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A Fantasia na literatura em tempos de pseudofelicidade programada

“Entre avatares, filtros, ângulos de selfies, diversão que precisa ser documentada e distração digital, ainda conhecemos o caminho da imaginação?”

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*Por Carolina Magaldi

O primeiro universo ficcional que me forneceu abrigo, coragem e inspiração foi A Bolsa Amarela, de Lygia Bojunga. Ainda hoje reluto em nomeá-lo como um de meus livros preferidos, porque ele representa muito mais do que leitura, fazendo parte da minha história. Aquela narrativa, tão estranhamente familiar, me ajudou a processar conflitos internos, fornecendo um motivo para observar meus próprios passos com mais segurança e alegria.

Essa é a magia da convivência com leituras, principalmente do campo da fantasia. Em seus diversos gêneros e temáticas, a fantasia tem sido, desde sua criação, um espaço para a imaginação, para o escapismo e para possibilidades infinitas. Mas, como essa característica maravilhosa se sustenta quando já vivemos em um mundo de mentirinha?

Entre avatares, filtros, ângulos de selfies, diversão que precisa ser documentada e distração digital, ainda conhecemos o caminho da imaginação? Esse é um desafio global, mas no Brasil, infelizmente, enfrentamos um problema particularmente cruel nessa área.

A formação de leitores no nosso país recebe alguma atenção na fase de alfabetização, chegando ao ápice no volume de leitores entre 11 e 13 anos de idade. Após essa fase, os números se encontram em queda livre, sendo que na meia-idade o volume de não-leitores já supera aquele de leitores, mesmo ocasionais.

A distração, então, é delegada para as telas, para os mundos de competição por felicidade irreal, por corpos surreais, por relacionamentos que cobrem com glitter as lacunas de silêncio. Com isso, perdemos a chance de sonhar juntos, de torcer pelo sucesso de uma heroína ou de sentirmos a emoção de uma amizade que muda o destino do mundo.

Por isso, é preciso conversar sobre fantasia, levar Aslan, Katniss Everdeen, Leran, Sirius Black, Feyre Archeron, Allania e Aragorn, aaos espaços de bibliotecas públicas, cafés e conversas com colegas e amigos, para salpicarmos de fantástico inspirador um cotidiano de castelos de vidro.

Livros de fantasia não solucionam os problemas do mundo, mas fazem um trabalho extraordinário em nos lembrar que heróis improváveis existem e que eles, como nós, podem fazer toda a diferença.

*Carolina Magaldi é professora de tradução literária (inglês/português) na Universidade Federal de Juiz de Fora, lecionando e orientando no âmbito da graduação, mestrado e doutorado. Trabalha também com educação intercultural e bilíngue na graduação e em mestrado profissional em educação. Atua como tradutora há cerca de 20 anos e começou a escrever, publicar contos e seu primeiro romance durante a pandemia, seguindo o conselho que sempre dá aos seus alunos: não deixar os sonhos na gaveta. Seu livro Dharma, publicado pela Editora Paratexto,  é o primeiro livro de uma trilogia.

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