Literatura

Contra as cegonhas pelos Gambás

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Talvez este seja mais um artigo sobre ele, só mais um pouco lido ou interpretado, algo a mais pela desmistificação deste autor, tal de Roberto Piva, ser obscuro ao mesmo tempo que angelical na Literatura Brasileira. Prefiro não me ater a tantos academicismos e enrolações biográficas, etimológicas, sintáticas ou o que valha, prefiro frisar que sua leitura seja mesmo indispensável – ainda mais se refletirmos o quão vazio e ignóbil se mostra o panorama da Poesia (e escrita geral, hoje em dia); e mais indispensável a pretende pensar, de qualquer forma. Sua obra é de suma complexidade e lirismo, cheia de vida e expressão, forte, mística, imagética, não pedante, provedora (me medida em que Piva teimava em citar suas referências e trabalhar com elas; ou eles!). Contribuiu com sua personalidade e desregramento às Letras do país (e do mundo também, claro) tanto quanto um Machado de Assis ou Graciliano Ramos, cada qual em sua vertente.

 

Não deve ser tratado como um “Marginal”, em qualquer das significações desta palavra, mas sim como uma mente aberta, que atinou à tarefa de realizar, absolutamente natural. Tem uma voz, “e deste”, sai sinceramente.

 

Em sua  “Autobiografia Selvagem”, ele próprio se diz mescla de brasileiros e italianos, que no livro de sua família, um antepassado cavaleiro combateu nas Cruzadas e logo após fora pregar em favor do Demônio – ambos semeadores de discórdia!? Ele próprio, tanto fez de várias formas insurreições mil contra todas as Ordens. Cogumelos sagrados, delírios? Pretextos? O que se pode precisar é uma vida em prol da Poesia, como um Poeta de verdade. Diz, é sabido: “Só acredito em poeta experimental que tenha vida experimental”. “Precisamos de criações desprovidas de regras & de convenções paralisantes”, diz, e mais: “estou sempre às voltas com o problema da grana”. Isto soa familiar? Ou ridículo?, se pensarmos em que fora maltratado um gênio do nosso país. É assim que tratam os artistas? Reflito, mais essa vez, e sinto pesar. Também sou escritor, passo por coisas parecidas. Que passa por aqui? O tempo congela-se em imbecilidades….

 

“As primeiras fogueiras foram acesas”, a semente disseminada. Imperioso ter leitores, mas onde? Quem tem paciência de ler um livro ainda? Quem tem como interpretar? Me sinto mal. O Apocalipse chegou, morremos, é a o reflexo da burrice; Saramago estava certo ao postular suas teorias da Cegueira!

 

Precisamos do “descabaçamento”, de uma volta às origens, volta ao Pensamento, e sim, com ajuda da Tecnologia, e não DEPENDENDO somente dela. “Lábios de Cereja organizava as sessões de orgasmo coletivo & crueldades cristalinas”. Realizem.

 

É claro, dirão, Piva não é um bom partido. Seus “tamanduás flutuantes” são pura loucura induzida por drogas e sei lá o que mais. O que o impede de ser exposto, então? Há algo de podre… São pudores inventados, senhores e senhoras, conceitos, evidentemente. Ou preferem a doçura dos Romances fáceis e digeríveis, como as notícias que lhes chegam dos noticiários, em matérias esquematizadas, preenchendo lacunas distorcidas? Melhor ir dormir, então, vai…

 

Cito ainda, que: “todo trabalhador é escravo. toda autoridade/ é cômica. fazer da anarquia um/ método & modo de vida. estradas./ bocas perfumadas. cervejas tomadas/ nos acampamentos. sonhar alto”. Piva não é emulação, é vitalidade, juventude. É o que precisa a Sociedade, sair, sair, ir por aí. “mas o caminho de volta eu só conto/ a este urubu em carne viva/ que grasna na sacada”. Incomoda, pois é, não é nada velado. “Contra as cegonhas pelos gambás, (…), contra os professores pelos pajés”. Ora, que brasileiro fora! Mas a Palavra permanece, é como o povo lida com ela que nos faz o que somos.

 

Poesia visceral e quântica; me arrisco a dizer que jamais vista neste país. É isso o que tenho a dizer, no mais, a quem se interessou, que saia à procura  de algum exemplar do autor por aí (indico as edições de suas obras completas, apresentadas pela editora Globo) e felicite-se e trema diante. E ponto final.

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Grossi e Ajuda -

Grossi é escritor e músico, publicou entre outros títulos a novela “Obarro”, além do argumento de “Desculpe, seu tempo acabou”. Pela Poesia, lançou “Cura”, “Servidão”, “A Conferência”. “Cabezada”, “Esencias”, “Maneja” e “En las eras” são suas obras em espanhol. Participou como guitarrista e vocalista das bandas Alice, íO, Instrumental Vox, Ummantra, SAEM e A Ras del Suelo

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