O diretor norte-irlandês Mike Leigh ambienta o seu longa “Peterloo” numa Inglaterra vinda da vitória fulminante de Waterloo diante das tropas de Napoleão Bonaparte (daí o nome dado ao fato real que ocorre na cidade de Manchester, comparando o massacre ocorrido no país ao mesmo que as tropas britânicas fizeram na cidade belga). O cineasta reconstitui o cenário de uma maneira suja, real e ao mesmo tempo deslumbrante, mostrando como se davam as diferenças de classes na terra da Rainha. Se de lado vemos os membros do Parlamento Britânico tendo uma vida frugal, do outro lado vemos a realidade nua e crua (poucas vezes mostrada no cinema com tanto realismo) da classe trabalhadora no período da Revolução Industrial, que começa a se organizar para ter representatividade no Parlamento e assim obter uma voz que faça ouvir suas reivindicações.
O roteiro do filme prima por trazer a dicotomia entre as duas classes sociais e como cada um
discursa para si mesmo. No caso da classe política, Leigh não poupa nos diálogos o quanto eles
desprezam e odeiam as camadas populares. A sequência que se passa no dia da greve e as máquinas de lã estão paradas nas fábricas, com o seu dono se sentindo ultrajado, dizendo que como eles o traem por não trabalhar nesse dia, uma vez que ele dava todos os confortos possíveis a seus trabalhadores, mostra muito bem esse tipo de pensamento. Pelo lado dos trabalhadores, também é importante notar que apesar de terem um objetivo em comum, cada um deles veem os meios de com chegar lá de maneira diferente.
Além da chegada do orador que veio de Londres Henry Hunt (Rory Kinnear), que é de classe alta, mas apoia os trabalhadores, está sempre muito bem vestido (em contrates com todos que o cercam) e possui o discurso pacifista que proíbe terminantemente que qualquer pessoas que vá ao local do discurso da greve porte qualquer tipo de arma para se defender, temos outros líderes locais que acham que é necessário estarem armados, pois conhecem como qualquer manifestação local termina com essa intervenção do Estado.
A ambientação e os cuidados com o figurino e a estética dos personagens chama muito a
atenção. Os detalhes da caracterização dos personagens mais pobres impressiona, pois vemos os detalhes das suas roupas sujas e poidas, a sujeira em seus rostos, as bocas maltratadas, com dentes castigados ou mesmo a falta deles. O ambiente claustrofóbico da cidade e mesmo de cada casa, faz com que sintamos a escuridão e a sujeira que os cercam o tempo todo.
“Peterloo” é um filme que mexe com o coração das pessoas que ainda se importam com os outros e que mostra a realidade de uma sociedade inglesa que por muitas vezes era tratada no cinema
como o exemplo de civilidade, e que Leigh mostra o seu lado mais cru, visceral e podre que ela
sempre foi.
Cotação: Excelente
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