“Alarido” faz dos diversos estilos da escrita um traço da verve de uma grande cidade

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O que me interessa na literatura é uma fuga das classificações. É o desmancha prazer dos rótulos pré-combinatórios. Algo como uma terceira via que fica próximo da ficção e do poema, mas chama o jornalismo de meu irmão. Cruzar estas três linhas de fabulação traz ao jogo literário muito do prazer que os franceses chamavam literatura potencial. Criar sinapses de conexões e reconhecimento com outras linguagens da arte ou até fora dela, como a matemática foi para Perec e Italo Calvino.

No livro “Alarido” de Bruno Molinero, da Editora Patuá, temos poemas em verso livre, construídos numa prensa que diagrama uma espécie de dia a dia jornalístico. Fatos e notícias de um cotidiano de uma cidade (São Paulo) com todo repertório de acontecimentos que revelam a face de uma cidade. Mas aí vem o trabalho da carpintaria poética do autor, em fazer que a notícia em si não ganhe relevância maior que a criação poética.

Bruno cria nos poemas um coloquialismo que não dificulta o labor do fazer poesia. Muito pelo contrário, sua verve humorista está muito mais para uma poesia brincalhona, tipo Leminski, do que uma sátira ou uma charge política urbana. Há uma diferença quando você pega uma ação que gera um acontecimento-fato e transpõe para algo além do narrado.

Mas em “Alarido” ele cruza uma série de fronteiras entre dicotomias maniqueísmos entre a paz e guerra, entre o silêncio e o falatório.  Talvez me venha na mente a palavra balbúrdia. E nesta de poética, mexer com as palavras, o inesperado surge sempre híbrido. Dia-gritaria. Não é a assim que uma cidade se organiza no seu rito de passagem? De um dia a outro.

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