Depois de infinitos adiamentos, “Morbius” finalmente chega aos cinemas, dentro da proposta da Sony de criar o seu Aranhaverso (ou Sonyverso para os íntimos). Dono de todos os direitos dos personagens de Homem-Aranha, o estúdio passou a focar em desenvolver filmes solo de vilões dos quadrinhos do personagem para chamar de seus, já que após acordo com a Marvel Studios prevê guarda compartilhada do teioso.
O primeiro foi Venom (2018) que trouxe muita alegria para a Sony em forma de bilheteria. Poderiam escolher um vilão mais memorável dentro da galeria do Aranha (como o Kraven, que deixaram para logo mais), só que alguém acreditou que vampiro dava mais certo.
Com uma rara doença no sangue, e determinado a salvar outras pessoas com esse mesmo destino, o doutor Michael Morbius (Jared Leto) tenta uma aposta extrema. O que antes parecia um grande sucesso se revelou como uma solução pior que a doença.
Em sua estrutura narrativa, vemos que esse universo do Homem-Aranha independente do herói (o que soa esquizofrênico por mais que faça sentido para o estúdio) segue a mesma linha: protagonista encontra seus poderes (ou seria maldição), aprende a lidar com eles de forma que por mais ameaçador que se constitua, possa combater o verdadeiro mal, no caso aqui interpretado por Matt Smith.
A diferença entre Morbius e seu predecessor Venom é que no caso do simbionte há o elemento de humor bastante presente, enquanto aqui, humor só mesmo o involuntário. A motivação do personagem e de seu antagonista parecem tiradas de uma anedota, assim como a edição displicente só pode ter sido feita propositalmente por alguém com desejo de vingança contra o estúdio.
Jared Leto até tenta imprimir alguma credibilidade dramática na jornada sombria do protagonista. Mas com um script sem brechas para uma atuação memorável e eivado de clichés narrativos, fica mesmo difícil para o vocalista do 30 Seconds to Mars, em sua segunda incursão pelo universo dos quadrinhos, entrar para a história como Joaquin Phoenix fez com Coringa.
Matt Smith é o vilão, e sua caracterização é a mais caricata possível. Não dá para contar nos dedos quantos antagonistas com as mesmas características e trejeitos já vimos no cinema. Sua transformação se dá sem nenhum traço de desenvolvimento, contando apenas com um flashback que vai justificar sua conduta.
A direção de Daniel Espinosa (“Vida”) corrobora a proposta do projeto que é evitar a todo custo qualquer tipo de risco ou arroubo criativo. Ali estão todos os clichés imagéticos de filmes de terror e ficção. O cineasta até chega a flertar com o b e os filmes de vampiros clássicos (Nosferatu de Murnau é referenciado). Mas todo momento que parece emergir algum brilhantismo, ele se lembra de que está ali a serviço de uma produção ávida para abranger o maior público possível, e volta ao feijão com arroz.
“Morbius”, por ser um personagem obscuro e sombrio, poderia render um filme ousado. Mas já ficou claro que essa não é a intenção da Sony. Após o pavor causado pelas primeiras críticas bastante negativas, o estúdio vê no público casual a luz no fim do túnel, como ocorreu com “Venom: Tempo de Carnificina”.
A seu favor também está o fenômeno Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa, que ainda reverbera. O bilionário último filme do Aracnídeo é a principal muleta sobre a qual se apoia o longa, para compensar sua mediocridade. Isso fica claríssimo na cena pós-créditos, visivelmente feita às pressas para oportunamente aproveitar o fenômeno. Inclusive foi o que causou o último adiamento.
Por fim, “Morbius” é um filme genérico de vampiro. O pedigree de vilão do Homem-Aranha suscitou interesse natural de tudo que vem sob o guarda-chuva da Marvel atualmente. Não fosse isso, certamente passaria batido em algum canal a cabo ou serviço de streaming gratuito.
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