LOST: O Paradoxo de Faraday-Widmore

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[Escrito por Flávio Watson]

Em seus seis anos de exibição, Lost revolucionou a televisão em diversos níveis, tanto nos aspectos narrativos que explorou, quanto nos novos paradigmas de audiência que se estabeleceram no culto à série, e até mesmo em novas fórmulas de produção. É inegável inclusive a influência da série além do mundo da TV, transformando áreas como o marketing e a comunicação ao solidificar (senão criar) técnicas de guerrilha como o marketing viral e o ARG.

Mas sem dúvida, o que mais surpreendeu o grande público foi a capacidade da série em se recriar a cada temporada. Pensando bem, a cada ano, Lost nos apresentou uma série nova: mistério, fantasia, ficção científica, conspiração, drama… E a cada abordagem da saga dos protagonistas perdidos, uma nova técnica narrativa era apresentada. Flashback, flashforward e agora o polêmico e divisor de opiniões flashsideway.

Acredito que a maior razão da rejeição de muitos em relação a essa nova forma de narrar a história é que pela primeira vez não ficou claro o que isso significa. Se antes os flashbacks eram uma forma de desenvolver os personagens e as relações entre eles e os flashforwards uma forma de criar expectativa e tensão pelo que estaria por vir, os flashsideways pareciam não ter nenhum conteúdo senão mostrar como seria a vida deles se uma determinada bomba de hidrogênio tivesse explodido em uma ilha desconhecida do pacífico 30 anos atrás.

Mas é claro que não poderia ser só isso. Uma série tão bem elaborada em quase todo o seu percurso não poderia se render em sua temporada definitiva a um recurso que não significasse nada a não ser mostrar uma outra realidade sem a menor relação com o eixo principal da história.

Como todo mundo, acabei involuntariamente cedendo boa parte do meu tempo pensando em como amarrar isso, e acho que encontrei a solução.

Claro que isso envolve bastante futurologia em imaginar o que está apenas em algumas poucas cabeças, e justamente por isso existe uma altíssima probabilidade de estar redondamente enganado e perdendo o meu tempo explicando e o de vocês lendo.

Mas vamos lá, a minha hipótese é a seguinte: em 1977 Juliet de fato explodiu a bomba de hidrogênio, matando a todos ao redor e inviabilizando a continuidade da Iniciativa Dharma. A partir deste ponto (e somente a partir dele mesmo, antes dele tudo permanece igual) a vida de todos é alterada por diversos motivos que não são importantes agora, mas que vão desde a ausência de Jacob quanto a meramente um Efeito Borboleta, onde certamente TODO o mundo foi afetado por esta alteração no rumo da história.

Neste quadro, a realidade dita “principal” (que daqui por diante chamarei de Primária, por achar que é um termo mais adequado) simplesmente não existe. Nunca existiu. A partir do momento em que a bomba explode, tudo o que vimos na série até então não apenas desapareceu como nunca aconteceu de fato. O plano de Faraday deu certo, a escotilha nunca foi construída, o avião nunca caiu e ponto final. Fim da história.

No entanto, sabemos que a história não acabou. Continuamos vendo os losties correndo pela ilha e para eles o plano simplesmente não deu certo.

As duas realidades são obviamente excludentes, uma não pode existir se a outra aconteceu. Elas só podem acontecer uma em vez da outra. E é aí que entra minha teoria: a Realidade Paralela será resetada por eles mesmos, possibilitando a continuidade da Realidade Primária.

Como assim? Então, explico. Já estava mais ou menos claro que os losties em sua vida fora da ilha tinham certa sensação de deslocamento ou intranquilidade. Em Happly Even After, fica evidente que eles têm de alguma forma (que duvido que seja explicada e nem acho que precise ser) lembranças de sua outra existência. Antes mesmo deste último episódio, já imaginava que Desmond, por suas características especiais de não se submeter ao tempo e espaço, seria o elemento catalisador que mostraria que o curso da história foi alterado e que os resultados disso não são tão bons quanto parecem. De posse desta certeza, de que a explosão que causaram foi mais maléfica que benéfica, eles mesmos serão responsáveis por evitar que aquela bomba seja detonada em 77, eliminando toda aquela realidade para que o curso da história volte ao que deveria ser; e que de fato estamos vendo desde o primeiro episódio da série.

Na minha teoria, o Desmond da Paralela (se é que esta definição se aplica a ele, pois talvez seja capaz de transitar entre as realidades sendo ele mesmo em ambas) conseguirá retornar ao passado e evitar que aquela bomba exploda e de quebra fazer com que todos que estavam presos nos anos 70 voltem para 2007. Como fará isso, não sei. Só imagino que essa será a explicação de por que vemos as duas realidades a cada episódio, quando na verdade a Realidade Primária só será possível quando a Realidade Paralela se extinguir pelas mãos deles mesmos.

Obviamente, a minha proposta é paradoxal e cai num círculo onde a existência da Realidade Primária só é possível com eliminação da Realidade Paralela e vice-versa. Por isso batizei a minha teoria de Paradoxo de Faraday-Widmore, em homenagem às duas faces do físico que em ambas realidades descobriu meios de reescrever a história.

Na minha teoria, os eventos ocorreriam nesta ordem:

  1. Em 1977, o Incidente ocorre normalmente, levando a construção da escotilha.
  2. Em 2004, enquanto os Oceanic 6 saem da ilha, saltos temporais levam os losties para 1974.
  3. Em 2007, o vôo 316 da Ajira cai na ilha, levando parte dos Oceanic 6 para 1977.
  4. Em 1977, Juliet detona a Jughead, alterando o curso do tempo dali em diante, apagando a Realidade Primária e criando uma nova realidade que chamamos de Paralela, no entanto, os losties retornam para 2007 da Realidade Primária.
  5. Em 2007 da Realidade Primária, Desmond entra em contato com seu “Eu Paralelo” de 2004
  6. Em 2004 da Realidade Paralela, Desdmond retorna a 1977 (ano comum às duas realidades), antes que Jughead seja explodida
  7. Impedindo a detonação da Jughead, Desmond apaga a Realidade Paralela e restabelece a Realidade Primária.
  8. Em 1977, o Incidente ocorre normalmente, levando a construção da escotilha.

Abaixo, fiz um gráfico onde tento demonstrar minha teoria visualmente. Clique para ampliá-lo.

Assim sendo, a Realidade Paralela é apenas um desvio de 27 anos da Realidade Primária. Uma espécie de parêntese temporal que existe enquanto a Realidade Primária é suspensa pelo desvio causado pela explosão da Jughead. O que a série nos mostra parecendo ser concomitante em ambas as realidades, na verdade só é possível após os losties da Realidade Paralela restabelecerem a Linha do Tempo Primária. Ou seja, de certa forma o Flashsideway é um tipo diferente de Flashforward!

É claro que a minha teoria não explica tudo. Ficam várias lacunas em aberto. Por exemplo, por que eles conseguem ter flashes da Realidade Primaria? Ou como a Realidade Paralela pode ser influenciada pelo futuro da Realidade Primária se esta só é possível se aquela for eliminada antes? E principalmente, como ao evitar explosão da Jughead os losties que estavam em 77 voltam para 2007? Mas, enfim, é apenas uma proposta e boa parte da diversão em assistir Lost é justamente quebrar a cabeça imaginando respostas, por mais que certamente elas nunca se aproximem do que apenas os Darlton sabem.

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7 thoughts on “LOST: O Paradoxo de Faraday-Widmore

  1. Nem mesmo as linhas temporais de DBZ são tão desnecessariamente complexas. E o número de razões para eu não gostar de Lost apenas aumentam.

  2. Viagem interessante, mas provável q não aconteça nada disso.
    Eles fazem questão de ler tudo na internet e alterar o curso do seriado para q ninguém acerte.

  3. Ótima viagem, mas basta assistir Donnie Darko para ver de onde podem ter tirado a inspiração

  4. DUVIDO que eles tentem apagar a realidade paralela! Ela está lá por alguma razão que ainda não foi revelada. E com certeza tem a ver com o Monstro e o Mal que habita a Ilha.

  5. Enquanto lia seu comentário pensei "nossa, o cara ficou um tempão pensando nisso", mas quando vi o gráfico, dai assustei, rolou um momento "Uma mente brilhante" no cara. hehe..rs Achei bem interessante, mas não acho que seja isso. Acho que de algum modo, as realidades vão coexistir, ou até se convergir, onde todos irão viver tranquilamente como se nunca tivessem ido pra ilha, e apenas o substituto do Jacob vai viver na ilha.

  6. Toda vez que eu leio comentarios de Lost eu penso em Stargate SG-1. Então, no episódio 3×16 de stargate, somos apresentados a uma diferente Samanta Carter, de uma realidade paralela, que atravessa para a realidade do seriado atrvés de um espelho. Neste episódio somos apresentados a uma teoria da fisica que diz que nós vivemos em apenas um dos muitos universos paralelos, nas palavras da capitã/doutora (no episódio): "que se desdobram como braços de um garfo" a cada escolha que fazemos. Assim, a explosão da bomba alterou o futuro dos losties mas não necessáriamente apagou o futuro original, o que explica Desmond poder transitar entre os acontecimentos com tanta facilidade, ele simplesmente tem conhecimento de como as coisas funcionam. Eu não assisto o seriado, mas ele não é tão viajão assim depois de assitir Stargate, porque nesta fixão cientifica nós somos levados a teorias viajonas que fazem Lost parecer brincadeira de criança.