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Braza leva seu groove urbano com sotaque jamaicano ao Porão do Rock

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Depois de lançar no início do ano o EP “Liquidificador” e encher o Circo Voador no final de agosto, a banda carioca Braza será uma das atrações do Festival Porão do Rock (dias 29 e 30 de setembro). Nascida de uma parte do ForFun – grupo originalmente de hardcore, do início dos anos 2000 – a banda tem apenas dois anos de existência, e já conta dois álbuns, um EP e uma legião de fãs, que costuma gritar nos shows espontaneamente que o Braza “é a melhor banda do Brasil”.
Apesar da histórica filiação ao punk via Forfun, a jangada do Braza navega intensamente por águas jamaicanas. Forjada numa clara conexão entre o Rio e Kingston, a banda segue a linha antropofágica da Nação Zumbi e dos melhores momentos de Marcelo D2. Joga muitas referências no tal liquidificador, combinando diversas vertentes da música branca e negra das Américas, do dub ao rock, passando pelo rap e o reggae. De longe, o Braza emula a virtuosa hibridação feita por Chico Science, e aproxima a palhetada da guitarra distorcida às curvas do dancehall, do ragga e do kuduro. Como num instigante encontro entre Damian Marley, Yellowman e o rap-rock do Planet Hemp.
Dessa mistura surge um trabalho musical que estabelece comunicação íntima com o públic2o, que passa o show inteiro dançando, como num baile de Sound System. Assim, o Braza produz entretenimento de qualidade, e entrega uma performance inspirada com ares de noitada jovem. Mas vai além disso e equilibra seu otimismo festivo com uma identidade artística forjada na construção poética de panoramas sociais. A partir de uma linguagem marcadamente carioca e praiana, emerge uma lírica combativa, articulada especialmente pelas rimas de Vitor Isensee (sintetizadores), mas encampada também por toda a banda. Isensee alterna-se nos vocais com Danilo Cutrim (guitarra) e o termômetro rítmico da banda fica a cargo de Nicolas Christ (bateria). No baixo, Pedro Lobo imprime ao som do Braza a pressão sônica das texturas mais graves, enquanto libera backing vocals apurados. Numa atmosfera celebratória, entre flows de rap e refrãos de reggaeton, o Braza se politiza.
Desse engajamento, brota uma poesia que estimula a persistência na batalha cotidiana necessária para se levar a vida na cidade, exalta o movimento ativo de tudo que sempre se renova e enaltece a força da mente capaz de encontrar em si mesma, o além. Seus versos mobilizam signos da cultura rastafári para cantar os dilemas humanos perante uma existência efêmera. Testemunha da babilônia contemporânea, o Braza explicita a ganância parasitária do dinheiro que tudo quer mercantilizar. Neste contexto, a música é frequentemente tratada como arma de combate: arregimenta um “exército sem farda” cuja munição está na mente, elogia a andarilhagem anarco-poética de Eduardo Marinho, problematiza o racismo brasileiro e não cai na armadilha de fazer música rebelde repetindo a caricatura vazia da acusação da corrupção dos políticos.
Com uma exuberante identidade visual inspirada em cores quentes, a banda aposta numa estética ao mesmo tempo litorânea e urbana, mas que escapa do “clichê tropical”. Parte de Ipanema, passa por Madureira e desemboca no Mar do Caribe. Afirma sua latinidade, como na proximidade com o Francisco El Hombre ou no reggaeton “Free Som”. Valoriza sua brasilidade, com alusões aos Afrossambas, de Baden, a Joao Donato, Tom Jobim e Luiz Gonzaga. Partindo da interminável potência das músicas das três américas, o Braza é cuidadoso com sua palavra e faz o público cantar todas as suas canções em uníssono. Como numa festa entre amigos, em que a curtição é escutar dubwise e debater Bakunin.

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Por
Gabriel Gutierrez -

Pesquisador e jornalista interessado na música pop produzida nas Américas.

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