Sempre que se fala de Frank Miller e Demolidor num mesmo assunto é fácil imaginar que a qualidade de suas histórias seja altíssima, acima de qualquer crítica possível – mas não é bem assim. Pela primeira vez neste especial de 45 anos do herói cego um artigo será escrito embasado totalmente numa opinião pessoal, no caso a deste que vos escreve. Adquiri recentemente a versão de luxo encadernada de O Homem sem Medo lançada neste ano pela Panini e li a obra toda há poucos dias. O pensamento final é: uma história ruim com bons momentos. Pareço injusto? Vamos entender.
[o índice dos artigos deste especial se encontra ao final do post]
Miller, em finais dos anos 1980, escreveu um ensaio para um roteiro de um filme do herói, que nunca virou realidade – e nem mesmo foi terminado por ele na época, sendo corrigido dois anos mais tarde, em 1990. Em 1993 John Romita Jr., que havia se tornado uma grande sensação por ter trabalhado com Ann Nocenti no título (como já comentamos aqui) queria fazer algo que explodisse a cabeça dos fãs, um verdadeiro blockbuster com o herói e ao lado do editor Ralph Macchio conseguiu contato com Miller, que retirou do fundo do baú seu roteiro não utilizado e começaram a trabalhar em cima de uma versão em quadrinhos dele. O filme foi transformado numa história em 5 capítulos e a Marvel aproveitou a imprensa especializada, convenções e o boca a boca dos fãs para espalhar que Frank Miller estava de volta e, ao lado de Romita Jr., faria uma história do Homem sem Medo sem igual.
E então, em outubro de 1993, era lançado o tomo um de The Man Without Fear, que seguiu por mais quatro capítulos e foi colecionada três vezes lá fora e lançada duas vezes no Brasil. Na história vê-se a origem de Matt, de seu pai, sua relação com Wilson Fisk, Foggy Nelson e Elektra, além do mentor Stick. De fato, os autores fizeram tudo num estilo “crime-noir” dos anos 1940, mas mais atualizado e com alguns dramas interessantes para a vida do protagonista. O que não funciona (e a partir daqui isto é totalmente pessoal) é o subversão mal feita das origens que o próprio Miller criou. Vou separar cada uma das subversões em tópicos para que vocês entendam melhor:
Elektra: a ninja assassina criada pelo próprio Miller era uma pessoa destinada a ser quem se tornou depois, mas isso só aconteceu pelo acaso: a morte de seu pai despertou o que estava guardado nela desde o começo de sua vida e de todo o seu treinamento, mas ela tentou levar a vida mais normal possível, cujo psicológico daquele momento em muito se assemelhava ao do próprio Matt, fazendo com que eles se entendessem tão bem desde o início da faculdade. Aqui, Elektra é uma patricinha ricaça e irresponsável, que pouco se lixa para as verdades do mundo – a ninja que vivia escondida sob a carcaça de uma pessoa que tenta se libertar das amarras da amargura de sua vida passada vira uma caricatura pobre de mulher-machona e, porque não dizer, vagabunda.
Stick: o mentor, que possuía muito do arquétipo do mestre sábio, foi transformado num porradeiro estilo Wolverine, só que mais velho e mais “cool”, quebrando todo o simbolismo do professor e discípulo que o próprio escritor havia criado em sua passagem pelo título mensal do Demolidor anos antes.
Putas e Morte: Miller parece ser alguém muito amargurado com mulheres em sua vida pessoal, pois tem uma necessidade imensa de inserir putas em todas as suas histórias desde Sin City, o que não diferente aqui. No caso, Matt procura cada um dos assassinos de seu pai, liderados pelo Arranjador, e espanca a todos, até que um é encontrado num prostíbulo e, ao ser atacado pelas mulheres, acaba derrubando uma delas do prédio por acidente. O motivo deste elemento na história é óbvio: criar uma tragédia passada para o herói não aceitar quem ele é, mas isso já existia com o assassinato de seu pai, o que acaba deixando este elemento totalmente gratuito.
O que vale na história, além das belíssimas páginas de Romita (cujo traço rabiscado remete muito à própria época e o ambiente em que a história se passa) é a jornada pessoal de Matt como advogado e herói, além do aspecto narrativo, quase todo se passado dentro da mente do próprio protagonista. Momentos como a aceitação de um herói, a criação de suas roupas e seu símbolo são o que realmente valem a pena de se ver em Homem sem Medo. Fora isso, é Miller dando os primeiros sinais de que estava perdendo a mão de escreveu quadrinhos, o que foi se tornar um problema muito mais agudo anos mais tarde.
Em nossos próximos artigos: A Queda do Rei do Crime, a revolução proposta por Joe Quesada e Jimmy Palmiotti e a chegada de Brian Michael Bendis.
[Parte 1: O Começo de Tudo]
[Parte 2: A Justiça é Cega, mas tem cores fortes!]
[Parte 3: Demolidor Amarelo]
[Parte 4: Chega Frank Miller]
[Parte 5: Sai Frank Miller, volta Frank Miller]
[Parte 6: Le Diable à la Vertigo]
Concordo com a resenha-opinião. “Man Without Fear” é uma boa história se a considerarmos isoladamente. Entretanto, totalmente dispensável em face do que foi feito com o universo do Demolidor, na primeira jornada de Miller.
E o ápice da decadência do escritor foi DK2…não se perdoa quem comete DK2.
Sabe qual é né, às vezes é melhor parar quando está por cima.
o ruim é que eu tbm comprei esse encadernado e foi mto caro,e a história não valeu o preço,mais por ser uma das poucas vezes que o romita jr e o miller trabalharam juntos é bom ter