“O Homem do Norte” é um épico que já chega com pedigree. Trata-se do novo filme de Robert Eggers, que regalou o cinema recente com “A Bruxa” e “O Farol”. A coesão entre seus filmes vai além do título puxado por um artigo definido. O trabalho de ambientação opressora – com um cinza inebriante predominando a cena – e a reconstrução histórica e linguística meticulosa já podem ser considerados as marcas registradas do diretor.
Para compor sua nova fábula, Egger recorreu à Islândia ancestral, mais precisamente ao poema que inspirou William Shakespeare a criar Hamlet. Para tanto, o cineasta não poupou tinta na crueza e na violência. É uma narrativa proibida para aqueles de nervos sensíveis. O longa nos remete a “Conan: O Bárbaro” (a associação mais fácil e imediata), e também a “Conquista Sangrenta” de Paul Verhoeven, cineasta que compartilha com Eggers o hábito de não amenizar a intensidade que o script venha a exigir.
O peão do tabuleiro de Eggers é o ator sueco Alexander Skarsgård, que dá vida ao nórdico Amleth, que testemunhou o assassinato do pai pelas mãos do seu tio Fjölnir. Ele escapa da sina jurando vingança e retorna já adulto para esse desiderato.
Skarsgård interpreta o protagonista eivado de naturalismo, esbanjando uma competência e galhardia que passaram longe do seu vexaminoso Tarzan (no equívoco chamado “A Lenda de Tarzan”). Pode-se dizer que ele faz o que Arnold Schwarzenegger faria se tivesse talento cênico em 1982.
Do outro lado está Claes Bang, ator dinamarquês que interpreta o tio vilanesco de Amleth. Ele imprime no rei impostor a ironia e os traços repulsivos que fazem o antagonista crível e de certa forma envolvente.
No meio estão Nicole Kidman e Ethan Hawke. Ele (quase irreconhecível) em uma participação no tom certo. Ela em uma das melhores atuações de sua carreira, sabendo corresponder às camadas de sua personagem sem cair na armadilha do excesso, o que poria o resultado a perder.
O diretor quis trazer também colaboradores de seus longas anteriores como Willem Dafoe (“O Farol”), em uma pequena participação, e Anya Taylor-Joy (“A Bruxa”) no principal papel feminino.
A escalação de um elenco composto por escandinavos (até Björk tem participação) é um dos acertos do filme, embora seja falado em inglês – apenas alguns cânticos e frases são proferidos no idioma nativo. Mas trata-se do nórdico antigo, vale salientar.
Para contar essa história, Eggers teve a ajuda do islandês Sjón na concepção do roteiro. O desenvolvimento em si é retilíneo, seguindo a tradicional estrutura da jornada do herói em busca de vingança. No entanto, a dupla o faz com uma engenhosidade que é um irrefutável deleite, sobretudo para os fãs de mitos nórdicos.
Vale lembrar que em “A Bruxa” Eggers fez questão de recriar com bastante fidelidade a América colonial. Tanto que o filme é falado em inglês daquele período. Aqui ele se deixou levar um pouco mais pela fantasia, mas também foi feito um trabalho de pesquisa bastante acurado.
“O Homem do Norte” além de confirmar a excelência de Robert Eggers como um dos mais relevantes cineastas da cena atual, agracia-nos com o melhor exemplar de espada & feitiçaria em anos. Os apreciadores do gênero, que teve seu apogeu de popularidade nos anos 80 (e um certo júbilo na TV nos anos 90), estão incumbidos da obrigação moral de correr para o cinema e prestigiar essa obra.
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