Há pouco mais de um mês, o U2 surpreendeu todo o mundo com a estratégia de divulgação mais bem-sucedida da Música recentemente. O novo disco fora lançado no ITunes gratuitamente e pipocou aleatoriamente nos celulares Apple do mundo todo. Para muitos (principalmente os fãs da banda) foi um presentão. Para outros uma baita intromissão, tanto que foi preciso criar um recurso para apagar o álbum “indesejável” dos aparelhos. Para uns, a estratégia de Bono & Cia foi brilhante, para outros, golpe baixo. O certo é que, para o bem ou para o mal, como se falou de ‘Songs Of Innocence’ (Interscope/Island, 2014), décimo terceiro trabalho de estúdio da banda irlandesa, que chega em formato físico às lojas brasileiras essa semana.
O U2 iniciou sua trajetória em 1977 sob o nome de “Feedback”, e dois anos depois, já usando o nome atual, lançou o EP U23. O primeiro LP viria em 1980, o excelente ‘Boy’, que tinha uma pegada pós-punk. Depois partiram para uma fase engajada nos discos ‘War’ e ‘The Unforgettabe Fire’, a descoberta da América com ‘The Joshua Tree’ e ‘Rattle and Hum’, até chegar no ápice criativo no início dos anos 90 em ‘Achtung Baby’ e ‘Zooropa’. O super criticado ‘Pop’, mesmo com sua irregularidade, foi o canto do cisne da fase criativa da banda, que a partir de ‘All That You Can’t Leave Behind’ parece ter ligado o piloto automático. A ideia era promover um retorno ao som que faziam nos anos 80, e, por acaso, essa volta ao passado rendeu boas vendas e prêmios, vide os Grammys papados por ‘How To Dismantle An Atomic Bomb’ em 2006.
O atual disco, sucessor de ‘No Line On The Horizon’, de 2009, continua seguindo a cartilha do time que está ganhando, não se mexe. Ao longo das 11 faixas do disco, o que se ouve é o mais do mesmo. A mesmice se dá até na capa, que traz o baterista Larry Mullen Jr. abraçando o filho. A única inovação talvez tenha sido a troca dos produtores. Saem Steve Lillywhite e Daniel Lanois, parceiros de fé da banda, entra Danger Mouse.
De modo geral, temos neste álbum uma banda acomodada sobre as glórias do passado e se valendo o tempo todo de referências para arrancar sorrisos dos lábios dos antigos fãs, sem perder as rédeas dos novos, muitos deles conquistados graças à sacolejante ‘Vertigo’. A primeira faixa traz uma sonoridade facilmente identificável como sendo do U2, apesar da roupagem “muderna”. A inconfundível guitarra de The Edge se faz onipresente com distorção e textura. Em seu título, ‘Miracle Drug (Of Joey Ramone)’, que está sendo bem executada nas rádios, traz uma homenagem ao vocalista dos Ramones morto em 2001. A letra que diz no refrão “I woke up at the moment when the miracle occurred/Heard a song that made some sense out of the world/Everything I ever lost now has been returned/In the most beautiful sound I’d ever heard” (Eu acordei no momento em que o milagre ocorreu/Ouvi uma canção que fez sentido neste mundo/Tudo o que eu havia perdido, agora retornou/No som mais lindo que já tinha ouvido) deixa claro que as composições do grupo já tiveram dias muito melhores.
Em ‘Every Breaking Wave’ sobressai o baixo de Adam Clayton (também facilmente identificável), mas o problema da faixa, e de outras ao longo do álbum como ‘Califórnia (There Is No End To Love)’, é que de tão genérica, acaba soando como bandas influenciadas pelo U2 como The Killers, o que se pode ver como o resultado da tentativa de unir o tradicional (de olho nos fãs de longa data) ao moderno (de olho nos mais jovens). ‘Song For Someone’ está longe de ser a melhor música da banda, mas é um dos melhores momentos deste álbum. ‘Iris (Hold Me Close)’e ‘Raised By Wolves’ são as que mais remontam os áureos tempos dos anos 80, sendo que a primeira remete ao que faziam em meados da década e a segunda, ao que faziam no início.
Enfim, enquanto artistas veteranos solo como Leonard Cohen e Bob Dylan nos surpreendem trazendo trabalhos ainda relevantes, com as bandas isso não costuma se repetir. Beirando os 40 anos de estrada, o U2 precisa se valer de metalinguagem para dar magnitude ao que traz a público. A produção caprichada e a competente execução das canções pelo quarteto compensam, em parte, a pouca inspiração. ‘Songs Of Innocence’ não chega a ser ruim, e também não a mancha a carreira do U2, mas certamente não deve ocupar muito espaço no set list dos shows da próxima turnê, sob o risco de entediar boa parte da plateia.
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