Vamos dizer que João Emanuel Carneiro e Gilberto Braga, para citar autores de novelas brasileiras que em seus bons momentos, escreveram roteiros que não deviam nada às melhores séries norte-americanas (o que são Vale Tudo, A Favorita e Avenida Brasil?), para além da diferença de gênero, devem ter se perguntado por que não escreveram o emaranhado de tramas que adensam a história de Little Fire Everywhere antes?
A minissérie, uma produção original do canal Hulu (que teima em não chegar ao Brasil), é baseada no livro homônimo de Celeste Hg e versa sobre o destino de duas mulheres, Elena (Reese Witherspoon) e Mia (Kerry Washington), ambas em atuações dignas de videozinho de indicados à prêmios, que se cruzam quando a segunda acaba se aproximando da família aparentemente perfeita da primeira.
Já havia no livro, muito pelas intensas viradas e apelo emocional, um certo viés folhetinesco muito bem manobrado por uma autora habilidosa como Celeste. Na TV isso ganhou uma dimensão mais urgente pelo fato de Mia ser negra e isso agregar uma intensidade maior a tensão social que sustenta sua dramaturgia.
A direção em geral elabora um desconforto perene e constante pelas ramificações que a história vai tomando, quase que num novelão daqueles que são populares e consistentes dentro da lógica folhetinesca de contar uma história.
Um êxito que a minissérie tem para além do livro, é a maneira como fala sobre privilégio branco sem soar panfletário, apenas contando sua história, desconstruindo de leve o “american way of life” e dogmas familiares (de Desperate Housewives a Beleza Americana, sabemos que histórias que se propõem a essa perspectiva, dificilmente dão errado, né?).
É um raríssimo caso de adaptação melhor que o livro, que já é ótimo. Little Fire Everywhere usa com competência suas artimanhas para contar uma história envolvente, algo que hoje, seja nas novelas ou nas séries, tem se tornado raro justamente pela falta de desprendimento, o que a showrunner Liz Tigelaar, parece não ter.
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