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Meu Vizinho Adolf!: suspense cômico sobre assunto sério

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ESTA CRÍTICA TEM SPOILERS

 
Com uma nova onda de adeptos do neonazismo e do fascismo, fica uma pergunta para o cinema: está realmente na hora de fazer comédias sobre Adolf Hitler? Bem, parece que esta é a hora mesmo: de “Ele está de volta” (2015) a “Jojo Rabbitt” (2019), há todo um novo filão de comédias sobre um dos seres mais abjetos que passaram pela face da Terra e a doutrina que ele popularizou. Nazista bom é nazista bobo, e se soma a essas comédias completamente escrachadas um novo filme polonês, que talvez nem mereça ser chamado de comédia: Meu Vizinho Adolf!

A tranquilidade do senhor Polsky (David Hayman), que vive isolado numa colina no Chile, é interrompida quando a casa vizinha à dele é comprada por um alemão que morava na Argentina, o senhor Herzog (Udo Kier). Logo de cara uma questão envolvendo uma cerca e a metragem do terreno tira do senhor Polsky suas adoradas rosas negras, mas os problemas não pararão por aí: depois de um confronto direto, o senhor Polsky passa a acreditar que o senhor Herzog é na verdade Adolf Hitler, e fará de tudo para provar que está certo e mandar o vizinho para trás das grades… isto é, se uma amizade não florescer entre os dois homens.

Há momentos de riso leve no filme, como quando observamos a cara do atendente da livraria após o senhor Polsky apresentar suas compras – vários livros sobre o nazismo – e quando somos surpreendidos pelas perguntas de um senhor Herzog embriagado. São momentos que quebram a tensão constante do resto do filme, bem-vindos respiros num eterno suprimir o fôlego.

Meu Vizinho Adolf!

O filme se passa em 1960, depois dos julgamentos de Nuremberg – ocorridos entre 1945 e 1946 – e no momento exato em que nazistas eram identificados como exilados na América do Sul e extraditados para serem julgados pelos crimes contra a humanidade. Neste contexto, como um personagem bem declara, a “obsessão” do senhor Polsky com seu vizinho alemão poderia ser vista como uma estratégia de sobrevivência das vítimas do Holocausto: como ele havia perdido a família em campos de concentração, agora queria punir qualquer alemão que encontrasse pela frente.

Se já fizemos uma ponte com o passado, agora é hora de olhar para passado e presente ao mesmo tempo. As prisões de pessoas conectadas ao nazismo nos anos 60 eram feitas pelo estado de Israel. Pintar os israelenses primeiro como incompetentes, mentirosos e depois como vilões, no filme Meu Vizinho Adolf!, tem mais a ver com a maneira como podemos ver Israel hoje, no confronto com a Palestina e suas muitas violações de direitos humanos. Considerando que parte da equipe por trás das câmeras era israelense, essa hipótese se torna bem pouco provável, mas não deixa de ser uma leitura possível.

Meu Vizinho Adolf!

Meu Vizinho Adolf! é um filme feito com equipe oriunda de diversos países do mundo. Entre os membros da equipe, tínhamos pessoas de Israel, Polônia, Colômbia, Argentina e França. A Colômbia é o cenário escolhido para emular o Chile onde vivem os dois protagonistas. O diretor Leon Prudovsky afirma ter se inspirado em sua avó, sobrevivente do Holocausto, para escrever e dirigir Meu Vizinho Adolf! Nas palavras dele próprio:

“Meu Vizinho Adolf explora a natureza da animosidade. O que acontece se você conhecer seu pior inimigo e começar a ver a humanidade no objeto de seu ódio absoluto? E se você se tornar amigo dele? Ou o ódio é mais forte que a necessidade de um amigo? Existe um lugar para a reconciliação?

Acredito que as questões levantadas por essa parábola são universais e eternas e podem ser feitas sobre qualquer conflito, qualquer lugar e qualquer momento da história. E talvez hoje encontrar as respostas para estas perguntas seja mais urgente do que nunca”.

Meu Vizinho Adolf!

O nome completo do vizinho é Herman Herzog, ou HH – de Heil Hitler. Este é um detalhe que com certeza foi proposital – afinal, nada no cinema é por acaso. Concebido como comédia de humor negro, mas realizado com tom mais dramático e cheio de suspense, Meu Vizinho Adolf! é, sobretudo, um filme sobre reconciliações – como o próprio diretor disse, algo que precisamos mais do que nunca.

Meu Vizinho Adolf!

Meu Vizinho Adolf!
7 10 0 1
Nota: 7/10 Ótimo
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