Todo ano é a mesma coisa: o mercado anglo-americano solta um monte de filmes “premiáveis” nos cinemas e quando nos damos conta, já é época de Oscar. Sim, aquele período em que sempre (para o bem ou para o mal) percebemos o quanto a premiação da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, não diz muito sobre sua aparente representação e pouco nivela o que de melhor tem sido feito no cinema mundial. Mas o que nos interessa é o glamour e o hype que todo esse circo proporciona, então vamos para a nossa análise anual dos indicados ao Oscar de Melhor Filme, que nesse 2015, são oito:
BOYHOOD de Richard Linklater
Um filme sobre as imperceptíveis curvas dramáticas da vida, muito bem borradas pelo diretor Richard Linklater. O naturalismo vigoroso se debruça sobre conflitos emocionais e/ou de expectativas, com o mínimo de interferência possível, deixando a fluidez de percepções e acontecimentos banais construírem a narrativa de seu personagem. O grande e reflexivo valor desse longa está exatamente em sua capacidade de nos revelar nossa própria inocência frente ao tempo. Um êxito e tanto em tempos tão esquizofrênicos…
BIRDMAN de Alejandro González Iñarritu
Seja cínico. Nem que seja só para entender a si e ao mundo ao seu redor. No (definitivo) filme de Alejandro González Iñarritu essa percepção fica bem clara, quase no limite da paranoia. E ilustrada por um verniz estético que coloca o cinema em primeiro plano e em sedutora perspectiva. A proposta do diretor é um mergulho sem amarras no exercício de metalinguagem que curiosamente constitui o que consiste o implacável mercado hollywoodiano. E os seres que habitam nele.
SELMA de Ava DuVernay
Talvez o filme mais injustiçado do Oscar 2015, Selma é um tratado sobre as injustiças que configuram a urgência do presente sócio-político norte-americano. E Ava é uma diretora que equilibra muito bem a conjuntura histórica de sua forte história verídica (ou a sua radiografia perene de Martin Luther King), com o apelo discursivo que se feitura proporciona. A contundência aqui é tão dolorosa quanto reveladora. Basta ler os jornais para que seus efeitos façam sentido…
O GRANDE HOTEL BUDAPESTE de Wes Anderson
Eis a magnitude do cinema de universos próprios que se legitimam como uma verdadeira experiência cinematográfica. O diretor Wes Anderson destrincha sua imponente visualidade através de suas fixações recorrentes que emanam sempre do olhar juvenil sobre o mundo que o cerca. Para além do que queira contar, Wes ainda é o grande personagem de seus filmes, e isso fica claro pois diante de tamanha concepção visual, reside na melancolia a compreensão de seus personagens.
WHIPLASH de Damien Chazelle
O subtítulo desse longa diz: “Em busca da perfeição“. Mas é justamente como mostra a humanidade das imperfeições que o torna um grande filme. Estamos falando da linha tênue que há (e personaliza) a ambição e a fixação. As feéricas interpretações de Miller Teller e J. K. Simmons traduzem a noção de sadismo para termos muito mais abrangentes da passionalidade. É um filme de extremos com a sutileza objetiva de uma montagem precisa. Tudo isso para entendermos que entre a busca e a perfeição, existe sempre uma dose de contradição.
O JOGO DA IMITAÇÃO de Morten Tyldum
O grande mérito de O Jogo da Imitação está em seu exercício de jogar com seus próprios códigos dramáticos. Talvez, em sua superfície, o filme até deixe sobressair um certo tradicionalismo narrativo. Nem é muito difícil perceber essa característica. Mas o roteiro se empenha em mostrar como seu protagonista, Alan Turing (Benedict Cumberbatch, maravilhoso), traz em si a dimensão do conflito sexual que o marginalizou, mesmo diante de seus feitos históricos. Num filme que fala sobre códigos (em todas as suas implicações possíveis), é na desconstrução deles que entendemos sua superioridade.
A TEORIA DE TUDO de James Marsh
A vida de um dos maiores gênios da ciência moderna, Stephen Hawking já nasceu romantizada, dada a sua história de superação e intrepidez científica, frente ao avanço implacável de sua doença degenerativa. Focar em sua curiosa vida pessoal – sob o prisma de sua ex-mulher – até agrega uma lucidez que o desvia da auto reverência. Mas por outro lado, banaliza um pouco o retrato do homem diante da complexidade da ciência que tanto o atrai. Esse meio do caminho talvez deixe o filme tradicional demais para o que se propõe.
SNIPER AMERICANO de Clint Eastwood
Clint Eastwood é um ativista republicano que me intriga. Nunca sei quando está sendo ingênuo ou calculista. Já havia atentado para isso no superestimado Gran Torino. Em Sniper Americano isso fica um pouco mais evidente pois trata-se de uma alegoria parcial da incoerente política externa ianque. E para piorar, ainda alegorizado com requintes de heroísmo nacional (qual a finalidade daquele atirador antagonista em todo o contexto, gente?). Não precisa ser democrata para entender que na urgência de uma guerra, as decisões podem ser por puro instinto agindo a razão, além das circunstâncias. Não dá para simplesmente atribuir a conduta de um exímio atirador de elite, uma áurea heroica, quando até sua presença ali é encharcada de controvérsia. Clint continua me intrigando bastante…
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