SINOPSE: Ao acordar, Sofia dá de cara com o ser humano mais alto que já vira. O que ela não sabia é que ninguém pode ver um gigante sem se tornar seu prisioneiro. Ela vai parar na Terra dos Gigantes, sob os cuidados do Bom Gigante Amigo, seu sequestrador. Lá, conhece gigantes assustadores e, com a ajuda do BGA e de outros personagens inventará um plano para enfrentá-los.
O País de Gales parece que tem algo mágico em suas terras, castelos, Rei Arthur, dragões, batalhas, fantasia, gigantes, o festival de Hay-on-Wye… Esse cenário colaborou para que tantos outros conquistassem seu valor na literatura ao criarem universos únicos só por passarem por lá, imaginem nascendo. O galês Roald Dahl conseguiu trazer obras fantásticas para deleitarmos, como James e o Pêssego Gigante (1961), Charlie e a Fábrica de Chocolates (1964), O Fantástico Sr. Raposo (1970) e Mathilda (1988), só para lembrar alguns que foram adaptados para o cinema. Narrativas que seguem o ritmo das fábulas de Esopo e dos Contos dos Irmãos Grimm, com aquele sentido de lição de moral para quem narra ou ler.
Recentemente, mais uma obra de Dahl ganhou versão para a telona, O Bom Gigante Amigo, com o selo Disney/Spielberg e pelo que já li é um encanto cinematográfico. Entretanto, tenho que falar a verdade, não conhecia a história do Bom Gigante Amigo. Após uma noite assistindo trailers de filmes que irão estrear neste ano, quando descobri que The BFG estava saindo por aqui, logo procurei conhecer a história e aí veio a Editora 34 que no centenário de seu nascimento lança uma edição especial, bem caprichada, com bastante ilustrações, que devorei em uma noite pela maneira simples e divertida que a narrativa passa aos nossos olhos.
Escrito na década de 1980, mas gerado a partir de uma passagem de Danny, o campeão do mundo, em 1975, quando o pai do protagonista conta a história de um gigante de grandes orelhas que se dedica a viajar com uma grande trompeta com a qual distribui sonhos às crianças.
A narrativa segue uma linha de pensamento, bem parecida com a que Charles Dickens escreveu, Dahl desperta recordações amargas e dolorosas, de um passado triste, uma época que orfãos eram encerados em cruéis pensionatos que eram parte natural do sistema educativo inglês de então. Os capítulos de apresentação de Sofia e do Gigante Amigo, vestido com um longo casaco como o Espírito do Natal Futuro, de “Um conto de Natal”, e o sequestro da garota, incluindo ali a incerteza de seu destino são aterrorrizantes. Senti isso, lendo a estória para minha filha, que ficou impressionada com a forma e as cenas descritas.
Dahl quis fazer um gigante diferente, saindo da imagem truculenta, criando até mesmo um modo de falar que se tornou clichê, cometendo erros contínuos sintáticos e gramaticais. O autor obriga assim a seus tradutores a se esforçar em seu trabalho, a versão da Editora 34, no caso de Angela Mariani, consegue empregar as palavras criadas pelo autor para os brutamontes companheiros de BGA de uma forma bem equivalente a versão inglesa.
E é bastante engraçado, pela maneira genial do autor em estabelecer aquela sensação de segredo entre o gigante e a garota, bem próximo dos segredos intímos que as crianças tem com seus amigos imaginários. Dahl sempre foi um homem de ação, e isso se reflete em sua narrativa. No entanto, BGA é exceção à regra. O narrador é aqui mais focado na construção de seu gigante, que protetor das crianças e da infância, aquele “amigo invisível” que creio todos nós já tivemos.
Seu parceiro habitual, Quentin Blake, um ilustrador de mão cheia, traz sua arte como um relógio suíço, eficaz e na marcação certa. Parece uma simbiose entre os dois, pela maneira tão perfeita que Dahl pensava seus livros com as ilustrações de Blake. Para dar um exemplo, há um desenho de dupla página, absolutamente fantástica, em que podemos notar esta implicação: uma cena que mostra crianças tendo sonhos que Blake os plasma brilhantemente. Há magia nos traços infantis, que conseguem de imediato atrair os leitores pequenos. O traço dos desenhos representam o mundo visto através da inocência, mas cheio de curiosidade de uma criança. A edição traz um cuidado nos desenhos do artista, porém o P&B não favorece muito o público que está dirigido o título.
Um livro especial, com a veia comum de Dahl, demonstrando a simplicidade da pobreza, a orfandade, a tendência do autor de explicar fenômenos naturais, como os sonhos, neste caso, de maneira maluca que faz da narrativa uma leitura bem gostosa para qualquer leitor, em especial os pequenos. Cheio de humor, inteligência e um charme sensorial incrível. Recomendo O Bom Gigante Amigo para quem deseja apreciar um livro divertido feito para todas as idades.
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