Yves Saint Laurent era tão singular como homem e como mito – e até mesmo na interseção entre os dois – que mereceu dois filmes biográficos num mesmo ano. Se o filme anterior, homônimo, lançado no Brasil no começo do ano, era um retrato autorizado do estilista, Saint Laurent, com direção do talentoso Bertrand Bonello, é um recorte mais significativo e personalizado da vida do estilista, já que retrata sua vida entre os anos de 1967 e 1976, período conhecido como seu auge e, consequentemente, onde viveu momentos dramáticos de crises pessoais.
O filme reflete Laurent como que de dentro para fora, onde sua personalidade ilustra sua trajetória. Gaspard Ulliel, um ator de fartas possibilidades dramáticas, domina sua personagem com integridade invejável. Assim, acompanhamos as nuances de sua extravagância passional – com interessante estrutura de idas e vindas no tempo – persuadidos pela organicidade da inteligência cênica do ator.
Bonello se protege e se expõe ao optar por um recorte pretenso da representatividade do mito da alta costura. Mas dá certo. Seu cinema é instigante, ou seja, ele procura a sedução da humanidade de seu biografado. A perturbação perene de Laurent é ilustrativa na narrativa. O diretor investe (quase que excessivamente) em metáforas estéticas e artimanhas visuais para desvendá-lo. Esse intuito rende cenas belíssimas como a sensibilidade no primeiro flerte do estilista com um de seus amantes mais célebres, Jacques de Bascher (o hipnotizante Louis Garrel). Sua insegurança e fixação com as criações também são bem mostrados, sem fetichizar a patologia, como muitas biografias fizeram (alguém disse Um Mente Brilhante?).
Talvez o investimento para sair do lugar comum, resulte, em seus últimos 30 minutos, um tanto estilístico demais, num panorama mais distanciado do filme, mas Yves Saint Laurent era uma personalidade tão extremada que qualquer panorama acerca de sua vida, pedia um mínimo de risco. E o risco aqui foi exatamente se enxergar num espelho e ver refletido a vulnerabilidade da genialidade.
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