Qual o passo do animal dentro do seu habitat-poema?
Será o poema em branco tão branco como a neve? Se temos a avidez da neve que contém todo o entorno cabendo a imaginação, ali, uma espécie de catálogo das coisas a se depositarem na alvura. Dizem que o homem ao citadinar o inóspito, inventou a ironia, como forma de conectar, coisas, imagens que a priori não estão perto uma da outra, mas que por uma fraterna sintonia se ligam pelo som de pássaros que vão
voo da imaginação.
Um poema tem zonas que podem ser temperadas com apenas brisas que pontuam certas folhas, tremeluzindo-as, ou como zonas turbulentas que desfiguram cenários, regiões até podem botar o pé da página na margem oposta. Digo que vi um coelho que não preciso dizer a cor, saltitando com uma dança de movimentos da linguagem/sentido ao ler a poeta Kátia Borges em seu livro O Exercício da Distração, Editora Penalux. Vi certas orelhas ponti(agudas) a certos desvãos bem brancos onde uma suave ironia cria uma linha ou trilha de escape para tudo que aprisiona, o flerte vital da poesis.
Há suaves repetições de frases melódicas que tecem uma espécie de canção hospitaleira de aspecto não distanciado do narrador com sua viola/escrita – este instrumento que a poeta tira os solfejos e sacolejos de temas ora tão próximos ora exteriores à uma morada com paredes?
Tratar o corpo como esta morada que ao mesmo tempo exterioriza o fora como lugar do nome e do afeto, talvez pela forma carinhosa da sua escrita, a poeta venha poetizar como um certo Walser fazia com a valsa, o trote, a caminhada do movimento que sempre na literatura, deve ser isento de preocupação, daí sua distração. Mas mesmo na neve, há sutis camadas de pertencimento. Neste exercício de distração, não há com se perder na cromacidade ou ausência de cor. Pois dizem que no branco, cabe-se tudo?
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