Stella, filme de Sylvie Verheide, recebeu a classificação etária de 16 anos. Incompreensível. O filme não contém uma única cena de sexo, ou de violência ou de drogas. Um abuso infantil é apenas sugerido. Com esta classificação, a exibição do filme prejudica a universalidade que este filme francês procura alcançar.
A jovem diretora francesa, que ganhou o prêmio Arlequim do governo francês de melhor roteirista, conta, com enorme sensibilidade, a história da iniciação afetiva, sexual e intelectual de uma menina de onze anos. A história é baseada em dados autobiográficos.
Stella mora na periferia parisiense e é filha de um casal que é dono de um bar e pensão que recebe gente das classes baixas, desempregados ou proletários, atendidos pela assistência social. O bar é muito animado e ali, em meio à bebida e a música, homens e mulheres compensam suas frustrações econômicas e sociais.
Stella vive o cotidiano festivo deste bar. Sabe jogar com os adultos sinuca, fliperama, pôquer e até mesmo atirar com a espingarda do pai. Quando, por um lance de sorte, vai estudar numa escola de um bairro de gente abastada sente logo lhe pesar a imensa diferença de educação. Stella sabe como nascem os bebês e como os adultos namoram, mas não sabe nada de matemática, francês, geografia.
Seus pais em nada a ajudam. Entretidos na atmosfera ruidosa e alegre do bar, metidos, pai e mãe, com seus casos amorosos ilícitos, não têm tempo, nem paciência, de prestar atenção às dificuldades da filha em se adaptar na nova escola. Numa cena crucial, quando a menina apresenta à mãe as desastrosas notas dos primeiros testes, esta lhe diz: fui garçonete a vida inteira e não tenho do que me queixar. Se você quiser isto também, para mim está ótimo. Eu pensei que você soubesse se virar. Esta é a chave que a menina entende para que vá batalhar o destino com suas próprias forças.
Stella, no bar, cercada de adultos fracassados, ou na escola, de amiguinhos ricos que a desprezam, sente uma solidão indescritível. Sabendo que não pode contar com os pais, vai à luta e faz amizade justamente com a colega mais inteligente da turma, uma argentina filha de pais psicanalistas exilados. É nesta amizade improvável entre a melhor e a pior estudante da turma, que Stella vai apostar todas as suas fichas de redenção.
Um dos críticos de jornal disse que Stella procura se conformar à realidade da escola ao mesmo tempo em que nega a atmosfera “libertária” do bar dos pais. Mas a realidade do bar está longe de ser libertária, por mais animada que seja. Justamente, a sensibilidade da diretora está em não procurar maniqueísmos: o bar é acolhedor, mas para aqueles que o frequentam ou vivem nele, funciona como uma prisão onde consolam sua falência existencial. É através de um jogo de táticas que Stella transforma o ambiente severo da escola num espaço de liberdade que lhe abre os espaços do mundo.
Numa cena emocionante, Stella conta à amiga que sempre teve medo de tudo. É assim que se descobre o caminho da liberdade: não em negar o medo, mas em enfrentá-lo.
Em tempo: a trilha sonora com música disco francesa e européia da década de 70 é fantástica. Destaque para o hit Ti amo de Giancarlo Bigazzi e Umberto Tozzi. A música título La chanson de Stella é cantada pela própria diretora.
Interressantíssimo! Vou prestar atenção neste quando estrear…espero que não seja tããão fora do mainstream e que possa ser exibido nas salas daqui.