Produção franco-brasileira “La Parle” deixa um gostinho de quero mais

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Quantas boas histórias podem ser ambientadas na praia? A resposta é simples, mas ao mesmo tempo complexa: um monte. O produtor Mack Sennett já sabia disso, tanto é que tinha sua trupe de “bathing beauties” (algo como “belezas banhistas”, lindas jovens em roupas de banho) para transformar qualquer uma de suas comédias com cenas na praia. É na praia que Deborah Kerr e Burt Lancaster dão seu beijo ultra apaixonado em “A Um Passo da Eternidade” (1953) e é também na praia que Charlton Heston descobre a verdade sobre o planeta onde pousou em “Planeta dos Macacos” (1968). É na praia também que acontece a ação no filme multinacional La Parle.

Os amigos Fanny, Kevin e Simon vão para a localidade costeira de Guéthary, na França, onde sua cicerone será a brasileira Gabriela. Fanny está fazendo exames de controle após ter câncer de mama, Kevin está editando um curta-metragem que fez sobre a primeira vez que encontrou o novo padrasto, e Simon foi o ator principal deste curta. Gabriela, por sua vez, vive ao telefone com a avó, uma senhora que parece se esquecer o tempo todo de que a netinha está na França. Entre um mergulho e outro, os quatro se conhecem melhor e trocam impressões nestas férias inesquecíveis.

Guéthary é conhecida por suas ondas incríveis. A menor vila da Costa Aquitânia, lar de comunidades de pescadores – no passado, inclusive de caçadores de baleias -, Guéthary atrai milhares de turistas dispostos a surfar a onda gigante La Parle. Reza a lenda de que, através desta onda mítica, nossos ancestrais colocavam a vida em perspectiva e tentavam resolver seus problemas – exatamente como os quatro mais fazem.

O filme é quase todo fotografado em preto e branco, o que nos impede de ver as belezas coloridas da praia. A única cor que desafia e invade o bicromatismo ao final do filme é o azul, simbolizando bons ventos – como na expressão “tudo azul” – e nos dando, finalmente, uma noção do que é o azul das praias de Guéthary, algo que só podíamos imaginar anteriormente.

La Parle é o primeiro fruto da residência artística do gabaritado diretor Claude Lelouch. Gabriela Boeri, única brasileira na residência que durou um ano, conheceu na ocasião as outras três pessoas com quem faria o filme: Fanny Boldini, Kevin Vanstaen e Simon Boulier. O quarteto assina a direção, filmagem e compõe o elenco de La Parle. Filmado inteiramente com iPhones, em três momentos entre 2018 e 2020, o filme teve seu roteiro, também obra do quarteto, revisado e modificado a cada encontro, como comenta Gabriela:

Tínhamos um roteiro inicial, que foi nosso ponto de partida. Compartilhamos questões e conflitos reais das nossas vidas e, a partir deles, escrevemos uma ficção. Conforme fomos filmando e montando as cenas, também fomos alterando essa base e incorporando as transformações que estávamos vivendo. Como nunca tínhamos atuado, os conflitos reais nos ajudaram muito na interpretação das cenas de ficção. Essa mistura de realidade e ficção é a essência da narrativa. O fato de sermos os protagonistas e de termos filmado com o celular também faz parte da gramática desse roteiro.”

A sensação que fica quando chegamos ao final dos 73 minutos da película é o famoso “quero mais”. Queremos acompanhar aqueles personagens além das férias, queremos ver o curta-metragem de Kevin e Simon, queremos conhecer mais da trajetória de Fanny e Gabriela até ali e além. Descrito como “um filme que quer dar voz à essa geração que vive uma adolescência tardia na chegada dos trinta”, La Parle faz isso e vai além, como este “quero mais” bem simboliza.

NOTA 7 de 10

La Parle

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