A submissão de uma esposa traída, maltratada pelo seu marido e restrita ao monótono mundo doméstico dá lugar a uma carreira em negócios marcada pela competência, uma espécie de modelo para o movimento feminino na década de 1970. A primeira coisa que você deve ter pensado ao ler esta descrição é em um daqueles filmes de superação hardcore dirigidos pelo Clint Eastwood, talvez com a Julia Roberts no papel principal, fazendo cara de sofrimento.
Mas Potiche – Esposa Troféu (2010, de François Ozon) é uma comédia. Nada nos moldes de Se Beber Não Case, que rende gargalhadas vociferais. É, sim, uma comédia comportamental, um filme leve, cujos acontecimentos simplesmente não se levam muito a sério, mas divertem bastante. Por exemplo, logo no início, em meio a uma greve de funcionários da fábrica de guarda-chuvas, quando o senhor Robert Pujol (Fabrice Luchini), que muito parece com o Fernando Meirelles, é sequestrado pelos grevistas, o espectador não fica esperando que a história vá se desenrolar de forma muito trágica e que Denzel Washington vai aparecer para negociar com os sequestradores. Na verdade, quem resolve a questão é a senhora Pujol (ninguém menos que Catherine Deneuve), herdeira legítima da fábrica, que passa de dona de casa rica e desocupada, a negociadora muito mais hábil que seu marido, que até então controlava a empresa. Ele adoece e Suzanne Pujol assume e reformula a fábrica. Um impasse surge, porém, quando ele retorna.
Parte da virada de mesa da inofensiva dona de casa, envolve um antigo romance, mal resolvido e extra conjugal, com o comunista Maurice Babin (Gérard Depardieu, para mim, o eterno Obelix). Babin, de certo modo, é responsável por emplacar uma inversão feminista: por trás de toda grande mulher, há um grande homem. Além disso, dá tons românticos à saga madura da personagem de Deneuve.
O filme é todo de Catherine Deneuve. As tomadas mais longas dela sozinha se exercitando, escrevendo poesia, andando pela fábrica, dando entrevista e muitas outras ações do seu cotidiano em metamorfose provam isso. E sem ela tudo seria muito diferente nessa obra de François Ozon. O seu olhar, sua postura, seu jeito despreocupado, às vezes até um pouco impassível, revelam que Suzanne é uma mulher objetiva e forte desde o início, apesar de todas as mudanças.
Na narrativa, a maioria dos acontecimentos são um tanto arbitrários. Para uma comédia, isso funciona lindamente, pois dá ao filme a agilidade necessária. Por outro lado, não há muita profundidade em nada que o filme aborda, pois tudo tem tom cômico. Potiche provavelmente não ganhará prêmios e não lhe fará refletir, mas ficará no seu imaginário cinematográfico como um filme adorável e como uma doce homenagem a Catherine Deneuve.
Potiche – Esposa Troféu, que foi uma das maiores atrações do Festival Varilux de Cinema Francês, estreiou dia 23 de junho.
[xrr rating=4/5]
Título Original: Potiche
Ano: 2010
País: França
Direção: François Ozon
Duração: 103 min
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