Uma mulher decide escrever e-mails ao primeiro filho, desde o seu nascimento, como presente de aniversário de 18 anos. Relatos de parto, primeiros dias de vida, celebrações e anotações cotidianas. Porém, pouco a pouco, o exercício de alteridade com a criança – outro corpo, mas tão dependente da mãe – se transforma em fragmentos de angústia e da necessidade em colocar a mulher no centro do universo contado. O romance epistolar “Depois que a vida chegou” (Caravana Editorial, 116 pág.), da paulistana Mariana Torres, narra as dores de uma mulher que passa a questionar seu lugar no mundo quando atravessada pela maternidade.
Foi só depois de trabalhar como advogada e empreendedora que a autora encontrou nas palavras sua paixão. “Eu me descobri escritora em meio a uma pandemia e a um puerpério. Entre uma mamada e outra, escrevi uma história pela primeira vez, que seria minha estreia: o livro ‘Clube do Abacate’”, conta. Durante o puerpério da segunda gravidez, escreveu seu segundo romance, “Depois que a vida chegou”. Mariana mora em São Paulo (SP) e passa os seus dias criando histórias, além de dois meninos e dois gatos.
Confira a entrevista completa com a autora:
Você escreve desde quando? Como começou a escrever?
Escrevia quando pequena, mas passaram os anos, comecei a ter vergonha e parei. Voltei a escrever durante o puerpério do meu primeiro filho, que coincidiu com o isolamento da pandemia. Era uma época em que me encontrava perdida, inclusive profissionalmente. Tinha acabado de fechar uma empresa e estava desesperada por não saber o que fazer. Minha analista sugeriu que resgatasse coisas do meu passado, coisas que gostava de fazer. Voltei a ler mais intensamente (minha vida de advogada e depois de administradora não davam muito tempo para essa atividade). Um dia, abri o computador, abri o Word e comecei a escrever de maneira despretensiosa. Todo dia um pouquinho, entre as mamadas do meu filho. Quando me dei conta, tinha escrito bastante. Enviei para meu irmão, que disse que tinha feito um livro. Foi chocante rs.
Como é o seu processo criativo?
Acho que varia bastante. Quando escrevo algo novo, por exemplo, não sei ainda o que será e qual será o fim, a evolução dos personagens. Já tentei fazer isso e não deu certo, ficou artificial. Mas se estou escrevendo uma história longa, procuro revisitá-la todos os dias, nem que seja para escrever uma palavra. Caso contrário, perco o tom. Se volto depois de dois dias, sinto-me uma estranha dentro das minhas próprias palavras.
Ao mesmo tempo, não gosto de estabelecer metas diárias, porque sinto como se houvesse uma obrigatoriedade, como se transformasse algo prazeroso em mais uma tarefa dentro de outras milhões que faço durante o dia. Não digo que já não tentei, mas foram épocas de grandes bloqueios. Para escrever preciso estar relaxada e ao mesmo tempo conectada ao momento, vivendo o presente. Tenho meu canto em casa e gosto de acender velas e rodeá-lo de objetos que têm significado para mim, como coisas que compro em viagens, pedras que coleciono desde criança e até brinquedos de infância. Mas claro que às vezes algo acende dentro de mim e posso estar até numa reunião da escola do meu filho, mas pego o que for para anotar as palavras. Quase como se vomitasse um texto que já estava pronto dentro de mim e brigando para sair.
Se você pudesse resumir os temas centrais de “Depois que a vida chegou”, quais seriam?
As dores de uma mulher que passa a questionar seu lugar no mundo quando atravessada pela maternidade.
Por que escolher esses temas?
São temas que conheço profundamente, além de pertinentes.
Quais livros influenciaram diretamente a obra? Como foi o processo de escrita?
Difícil dizer livros que influenciaram diretamente a obra. Posso falar sobre uma autora que influenciou diretamente, Aline Bei. Fazia minha segunda oficina de escrita com ela, durante o meu segundo puerpério. A oficina era focada no desenvolvimento de projetos mais longos, como romances. Num de nossos encontros, desabafei sobre a minha incapacidade de escrever e criar um projeto. Chorei, falei sobre a raiva que sentia do meu filho recém nascido naquele momento e o fato de ninguém entender os meus sentimentos, nem mesmo meu marido e minha mãe. Eu fui acolhida não só por ela, como por todo o grupo. Ela me disse: “escreva sobre esse sentimento, você pode se fazer entender pelas palavras escritas”. Assim fiz. Tudo meio bagunçado. Passados alguns meses, revisitei esses escritos e a partir daí criei uma história.
Quais são as suas principais referências como autora?
Acho que a principal seria Elena Ferrante. Antes dela, lia muitos autores masculinos e quando entrei em contato com a sua obra me senti representada como mulher pela primeira vez. Ela abriu a porta para que eu me jogasse nos livros das escritoras, algo raríssimo para mim. Senti até vergonha. Carla Madeira me encanta demais e claro, Aline Bei, meu farol.
Como você definiria seu estilo de escrita?
Diria cru e objetivo.
Quais são os seus projetos atuais de escrita? O que vem por aí?
No momento, estou trabalhando em algo que pode se tornar outro livro (nunca sei se de fato será rs) sobre a relação entre mãe e filha. Também tenho escrito contos.
Adquira “Depois que a vida chegou” no site da Caravana: https://caravanagrupoeditorial.com.br/produto/depois-que-a-vida-chegou/
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