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"Ela" e o exercício de dolorosa identificação temporal

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Schopenhauer já disse que “a solidão é a sorte de todos os espíritos excepcionais“. Daí vem Spike Jonze e transforma essa excepcionalidade num tratado tão verossímil sobre a necessidade do amor para um indivíduo, que seu sublime filme “Ela” tem a capacidade de fazer da melancolia uma identificação arrasadora. Funcionário da empresa BelasCartasManuscritas.com, Theodore (Joaquin Phoenix) é um sujeito distante do convívio social após o fim do casamento com Catherine (Rooney Mara). Sem amigos, passa a noite sozinho tentando passar de fase no videogame. Eis que o mais novo lançamento do mercado tecnológico surge e ele, claro, corre para comprar. Trata-se de um sistema operacional intuitivo (Scarlett Johansson) capaz de dialogar com a pessoa. Com o passar da convivência, o protagonista começa a se envolver amorosamente com a própria máquina.

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Uma espécie de ficção científica intimista e muito pessoal, o filme nos trafega por sua placidez narrativa para enaltecer a crescente e complexa relação de Theodore com aquela voz que mesmo dentro de sua natureza tecnológica, acaba por agregar vida ao seu cotidiano ordinário. Um detalhe interessante do roteiro é a forma como a relação vai se construindo, com o encantamento do protagonista sendo justificado pela atenção que aquela voz dá à rotina que ele leva. Tal identificação é ainda mais eloquente, uma vez que Spike apresenta um futuro lindamente crível (design de produção impecável) que consegue tanto estetizar quanto contemporizar a história, auxiliado pela trilha atemporal e melodiosa. Nesse universo transitam pessoas de cabeças baixas, envoltas em seus smartphones – algo muito atual, não? – que incidem exatamente para a grande dramática do longa: no excesso de inter-relação internética estamos cada vez mais a sós em nossa intimidade. Joaquin Phoenix mereceu todas as láureas pelo papel, ainda mais por (enfim) fugir dos maneirismos que vinham marcando sua atuação nos últimos filmes. Scarlett tem noção da sensualidade que traz em si e faz uso disso de forma um tanto dramática sendo a voz da história. Mas se “Ela” tem um dono, ele é Spike Jonze (que escreve e dirige), ao imprimir um tratado sobre as contradições dos tempos modernos que afetam diretamente aonde nos é mais caro: as fragilidades emocionais e o quanto isso personaliza um tempo. Assisti com um amigo que dizia o tempo todo se identificar muito com o que via na tela. Ou seja, mais um espírito excepcional se vendo refletido pela concepção Schopenhauniana. Exposta pelo Facebook, retratada pelo Instagram, informada pelo Twitter, mas esvaziada pela própria solidão. Belíssimo filme.

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