Desde que decidiu realizar live actions de alguns de seus antigos e recentes clássicos, a Disney obteve alguns bons resultados como “Mogli – O Menino Lobo” (e, mais recentemente, com o “Dumbo” de Tim Burton) e outros que dividiram opiniões como “Malévola” e até mesmo “A Bela e a Fera”. Mas todos têm em comum o fato de que foram muito bem de bilheteria e a casa do Mickey Mouse não iria deixar isso passar em brancas nuvens. Tanto que, além de “Dumbo”, o estúdio lança ainda em 2019, uma versão “realista” de “O Rei Leão” e, antes desse candidato a arrasa-quarteirão, outra releitura de um dos seus desenhos de longa metragem mais populares dos anos 90, “Aladdin” (idem, 2019). O filme traz muitos dos elementos que fizeram da animação um sucesso, com muita ação, humor e, principalmente, suas canções memoráveis. Mas ainda assim, parece que alguma coisa se perde na transição e deixa a experiência incompleta, mesmo que bastante agradável.
A trama é, basicamente, a mesma da animação: Na cidade de Agrabah, vive o jovem Aladdin (Mena Massoud), um morador de rua que usa sua esperteza e de pequenos furtos para sobreviver, sempre acompanhado de seu fiel companheiro, o macaco Abu. Um dia, ele acaba conhecendo a princesa Jasmine (Naomi Scott) e se encanta por ela. Mas o romance não dura muito porque ele acaba preso pelos guardas do Sultão (Navid Negahban). O grão-vizir Jafar (Marwan Kenzari) faz uma proposta para libertar Aladdin se ele fizer um pequeno favor: entrar na misteriosa Caverna das Maravilhas e pegar uma lâmpada. As coisas não saem exatamente como o planejado, mas Aladdin acaba descobrindo que dentro da lâmpada vive um Gênio (Will Smith), que pode lhe conceder três desejos. Assim, o rapaz decide usar seu novo amigo para conquistar de vez o coração de Jasmine. Mas ele também terá que enfrentar a ira de Jafar.
O mais curioso de “Aladdin” está no crédito de direção do filme: Guy Ritchie. O cineasta, mais conhecido por seus filmes sobre personagens que vivem no submundo britânico, como “Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes” e “Snatch – Porcos e Diamantes”, se tornou mais conhecido após as duas releituras de Sherlock Holmes estreladas por Robert Downey Jr e jamais se imaginaria que ele topasse comandar um grande ambicioso projeto como esse para a Disney. Mas, felizmente, o diretor se sai bem na maior parte do tempo, embora não se vislumbre aqui a sua assinatura visual em boa parte do filme, apenas um flashback seguido de flash forward aqui, uma câmera lenta ali, mas bem pouco para quem aprecia seu estilo de dirigir. “Aladdin” é, definitivamente, o filme menos “Guy Ritchie” do Guy Ritchie. Mas isso está longe de ser uma coisa ruim.
Tecnicamente “Aladdin” é mesmo um desbunde visual. O diretor (que também assina o roteiro ao lado de John August, de “Peixe Grande”) acerta em deixar o filme com um clima de produção de Bollywood, com bastante cor nos figurinos (que remetem aos vistos no desenho de 1992) e nas coreografias que agradam aos olhos. Ritchie também surpreende na boa condução dos números musicais, principalmente os apresentados pelo Gênio, como ‘Friend Like Me’ e, especialmente, ‘Prince Ali’, que obtém a grandiosidade necessária para que os fãs, novos e antigos, não tenham do que reclamar e até mesmo bater palmas no meio da sessão sem se sentirem envergonhados. A fotografia de Alan Stewart reforça o tom alegre da produção.
No entanto, o momento em que entra uma das novas canções criadas especialmente para o live action, ,‘Speechless’, é feito de maneira equivocada e acaba tirando a importância da cena em questão, ainda mais com escolha um pouco duvidosa da encenação do diretor, que também derrapa um pouco nas cenas de embate de Aladdin com seus rivais, que parecem artificiais demais. Pelo menos, os malabarismos que o protagonista faz, ao estilo parkour, conseguem empolgar. Os efeitos especiais apresentam irregularidades, pois são perfeitos para recriar animais como o macaco Abu e o tigre de estimação da princesa, Rajah, por exemplo. Mas não se saem muito bem para dar “personalidade” ao tapete mágico e as suas cenas de voo são bastante artificiais, onde é possível ver, se prestar bastante atenção, que tudo é realizado dentro de um estúdio.
Já o roteiro “joga para a plateia” recriando os momentos mais lembrados pelos fãs com competência, mesmo sem grande brilhantismo. Mas o texto ganha pontos ao estender a trama e as motivações dos personagens. Assim, temos a princesa Jasmine ainda mais empoderada do que no desenho, mirando no público feminino. Até mesmo o Gênio ganha mais função do que ser o alívio cômico e a “escada” para o protagonista, com uma questão que só lhe diz respeito e que ajuda a torná-lo mais humanizado. Só o vilão que continua com suas propostas tão superficiais quanto na animação. Mas não chega a incomodar tanto quanto poderia.
No elenco cheio de rostos pouco conhecidos do grande público, o destaque vai mesmo para o Gênio de Will Smith. O ator, espertamente, nunca tenta mimetizar o trabalho brilhante realizado pelo saudoso Robin Williams (que dublou o personagem de uma maneira tão enérgica que os animadores tiveram que se adaptar ao humor dele). Mas faz de tudo (e consegue) dar uma identidade própria para a sua criação. Assim, não tem como não se divertir com suas piadas e seu jeito descontraído. Além disso, Smith se sai bem em boa parte das reinterpretações das canções mais famosas (apenas ‘Arabian Nights’ não ficou a contento, mas dá para curtir mesmo assim), que tem uma adição de trechos de rap e hip hop que são bem inseridos e dão um sabor especial.
Mena Massoud se mostra esforçado em fazer um bom Aladdin, embora não tenha tanto carisma quanto o personagem exigia. Pelo menos, o ator mostra um bom entrosamento com Will Smith e faz uma dupla divertida com o astro. Mas, depois de Smith, quem se destaca é mesmo Naomi Scott. A atriz, que estrelou o mais recente longa dos “Power Rangers” como a ranger rosa, dá bastante personalidade para Jasmine. Além disso, ela possui uma bela voz e encanta de verdade em ‘Speechless’ e ‘A Whole New World’, além de mostrar uma química divertida com Massoud.
O ponto fraco do elenco é Marwan Kenzari como Jafar. Não que ele esteja péssimo como o vilão e é possível ver que ele tenta dar dignidade ao papel. Mas fica difícil de ter algum tipo de intimidação por causa dele pois Kenzari não fica imponente em nenhum momento da história e sua aparência está mais para galã do que para um malfeitor. Dos novos personagens, quem se sobressai é a serva Dália, bem defendida por Nasim Pedrad, e que ganha importância na parte final da história.
No fim das contas, “Aladdin” não é o melhor live action dessa nova leva da Disney (título que ainda pertence a “Mogli – O Menino Lobo”). Mas ainda assim diverte, mexe com o lado nostálgico do público e o deixa com um belo sorriso no rosto ao final da sessão. Só poderia ter um pouco mais da magia que conquistou a todos no passado. De qualquer forma, mesmo não tendo um real motivo para ter sido feito, a experiência está longe de ser desapontadora e vale muito a pena ver na maior tela possível principalmente pelo seu belíssimo visual, que realmente vai deixar todos de queixo caído. E dar vontade de ter um amigo como o Gênio, para realizar seus desejos. Ainda mais no mundo não tão ideal como o de hoje.
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