Há algum homem ou mulher que possa definir a alma? E ainda se pedirem mais, a alma Russa. Como um pedaço de argamassa que não deveria servir de cal para tapar um orifício onde se põe os olhos que veem o que está impedido de se ver. Mas o cal se esfarela e deixa o pó sem nenhuma serventia a não ser o de perceber a corrupção do corpo que não virará pó na Rússia.
O último filme do diretor russo Andrey Zvyagintsev, Leviatã, prêmio de melhor roteiro em Cannes no ano passado, e forte candidato a melhor filme estrangeiro no Oscar de 2015, o mesmo, do brilhante Retorno, carrega nas tintas do retrato de uma Rússia com seus desvãos entre seus alicerces sociais (ou seus estratos) para pintar com cores nada pastéis um périplo pelo qual um mecânico (Alexey Serbryakov) com sua mulher (Elena Lyadova) e o filho tem que passar quando o prefeito da cidade quer desapropriar a casa e o terreno onde mora. Um amigo advogado de longa data vai tomar conta do processo. Nas entrelinhas da lei, o diretor coloca a sua entrelinha e um poderoso sub -texto para repensar o modo de ver a política russa, muita mais a prática que o homem russo exerce quando dentro do seu meio social. As instâncias da lei se tornam inoperantes para um indivíduo que se vê alijado de seu próprio patrimônio que ele levantou. Funções de pessoas dentro desta mesma lei se tornam interdições à uma propositiva argumentação lógica de quem está sendo desabitado.
Mas o diretor não mantém sua trama presa a um molde de crítica social apenas, entra lá pelo meio do filme um ponto de virada exemplar que dará ao filme uma paixão de afecções entre o casal e o advogado levando à trama a uma confrontação entre as escolhas individuais quando motivadas por afetos controversos e a falta de norte individual nas crises afetivas do protagonista e seu filho. A relação do garoto não é boa com a madrasta, neste ponto, o cineasta faz uma curiosa coo-relação da afetividade paterna para com os filhos e como se darão elas no tecido social russo; o pai é uma camarada para o filho, e como esta relação de (não)completude pode se espelhar numa Rússia sem autoridade moral para refrear as (impulsões) à corrupção.
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