Com curadoria de Yudi Rafael e consultoria de Roberto Okinaka, a mostra “O curso do sol” dá continuidade a um novo capítulo de uma série de exposições produzidas pela Gomide&Co dedicadas à discussão de temas relacionados à América Latina em paralelo a um dos maiores eventos artísticos globais.
“O curso do sol vem ao mundo em um momento histórico no qual os movimentos diaspóricos se tornam centrais para a compreensão do nosso turbulento presente. Ao mesmo tempo em que vemos as fronteiras borradas por fluxos financeiros que desconhecem limites, os nacionalismos de cunho xenófobo se espraiam ao redor do globo, resultando em uma atualidade marcada pelo desejo regressivo de separação. Uma miríade de paisagens feitas de muros, grades, fronteiras vigiadas, engendram um corte obtuso que diz: aqui, nós, lá, os outros (…) É nesse contexto que a Gomide&Co devota especial atenção para o que as dinâmicas diaspóricas nos endereçam.” ressalta Luisa Duarte, diretora artística da galeria.
Para o título da mostra, O curso do sol, Yudi Rafael tomou emprestado o primeiro verso de um poema de Matsuo Bashō, poeta peregrino que viajava ao “sentir-se possuído pelos espíritos, sensível ao aceno dos deuses protetores das estradas”. Segundo o curador, a exposição propõe um olhar sobre a arte na diáspora japonesa por meio do trânsito como tema, contexto e estratégia de construção de trajetórias artísticas.
A exposição, com mais de 40 artistas, busca apresentar narrativas da arte na diáspora japonesa da América Latina a partir das viagens de artistas nipo-brasileiros pela região e dos diálogos culturais que marcam o abstracionismo informal, lírico e caligráfico do período do pós-guerra, expandindo-se, ainda, para outras trajetórias ligadas a vertentes artísticas modernas e contemporâneas. Para isso, a mostra se debruça sobre a produção pictórica e escultórica, com um destaque para a cerâmica, de artistas nipo-diaspóricos do Brasil, Argentina, México e Japão, além de latino-americanos cujas obras entrelaçam-se com a cultura visual japonesa a partir de referências culturais e políticas locais.
Segundo Yudi Rafael, a produção do abstracionismo informal “incorporou à arte das Américas novas referências da cultura visual do leste da Ásia, imprimindo na arte moderna brasileira um “sotaque” próprio aos imigrantes japoneses aqui radicados”. “Se Manabu Mabe, Tomie Ohtake, Flávio Shiró e Tikashi Fukushima tornaram-se aqui sua maior referência, um artista como Kazuya Sakai, na Argentina, contribuiu a seu modo para esses diálogos transnacionais”, completa.
Para Luisa Duarte, se é a existência de cada um que será modificada pelo corte diaspórico, toda possibilidade de restauro dos elos se dará coletivamente. Conforme a diretora da galeria ressalta, a história dos artistas nipo-diaspóricos por aqui foi marcada por um exemplo dessa força solidária. Esse é o caso do Seibi-Kai, conhecido como Grupo Seibi, um eixo fundamental de O curso do sol. Trata-se de uma associação artística fundada por Tomoo Handa em São Paulo, em 1935, pelo qual passaram nomes como Manabu Mabe, Tomie Ohtake e Massao Okinaka.
Assim, “O curso do sol apresenta uma narrativa nipo-diaspórica estruturada a partir de dois eixos irradiadores: um eixo vertical, estabelecido em torno de artistas que integraram as atividades associativas do Seibi-Kai e construíram um espaço de trocas e fomento da arte no meio brasileiro; e um eixo horizontal, pelo qual se esboça uma constelação diaspórica e transnacional da arte abstrata no pós-guerra. A noção de trânsito abarca aqui não só a circulação de pessoas, mas também de imagens e ideias que alimentaram a arte na região – e a exposição discute situações marcadas pela sua restrição”, conclui Rafael.
Com expografia de Anna Ferrari, a exposição reúne obras, entre as quais, dos artistas: Adriana Varejão, Akinori Nakatani, Alina Okinaka, Flávio Shiró, Ioitiro Akaba, Kazuya Sakai, Léonard Tsuguharu Foujita, León Ferrari, Luis Nishizawa, Manabu Mabe, Masayo Seta, Massao Okinaka, Megumi Yuasa, Sachiko Koshikoku, Shoko Suzuki, Soko Ishikawa, Tikashi Fukushima, Tomie Ohtake, Tomoo Handa, Ubirajara Ferreira Braga, Waichi Tsutaka, Yoshiya Takaoka, Yuji Tamaki e Yuli Yamagata.
Catálogo trilíngue
Na ocasião da exposição O curso do sol, será publicado um catálogo assinado pela designer Elaine Ramos em conjunto com a Gomide&Co. A publicação será trilíngue, com textos originais em português traduzidos para o inglês e para o japonês, ilustrado com reprodução das obras da exposição, contendo um texto curatorial de Yudi Rafael, uma entrevista de Yudi Rafael com Roberto Okinaka e uma apresentação de Luisa Duarte, somando cerca de 150 páginas. A publicação estará a venda na galeria.
Serviço
Exposição: O Curso do Sol
Abertura: 19.08.2023 – das 11h–19h
Visitação: Até 11.11.2023 / Seg–Sex: 10h–19h; Sáb: 11h–17h
Gomide&Co – Avenida Paulista, 2644
01310-300 – São Paulo, SP – Brasil
Sobre Yudi Rafael
Yudi Rafael é pesquisador e curador, mestre em culturas latino-americanas e ibéricas pela Columbia University. Foi curador adjunto de A parábola do Progresso (Sesc Pompéia, 2022), co-curador de Imagens entrelaçadas: Ásia-Brasil pelas lentes do fotoclubismo (Almeida & Dale, SP-Arte: Rotas Brasileiras, 2022), do projeto Residência Artística Cambridge (Ocupação Hotel Cambridge, 2016) e co-tradutor para o português de O cogumelo no fim do mundo (n-1, 2022), de Anna Tsing.
Sobre Luisa Duarte
Luisa Duarte, diretora artística da Gomide&Co, é mestre em filosofia pela PUC-SP (2011) e doutora pelo Instituto de Arte da UERJ (2019). Atuou como crítica de arte do jornal O Globo (2009-2017) e membro do Conselho Consultivo do MAM-SP (2009-2013). Entre seus trabalhos como curadora, fez parte da equipe curatorial do programa Rumos Artes Visuais no Itaú Cultural (2005/2006); assinou a mostra coletiva um outro lugar no MAM-SP (2011); e as mostras Adriana Varejão – por uma retórica canibal no Museu de Arte Moderna da Bahia (2019) e José Resende – Na membrana do mundo na Fundação Iberê Camargo (2021). Junto com Evandro Salles, Luisa foi curadora da exposição Tunga – o rigor da distração no Museu de Arte do Rio de Janeiro (2018). Fez parte da equipe curatorial da 21 a Bienal Sesc Vídeo Brasil – Comunidades Imaginadas, sendo responsável também pela curadoria dos Programas Públicos desta edição no Sesc 24 de Maio. Organizou os livros ABC – Arte Brasileira Contemporânea pela Cosac & Naify (2014), em colaboração com Adriano Pedrosa e No tremor do mundo – ensaios e entrevistas à luz da pandemia pela Editora Cobogó (2020), em colaboração com e Victor Gorgulho.
Sobre Roberto Okinaka
Roberto Okinaka (São Paulo, 1956) é artista, curador, pesquisador das culturas nipo-brasileira e japonesa e museógrafo. Foi diretor cultural da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa, curador do Museu de Arte Nipo-Brasileira e presidente da Comissão de Artes Plásticas do Salão Bunkyo. Foi museógrafo do Museu Afro-Brasil (2004-2023) e trabalha como consultor e agente da formação dos acervos de artistas nipo-brasileiros em museus como a Pinacoteca do Estado de São Paulo, o Museu de Arte Contemporânea da USP, o Museu de Arte do Rio, o Museu de Belas Artes do Rio de Janeiro e o Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil.
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