Hoje acaba de ser lançado mais um RPG independente interessante, chamado Covenant: A story game of failing conspiracies (algo como Compacto: Um jogo de histórias sobre conspirações fracassadas). O jogo me pareceu, pelos previews e pelos demos que pude analisar, bastante peculiar. Eis a sua premissa:
Por cinco mil anos, uma sociedade secreta conhecida como o Compacto tem se preparado para o apocalipse, se infiltrando dentro de cada governo, burocracia e religião. Em preparação para um dia que saberiam que viria, o Armageddon. No dia primeiro de janeiro de 2000, eles aguardaram o sinal que anunciaria o fim do mundo. Ele não veio. Logo a sociedade que havia manipulado governos, construído ideologias e sobrepujado religiões estava em completa turbulência. Dividida em um tornado de opiniões acaloradas e grupos conflituosos. Por que as profecias haviam falhado? Quando antes elas haviam sido bem sucedidas? Quem poderemos culpar? O que o futuro realmente aguarda?
Covenant, é sobre tudo isso e muito mais. Um apocalipse que nunca aconteceu. Uma antiga sociedade em tumulto. Todas as suas crenças foram postas em dúvida, e você deve decidir se vai permanecer com uma seita fragmentada ou deixa-la cair no caos.
Este é o cenário de pano de fundo. Assume-se que os jogadores estejam no papel desses fanáticos que agora recobraram a razão (ou pelo menos tem motivos para questionar o fanatismo). Até aí, isso seria um jogo normal, mas as mecânicas do mesmo surpreendem bastante.
Covenant é sobre criar histórias onde os personagens decidem o que eles realmente acreditam. Todos os jogadores possuem três truísmos, crenças que ele detêm, que agora se encontram em cheque. Jogar este jogo é descobrir onde seus personagens estão nas questões apresentadas por estas crenças. Por exemplo, se seu personagem um dia acredito que “os fins justificam os meios”, isso continua sendo verdade quando a sociedade sobre o qual ele passou sua vida inteira construindo um dia desmorona? Covenant usa um sistema de resolução com narrativa integrada. Um jeito de dizer que conflitos entre os personagens são resolvidos com os jogadores usando turnos para descrever os resultados positivos, ou negativos, estes tendo impacto direto sobre o desenrolar da situação. Além disso a mecânica envolve o uso de atributos ligados a facções, relações pessoais, motivos pessoais que podem ser recorridos para mudar resultados de jogadas.
É bastante esquisito vendo dessa forma, no entanto, pela demonstração de jogo que eles oferecem, a coisa ganha um pouco mais de coerência. Tentarei criar um exemplo meu:
Os jogadores, junto com o narrador propõem um cenário. Um irmão e uma irmã que pertencem a duas facções secretas diferentes, e as atitudes recentes desse irmão tem mostrado que de fato ele tem escondido coisas dela. Depois de segui-lo até um encontro com a sua “ordem”, a irmã, desapontada,vai para casa e o espera chegar.
Dado esse contexto, o narrador (que este jogo chama de diretor), aprovará a cena se ela apresentar as três regras básicas de uma cena de Covenant: um potencial de conflito dramático, um laço emocional forte entre os personagens, e a necessidade de se fazer aquela resolução na hora. Uma vez aprovada, os jogadores declaram suas pretensões e objetivos naquele encontro. Ela quer que seu irmão confesse o que ele tem feito pelas costas dela, ele quer sem revelar nada, garantir que sua irmã continue segura, sem saber toda a verdade. E logo se inicia o primeiro turno, e a irmã interpreta sua fala de desapontamento, eles rolam uma disputa de dados para ver se ela foi convincente em fazer ele se sentir culpado. Ela ganhou, agora ele tem que responder que está se sentido culpado, mas não quer entregar seus segredos a irmã, portanto pede desculpas e desconversa. Se ele perde nos dados, pode usar a motivação do seu personagem (um dos seus objetivos particulares importantes, ou algum ideal) para re-rolar os dados. Essa característica se esgota por essa cena, e o jogador do irmão, dessa vez com mais paixão e certeza em sua fala e bons dados, faz com que a irmã agora tenha que lidar com a vitória dele por esse turno. Toda rolagem no jogo é seguida de interpretação, assim como toda resposta, cada um em seu turno de acordo com os dados.
Minha visão sobre esse jogo é: primeiramente ele pode render algumas situações muito interessantes e divertidas, mas não é feito para cenários com longo prazo. Suas regras são simples, e as fichas dos personagens consistem apenas de descrições de caráter e ideologias, sem nenhum número em momento algum. O livro oferece algumas histórias prontas, mostrando que até dá, em uma sucessão muito bem amarrada de cenários, para rolar uma mesa um pouco maior de Covenant. Mas é uma tarefa árdua, até pelo desgaste emocional que algumas cenas devem fazer. Minha segunda opinião é que esse jogo tinha que ser apresentado para rodas de atores, me parece fantástico para treinar improvisações, é pessoal e dramático, e os dados colocam a questão em termos de surpresas. Sinceramente, fiquei bastante ansioso para testar o jogo.
O cenário de pós-apocaliptico falhido até tem haver com a idéia do jogo, mas vejo que seu sistema de resoluções em debates interpretados, tem muitas possibilidades além desse tema. A própria produtora do jogo, a britânica Realms Publishing, está escrevendo agora um novo livro chamado Lost Gods, onde eles usarão essas mecânicas em um jogo onde os personagens são deuses antigos e esquecidos vivendo vidas humanas (totalmente american gods), só que ao invés de facções e agendas secretas para mudar resultados, os deuses teriam também milagres e favores uns com os outros. É esperar para ver como irá ficar.
Muuuuuito parecido com Primetime Adventures. De repente esse tem pontos fortes que o primetime não tem e vice-versa.
Ou seja, mais um material legal para ser lido, assimilado e utilizado em qualquer RPG.
Boa matéria btw.
Marcos, vamos marcar uma mesa qualquer dia desses…
Também quero!
Qualquer leitor do Rio é só mandar um email que agente se arranja.