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Quando a cultura da periferia chega ao cinema

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Depois do sucesso de crítica e nos festivais de “A cidade é uma só”, o novo filme de Adirley Queirós, “Branco Sai, Preto Fica” mais uma vez mescla com propriedade e carisma as linhas da fronteira entre documentário e ficção. Inspirando-se em um evento real que ocorreu na década de 80 nos arredores de sua cidade, Brasília, Adirley cria personagens misteriosos que flertam o tempo inteiro com o hiperrealismo. Também, novamente, a narrativa se divide em três núcleos: o primeiro, da composição e gravação de um disco de rap, que se situa em torno da criação de um dispositivo de luta, uma bomba cultural vinda da periferia; o segundo, do visitante do futuro que flana pela cidade e rememora o evento chave motivador de todos esses encontros na busca de provas para responsabilizar o descaso do Estado e o terceiro, do homem que trabalha consertando e fazendo próteses de pernas. Os dois personagens e atores, tirando o mensageiro do futuro, estavam presentes no dia em que a polícia invadiu o baile de dança e música que frequentavam, para “meter a porrada” na juventude negra. Ambos sofreram graves consequências deste “incidente” e da violência policial, que no meio da confusão, disparou tiros.

Apesar dessa fria camada de realismo, restituída por depoimentos e fotos, que não detalham muito, mas dão a entender bem sobre o acontecido, a grande aura do filme é o clima de ficção científica. Para ambientá-lo dessa maneira, o diretor se utilizou de gambiarras, eletrônicos, efeitos sonoros, luzes piscantes e computadores que conseguem, através da imaginação, acessar todo tipo de informação e criar acessórios mirabolantes. Somos convidados a acompanhar a dura vida desses personagens, rodeada por mitos, fabulações e uma total reinvenção de suas realidades.

Em termos narrativos, senti uma certa falta de fluidez no ritmo do filme em alguns momentos, aspecto também presente em “A Cidade é uma Só”. Mas diferentemente deste, que parecia prolongar e repetir muitas situações e se perder num deslumbre pela convicção de seus não atores, em “Branco Sai, Preto Fica” esse ritmo descompassado e por vezes lento é algo que parece se dar, não pela inaptidão do diretor, mas como resultado de uma proposta diferente de descentralização dos núcleos da história, que não se prende a uma evolução que quer meramente alcançar seus clímax.

O mundo do rap aparece mais uma vez como forma de auto representação das periferias, contravenção e um universo rico em cultura. Ao se apropriar do gênero de ficção científica, Adirley cria um mundo paralelo, onde, através de recursos mínimos, tudo é possível, até mesmo abordar o tema da violência e do preconceito por parte da polícia, encriminando-os por seus atos. As soluções visuais são extremamente sagazes e a sensibilidade e até mesmo o bom humor com a qual o filme consegue abordar o tema são inspiradores. 

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