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Top Gun Maverick ressignifica o filme original subvertendo os paradigmas do cinemão de hoje

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“Top Gun Maverick” chega subvertendo todas as expectativas que naturalmente foram criadas quando divulgado. Como uma retomada de um sucesso oitentista, esperava-se que se utilizasse da estrutura das “requels” (reboot + sequel), trazendo um personagem clássico passando o bastão para a próxima geração. O elenco seria encabeçado por uma protagonista feminina, e também é compreensível acreditar que, sendo uma continuação tardia, seria bastante inferior ao longa que o derivou.

Trinta anos depois, Pete ‘Maverick’ Mitchell agora é capitão da marinha norte-americana e é um sujeito do seu tempo. Acredita piamente que o trabalho humano não pode ser substituído pela automação, que é a palavra de ordem dentro da marinha. É como aquele motorista de táxi que não usa GPS. “O fim é inevitável, Maverick. Sua espécie está a caminho da extinção”, ouve ele do contra-almirante Hammer (interpretado por Ed Harris). “Talvez sim, senhor. Mas não hoje”, é a resposta. Mais anos 80 impossível.

Maverick é reconduzido ao projeto Top Gun, desta vez como instrutor de uma nova turma de pilotos de caça. De certa forma, temos sim a presença do protagonista da história original servindo de mentor dos novos. Só que ele não serve apenas de guia, visto sob a ótica do novo herói. A história ainda é de Maverick como protagonista. Ele é o mesmo de 34 anos antes (em tempo, o filme foi adiado em 2 anos pela pandemia, então é por aí que a história se passa), só que mais velho. Se de forma simplificada a sinopse pode ser lida como um cara que quer provar que é o bom e pronto, a desse daqui é exatamente a mesma premissa. Só que com um desenvolvimento muito superior.

Imagem: Divulgação Paramount Pictures

O mérito de “Top Gun Maverick” é partir daquele roteiro ruinzinho do primeiro filme (nostalgia à parte, admitamos que Ases Indomáveis é fraquinho narrativamente) criar uma trama tão bem resolvida que valida seu antecessor, ressignificando-o. O longa dirigido por Tony Scott torna-se consideravelmente melhor ao assistir Maverick. Trata-se de um caso raro em continuações, sobretudo tardias, que geralmente precisam da matriz para se validar.

Esse é o mérito do cineasta Joseph Kosinski, diretor de outra retomada de um filme oitentista (só que bem menos feliz), “Tron: O Legado”, que já havia dirigido Tom Cruise em “Oblivion”. Ele consegue dosar de forma adequada os elementos nostálgicos com a renovação, para que a obra seja também penetrável ao público mais jovem. Mesmo que eles não sejam o foco.

A coesão com Ases Indomáveis é reforçada pela fotografia do chileno Claudio Miranda (diretor de fotografia dos trabalhos de Kosinski citados acima), que recupera a identidade visual do filme de 1986, sabendo as horas de emulá-la de fato (como na eficientíssima cena de abertura, capaz de quebrar o ceticismo inicial de alguns, como o desse que vos escreve). E “Maverick” se vale também do fato de o diretor se encontrar em um estado mais gracioso de inspiração do que Tony Scott.

A quebra de paradigma do roteiro do trio Ehren Kruger, Eric Warren Singer e Christopher McQuarrie reside também em não dar nenhum tipo de protagonismo a personagens femininos. Vai na contramão dos recentes resgates de franquias, mesmo as que têm apelo junto ao público masculino, em que as mulheres assumem a dianteira. Como exemplo temos de Star Wars a Ghostbusters. A intenção de reviver aquele cinema banhado em testosterona dos anos 80 não é ruim, mas uma personagem feminina, com desenvolvimento rasteiro, que consta na trama apenas como “a namoradinha do herói”, depõe muito contra, e é um problema em meio aos muitos acertos.

Imagem: Divulgação Paramount Pictures

Fazendo uma inevitável comparação da Penny de Jennifer Connelly com a Charlie de Kelly McGillis, a segunda por mais que fizesse papel de enfeite, exercia uma função importante para o desenvolvimento do protagonista. Já a primeira serve apenas para deixar o filme mais longo.

Tom Cruise de volta ao papel que o catapultou de vez como astro de primeira grandeza parece bastante confortável. Apoia-se mais em seu carisma, entretanto o talento (visto em vários filmes que não são os de ação) aparece sutilmente em determinados pontos da trama, sobretudo no treinamento nada ortodoxo de manobras aéreas que ele ministra aos jovens cadetes, uma das melhores cenas do filme.

Só que parece que nesses mais de 30 anos parece que o personagem não amadureceu, não evoluiu, e se apresenta apenas uma versão mais velha do personagem que vimos no filme anterior. Alguns aspectos o deixam mais humano (como a morte de Goose, que ainda é um trauma), mas no todo, o personagem poderia ter um tratamento melhor.

Imagem: Divulgação Paramount Pictures

Por fim, “Top Gun Maverick” proporciona um belo espetáculo, para ser conferido na maior tela da sua cidade, o que justifica os vários adiamentos que o filme sofreu. Ele merecia uma estreia nos cinemas, de preferência dentro da (quase) normalidade. Não fazia sentido lançá-lo diretamente em digital/streaming, ou mesmo em salas de cinema operando com capacidade reduzida. Trata-se de um belo tributo ao cinemão (no melhor sentido do termo), que chega no momento mais oportuno de reencontro pleno da telona com seu público.

Nota: Excelente – 4 de 5 estrelas

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