Editar é memoriar. A arte de escolher, que é irmã do desejo, está muito ligada ao tempo-duração ou às paredes do corte que damos às ações que transcorrem nas cenas da vida de cada um. Editar é desejar botar em moldura um pedaço da ação-afeto que ao longo dos anos botamos na parede da existência. O que ficou de fora, não é descarte. É material que usamos no play da interação-cinética com amigos, afetos e amores.
No livro Trailer, da poeta Katia Maciel, editado pela 7 letras, a artista não só na composição dos poemas, mas na tipografia da página, na sua forma textual, cria uma iconografia de poemas que quando lidos na sucessão do passar/virar as páginas dão a ideia de um efeito puzzle na leitura do livro. Pela falta de letras em tamanho de forma e pela distribuição espacial do poema em cada página, ficando um em cima da página o outro na página em seguida na parte inferior.
Mas nada disso seria tão interessante se a poeta não só inserisse tal efeito na forma mas também na semântica dos poemas. Na sua costura de cada poema, Katia, alinha entre ficção poética (imaginação fabular) e fatos biográficos dela não o localizando espacialmente, mas deixando-os soltos, sem referências. Muito sabiamente ela os mistura com citações afetivas de cenas ou preferências de diretores do cinema fazendo uma ciranda-cinética adorável.
A forma extremamente leve e poética com que a poeta cerze as linhas tanto da costura Bio como da teia fabular dá ao trabalho dela neste livro, um caráter de sonho, de ilusão. Mas é tal a capacidade de misturar o real com o sonho e a fantasia que me vejo vendo a mesa do corte do montador, ele olhando fotogramas, e desaparecendo para ele a realidade de que alguém disse este material é experiência diante da mimese ou da lembrança que já não é fato, puramente, passa pelo cunho da fábula.
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