“Padre Pio”, o novo filme do diretor ítalo-estadunidense Abel Ferrara não pode ser chamado de cinebiografia. O drama sobre Francesco Forgione, o frade franciscano capuchinho cujos estigmas e habilidades místicas – assim como seus laços e posterior rejeição ao fascismo – lhe renderam controvérsia durante sua vida, ganha contornos de metáfora ao momento político que o mundo vive hoje. A começar pela própria Itália, onde a ascensão da extrema direita recém-eleita já era uma premonição.
Ferrara traça uma bifurcação ao tratar da revolta socialista por parte da classe trabalhadora e o foco no padre em si, responsável pelos momentos em que o cineasta permite alguns devaneios. Artisticamente a segunda é mais interessante, na qual a fotografia acachapante de Alessandro Abate ganha ainda mais pujança. A primeira, no entanto, ganha no ritmo, embora algumas atuações deixem um pouco a desejar.
O interessante nesse libelo antifacista de Ferrara é como o diretor e o roteirista Maurizio Braucci com quem ele escreveu o script, parecem terem passado alguns tempos no Brasil. Das falas de membros do fascismo saem coisas como “nossa bandeira jamais será vermelha”, algo com que estamos bastante familiarizados.
Shia LaBeouf interpreta o personagem-título, ainda em início de jornada, de uma forma surpreendentemente eficaz. É possível também traçar um paralelo entre o drama do padre com uma redenção do ator. Por isso é de se acreditar que a escalação foi mesmo nesse sentido.
É nítido o quão fascinado pela tormenta de Padre Pio. Embora tenha uma boa atuação, LaBeouf escorrega na histeria ao transmitir sua angústia. E nesses momentos o sotaque americano parece escorregar (ok, o filme é falado em inglês mas todo o elenco é italiano e fala inglês com sotaque), o que nos desprende um pouco do personagem.
Embora não configure na lista dos melhores trabalhos desse que é conhecido como “Scorsese do underground”, “Padre Pio” é válido como exercício político (inclusive dedica o longa ao povo ucraniano nos créditos finais) e nos mostra Abel Ferrara ainda vigoroso.
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