Literatura

Dragões contra Napoleão: uma investida steampunk em nova série de livros

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Alguns meses atrás me deparei com uma série que mistura os gêneros épico histórico e fantasia. Uma junção bem autêntica, mesmo sendo mais uma que segue a linha dos manshups, ainda por explorar um período histórico bem conhecido, as Guerras Napoleônicas e melhor, com um batalhão de dragões fazendo parte do conflito.

A autora Naomi Novik, após anos desenvolvendo diversos jogos de computador (Neverwinter Nights: Shadows of Undrentide), se aventurou ao escrever a série Temeraire, uma história alternativa a la Dick num mundo de fantasia flintlock-steampunk. A série é conduzida pelo século XIX, mais precisamente quando a França de Napoleão rivaliza contra o resto da Europa. Embora a aviação não exista, cada país possui uma força aérea especial, os dragões e seus aviadores. As criaturas voadoras existem em todo o planeta, sendo os chineses os mais preparados, por terem sido treinados deste a antiguidade. A Grã-Bretanha ainda engatinha, sua força é pequena e os aviadores são escassos e é nesse contexto que conhecemos os dois principais personagens, o capitão Will Laurence e o dragão Temeraire.

Lançado pela Record, a série já possui três títulos lançados: O dragão de sua majestade, Trono de Jade e Guerra da Pólvora Branca. A narrativa segue uma linguagem consistente, com legibilidade e entretenimento, cheia de ação e bem credível, mesmo tendo o aspecto ficcional como mote consegue manter a História como eixo condutor. A série já possui sete volumes lançados lá fora e comercialmente teve êxito em vários países, chamou a atenção de Stephen King, Anne McCaffrey, Susanna Clarke, com boas críticas. E com certeza terá bem mais sucesso sob o olhar de Peter Jackson (O Senhor dos Anéis, King Kong) que comprou os direitos de adaptação e pensa em lançá-la como uma mini-série.

A autora constrói um suspense com ritmo incessante, mantendo um clímax a cada página, a cada volume, chamando minha atenção, mesmo com alguns clichês (traição, batalhas) ao desenvolvimento de seus personagens, em especial os dragões, criaturas importantíssimas ao enredo, que deste a eclosão criam uma ligação com o seu futuro aviador, já treinado para esse momento deste a infância. A maioria dos dragões é uma espécie de ‘destróier dos ares’, e são treinados para formar com sua tripulação uma verdadeira arma de guerra, por isso são bastante valiosos e representam a Força Aérea de uma nação. A analogia que a autora constrói entre as batalhas navais da época e as batalhas com os dragões possuem um reflexo fotográfico impecável, além de levar ao leitor a interagir com as descobertas que os personagens fazem ao longo destes três livros.

Antes de continuar com a análise, curta um resumo, sem spoilers de cada volume:

O DRAGÃO DE SUA MAJESTADE (His majesty’s dragon, tradução de Edmo Suassuna Filho)

A história começa quando Will Laurence, um capitão a serviço da Armada britânica, acaba de capturar e abordar uma fragata francesa. No porão, encontra um ovo de dragão prestes a eclodir o que implica em uma mudança geral em sua vida. Laurence acaba por se ver envolvido em circunstâncias que não consegue controlar e quando o dragão nasce e o escolhe a ele, não tem outra escolha senão sacrificar a sua carreira e ambições na Marinha de Guerra e ingressar na Força Aérea. E não será fácil, pois enfrentará o desprezo de conhecidos e familiares por ter que abandonar a Armada e se tornar um aviador, uma carreira não bem quista pela população em geral e o receio e a desconfiança de seus companheiros aviadores. O único companheiro seria o gracioso e inteligente dragão negro que batizou de Temeraire, uma relação de amizade que só tente a crescer, pois a autora caracteriza a maturidade e a seriedade de Will com a inocência e curiosidade do dragão. Assim juntos são apanhados em circunstâncias difíceis na guerra com Napoleão, são forçados a viajar para a Escócia onde se irão integrar na Academia de aviadores e aprender a combater contra os dragões do inimigo francês.

TRONO DE JADE (Throne of Jade, tradução de Edmo Suassuna Filho)

Neste segundo volume, Temeraire e Will Laurence viajam a China para solucionar contratempos diplomáticos surgidos ao descobrir a origem do dragão negro. Ele é um dos poucos remanescentes da raça Celestial, e é reivindicado pelo império chinês. Após uma longa e acidentada jornada, os dois se surpreendem com a forma de tratamento que os dragões têm em território chinês, são livres para qualquer função e independentes dos humanos. A possibilidade de viver com a liberdade de seus irmãos é o mote desse volume.

GUERRA DE PÓLVORA BRANCA (Black Powder War, tradução de Edmo Suassuna Filho)

Uma vez resolvida de forma mais ou menos satisfatória as dificuldades encontradas na China, o retorno a Europa ocorre nesse terceiro volume. A missão de retorno ainda possui o resgate de três ovos de dragão que foram adquiridos pela Grã-Bretanha. O problema que os turcos não desejam entregar tão facilmente os ovos, enquanto isso Napoleão continua vencendo, não encontrando resistência nenhuma no continente. Além de enfrentarem os turcos, Temeraire e seus companheiros terão que lutar contra um grupo de dragões selvagens e combaterem em auxílio aos aliados russos e austríacos. O pior é que uma dragão-femea resolve se aliar aos franceses.

Mesmo que a trilogia não demonstrem por qual motivo são necessárias as tripulações que os dragões trazem às costas, o argumento traz um fôlego novo ao gênero. Entretanto, vejo os dragões como criaturas mortíferas que combatem sozinhas e a parafernália toda estaria ali para atrapalhar. Mesmo assim, Novik tem o crédito de usá-los de uma forma diferente, e cada leitor entenda o enfoque que ela quis passar. Assim a obra de ficção militar explora novas localizações e ideias e desenvolve seus personagens como se estivessem inseridos realmente naquele período conturbado europeu.

A autora encontra uma comodidade ao explorar o filão que encontrou. O período napoleônico fora bem investigado e Novik conseguem sacar um argumento sem decepcionar. A narrativa não se arrasta, a caracterização fantástica tem um estilo próprio, sob um ângulo histórico diferente, fora do contexto medieval, que agradará os aficionados do gênero. Em resumo, tenho a impressão de que a série irá ser bem quista por muitos leitores, como foi por mim mesmo, embora não seja tão original, eu recomendo. Leiam e irem suas impressões.

[xrr rating=4,5/5]

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Cadorno Teles -

Cearense de Amontada, um apaixonado pelo conhecimento, licenciado em Ciências Biológicas e em Física, Historiador de formação, idealizador da Biblioteca Canto do Piririguá. Membro do NALAP e do Conselho Editorial da Kawo Kabiyesile, mestre de RPG em vários sistemas, ler e assiste de tudo.

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