O que leva a Primeira Guerra Mundial a não ter tantos filmes?

O favorito ao Oscar “1917” é representante de um dos gêneros cinematográficos que sempre está em voga em Hollywood: guerra. São produções usadas ora para enaltecer os grandes feitos dos vencedores, ora com intuito de retratar os horrores por que passaram os soldados nos campos de batalha, fazendo críticas contundentes à refrega armada. É interessante observar que o diretor Sam Mendes, também responsável pelo roteiro, escolheu um conflito de magnitude histórica, só que pouco explorado na telona: a Primeira Guerra Mundial.

O cinema americano tem preferência por, obviamente, aqueles conflitos que fazem parte da História dos Estados Unidos, sejam os domésticos, como a Guerra de Independência (O Patriota de 2000) e a Guerra de Secessão (…E o Vento Levou de 1939), ou os que levaram seus soldados ao exterior – Guerra da Coréia (Capacetes de Aço, de 1951, e o anárquico M.A.S.H, de 1970) e Guerra do Vietnã (Apocalipse Now, de 1979, Platoon, de 1986, e tantos outros). E, claro, as duas grandes guerras mundiais também estão no cardápio das produções, mas algo é muito visível: como se produziu muito mais filmes sobre a Segunda Guerra do que da sua antecessora. E é sobre isso que vamos nos ater nesse artigo.

Como estabelece o historiador Eric Hobsbawn em seu livro A Era dos Extremos, as duas guerras mundiais são uma única guerra, com um intervalo de 20 anos entre elas. No cinema, as produções sobre o primeiro conflito são muito menores e isso deve-se a alguns fatores:

Impacto visual: nos anos 30, as câmeras estão mais leves e possíveis de serem levados aos campos de batalha, o que proporcionou o sem numero de horas documentadas em rolos que mostram como foi o conflito em si, algo que temos poucos registros do conflito de 1914. Além disso, o próprio governo americano levou grandes diretores de Hollywood para serem seus documentaristas, o que proporcionou a eles, além das filmagens, a própria influencia que só os horrores da guerra podem provocar em um ser humano.

O inimigo: a I Guerra Mundial tem um grande problema: quem é o vilão da história? Os fatores que levaram ao conflito estavam nas mãos de todas as potencias que participaram e mesmo os americanos que entraram posteriormente tinham manchas da guerra em seus princípios. É um conflito que poucos conhecem os líderes dos países participantes (tente se lembrar de nomes de dois deles pelo menos).

A diretora Patty Jenkins aproveitou esse detalhe, que consegue tornar o Deus Ares o vilão da Mulher-Maravilha (2017), e tornar todos os líderes do conflito como a representação deles. Na II Guerra, aonde os inimigos são claros e visíveis, (isso se torna mais claro ainda por existirem poucos filmes que retratam a guerra no Pacífico contra os japoneses, e aonde os americanos basicamente lutaram sozinhos – e só por isso seria suficiente para ser a escolha perfeita), mas como os nazistas se tornaram algo que até hoje ninguém reclama que se mate em tela (algo que com os japoneses já se tornou um problema nos filmes), já que associação de alemães e nazistas no cinema atual ocorre, tanto que quando os personagens se referem ao inimigo, raramente usa a sua nacionalidade e sim o fator de serem nazistas.

Quentin Tarantino põe na boca de Aldo Rainer (Brad Pitt) em seu Bastardos Inglórios (2009), o discurso que legitima a morte dos nazistas no cinema. Com isso, se for fazer um filme da guerra de 1914, é necessário esconder o inimigo o maior tempo possível e tornar a própria guerra em si como o antagonista da história, ou muitas vezes usando os oficiais com esse propósito, e, de acordo com as normas da época, tornar o filme como se fosse uma guerra entre o soldado raso (o homem comum) e o seu comandante (o nobre incapaz de exercer uma função, e assim mostrar como essa figura não faz mais sentido dentro da modernidade que começa a ser instaurada no século XX.

O Simbolismo: hoje em dia é fácil de se perceber quando uma história se passa na II Grande Guerra, basta uma bandeira nazista pendurada em um prédio, ou o uniforme de um soldado alemão. A percepção de ser um filme passado na I Guerra já demanda mais atenção do espectador, seja em tentar identificar o local e as roupas civis para se estabelecer em que período estamos. Talvez os maiores símbolos de identificação visual desse conflito estão nas trincheiras enormes abertas ou no capacete alemão de ponta para cima. Qualquer outro símbolo da época não será de tão fácil identificação.

Aproximação: creio que o grande fator de existirem mais filmes da II Guerra Mundial, está na questão que os fatos são mais recentes e suas consequências ainda são sentidas ate os dias de hoje. Durante muito tempo a Guerra Fria foi uma influencia desse momento, as divisões entre países, a Cortina de Ferro, estavam ocorrendo durante a realização desses filmes. Mesmo hoje, ainda existem temas que não foram cicatrizados dessa época, como o Holocausto, que gerou quase uma sub-divisão de gênero em si, tamanho seja a quantidade de películas feitas sobre esse acontecimento.

Todos esses fatores ocorreram durante grande parte do desenvolvimento da indústria cinematográfica hollywoodiana, então muitos filmes foram comtemplados com as discussões sobre as causas e os efeitos que a II Guerra Mundial trouxe para a humanidade, e como a arte reflete sempre essa discussão, os filme sobre essa época acabam sendo mais relevantes e que dialogam com o público de maneira geral.

 

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