“Agenor, ou melhor, Cazuza é para mim como Elvis, como Michael. Não morreu!
Sua obra me é tão contemporânea, tão atemporal que a carne míngua em meio ao espírito exagerado do ser”.
… Ariano, assim como eu.
Cazuza é um dos maiores poetas que nossa música – a popular brasileira, aquela que canta algo, que critica alguém, permeada de entrelinhas – já teve. Suas letras conseguem tocar de forma cadenciadamente sincrônica nossos anseios mais íntimos, mais singelos e as mazelas de um país hipócrita, mergulhado em fachadas e afogado em máscaras.
São vários os ‘hinos’ que ‘aquele garoto’ deixou como herança para nós em seu legado. ‘Codinome Beija-Flor’, ‘Exagerado’, ‘O Tempo não pára’, ‘Faz parte do meu Show’ e por aí se vão várias vírgulas, e abrevio-as com reticências.
Eis que um dia zapenado pela enxurrada de canais da TV a cabo, paraliso no canal Arte 1 – impressionante como sempre tem algo bom passando nele – e no intervalo da programação dá-se início um vídeo promo do ‘Projeto Agenor – Canções de Cazuza’, projeto idealizado pelo DJ Zé Pedro e com curadoria da jornalista Lorena Calábria, que reúne artistas da nova geração da música brasileira em uma releitura do lado B de Agenor.
“Agenor, Agenor, Agenor… Mas, quem é Agenor?”
Ah, sim… Agenor é o pseudônimo. Aqueles fardos escrotos que os pais rogam nos próprios filhos depois de meses de ansiedade e expectativa. Adquirimos uma relação tão íntima, que confundimos o apelido com o nome verdadeiro.
Depoimentos dos cantores, informações do projeto… Fiquei curioso – como todo (ou quase) todos arianos o são – e fui saber mais sobra o tal Agenor na internet. Li algumas reportagens e notícias a respeito e apertei o play no download do álbum disponível gratuitamente no canal Soundcloud. (https://soundcloud.com/projetoagenor)
Das 17 canções que compõem o disco, especialmente três me chamaram atenção. Elas me fazem ebulir toda vez que eu ouço, e são presenças cativas no meu playlist.
‘Mais Feliz – Silva’
Quando começou a tocar, fui tomado por uma sessão de dejavú. Já tinha escutado aquela letra em outra voz, em outra melodia, em outra roupa. Tentei despi-la da minha memória, mas demorei a recordar que a ‘versão clássica’ tinha como interprete Adriana Calcanhoto, e que inclusive fora trilha sonora de uma novela.
Mas, volto à felicidade do Silva…
Nos 21 segundos de introdução instrumental da vontade de tirar a roupa. Vejo uma cena de sexo gostoso, selvagem, intenso e dá vontade de fazer.
Após a libido musical viajamos nas batidas e nos loopings sonoros.
‘Tapas na Cara – Felipe Cordeiro’
Vejo – e ouço – a estrofe inicial da música como uma livre e metaforizada referência à épica oração católica do Pai Nosso.
‘Ah! Me perdoa esses tapas na cara…” seriaa súplica de perdão à nossa ignorância, à nossa cegueira. Crucificadora cegueira!
Se tivesse escutado a música sem saber o compositor, poderia apostar que seria de algum cantor do Pará. As batidas de Tecnobrega, um molejo do carimbo, a música balança o interno e conduz o externo para a roda.
A interpretação de Felipe Cordeiro dá uma vontade de levantar, pegar a primeira pessoa que tiver na frente e sair por aí dançando, rodando, batendo cocha…
‘Amor, Amor – Tono’
Cazuza cantava o amor como ninguém. O amor era o pulso da sua poesia.
A voz aveludada, suave, meio rouca da Tono cai como uma luva nessa tradução ambígua, cruel, faminta feita pelo nosso eterno Agenor.
Agenor, reflexo do Amor.
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