo gênio Lakeith Stanfield), é infiltrado no movimento pelo FBI para monitorar os passos, sobretudo de seu líder. A estratégia resulta num dos maiores traumas de todo movimento negro, sobretudo pela maneira como foi ardilosamente executada.

"Judas e o Messias Negro": a atemporalidade de um registro – Ambrosia

O diretor Shaka King conduz a história como um registro, equilibrando certa simplicidade narrativa com a complexidade dos fatos. Isso quer dizer que por mais que sua estrutura narrativa clássica do infiltrado em situação dúbia de tensão transcorra pela história com facilidade, a densidade do que motiva aqueles personagens, sobretudo Hampton (numa riqueza de sensibilidade de Daniel Kaluuya), eleva o filme biográfico para discussões perturbadoramente atuais, inclusive na tensão social que ela suscita.

King alimenta essa reverberação o tempo todo, especialmente ao colocar seus dois principais personagens em perspectivas dramáticas, fotográficas e cênicas contrastantes, algo já envernizado pela lúcida direção de arte setentista do filme.

A sonoridade africana da trilha, usada como compasso vital, só aumenta a voltagem do discurso falando por si. E é isso que Judas e o Messias Negro mais bate na tecla: mesmo com o presente ainda sangrando feridas de Georges Floyds, o passado reflete como o punho cerrado e o discurso perene resistirão não como curativos, mas como cicatrizações.

Nota: Fantástico – 4.5 de 5 estrelas

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